Dólar cai pelo sexto dia seguido, fecha a R$ 5,068 e acumula queda de 4% no ano

Moeda americana terminou o mês de março próxima da menor cotação do ano

Mitchel Diniz

(Getty Images)
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O dólar fechou em queda pelo sexto dia consecutivo, se aproximando da mínima do ano. A moeda americana foi negociada no menor valor desde o último dia 2 de fevereiro, quando chegou a oscilar abaixo dos R$ 5. Assim como na ocasião, a divisa repercute a possibilidade de uma desaceleração de aperto monetário nos Estados Unidos. No Brasil, ainda não há sinais concretos de quando a taxa vai começar a cair, ainda que o arcabouço fiscal divulgado na véspera tenha diminuído incertezas, contribuindo com a valorização do real.

O dólar comercial fechou em queda de 0,57 %, a R$ 5,068 na compra e R$ 5,069 na venda. No mês, a divisa acumulou queda de 3%. No acumulado do ano, recuou mais de 4%.

“Hoje, data de formação de Ptax do mês, a cotação testou graficamente um dos fundos, uma região de preço importante, entre R$5,09 e R$4,98”, explica Haryne Campos, especialista em câmbio da WIT Exchange.

A Ptax é calculada pelo Banco Central e serve como referência para liquidação de contratos no mercado futuro de dólar.

Nesta sexta-feira (31), o monitor de juros do CME Group mostrava um crescimento da fatia de mercado que aposta em uma manutenção dos fed funds na atual faixa, entre 4,75% e 5% ao ano. Esta é a aposta de 47,6% dos agentes do mercado financeiro, ainda que esse percentual tenha sido muito maior uma semana atrás. No dia 24 de março, 83,2% dos economistas acreditavam que o Federal Reserve não fosse mais mexer nos juros.

Agora, 52,4% das apostas indicam que a autoridade monetária vai fazer mais uma elevação na taxa, de 25 pontos-base, para o intervalo entre 5% e 5,25% ao ano. De qualquer forma, as projeções apontam que o Fed pode estar mais próximo de encerrar o ciclo de aperto depois que bancos regionais dos Estados Unidos (Silicon Valley Bank e Signature Bank) foram fechados por falta de liquidez – reflexo da alta brusca de juros.

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Um dado divulgado hoje reforçou a percepção de alívio monetário nos EUA. O núcleo da inflação do consumo (PCE) americana subiu 0,3% em fevereiro ante janeiro e 4,6% ante fevereiro de 2022. O resultado veio abaixo do esperado pelo mercado – o consenso Refinitiv projetava alta mensal de 0,4% e anual de 4,7%.

O dado contribui com a queda do dólar, pois enquanto o mercado espera que os juros parem de cair em breve nos Estados Unidos, por aqui a Selic continua em 13,75% ao ano. O tom duro do Banco Central do Brasil, no comunicado da última decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), foi mantido na ata da reunião, divulgado nesta semana. Não houve sinais de corte – pelo contrário, o BC reforçou a possibilidade de subir mais os juros.

A Selic elevada, assim como aumenta o apetite por títulos de renda fixa entre os investidores locais, também costuma atrair capital estrangeiro que buscam remuneração maior do que a oferecida pelos juros nos Estados Unidos. O movimento aumenta a demanda por reais, valorizando a moeda brasileira.

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“Se por um lado o real foi favorecido quando o apetite ao risco cresceu com o Fed reduzindo as expectativas de aperto monetário visando dar maior suporte aos bancos – que apontaram as consecutivas altas nos juros como principal fator da crise – por outro o dólar valorizou quando a temperatura subiu entre o governo brasileiro e o Banco Central”, afirma Diego Costa, Head de Câmbio para o Norte e Nordeste da B&T Câmbio.

Rodolfo Margato, economista da XP, diz que mesmo o diferencial de juros sendo uma pressão baixista para o dólar, as desvalorização das commodities em março e os riscos fiscais que seguem no radar inibem o carry trade – quando os investidores tomam recursos mais baratos no exterior e levam para mercados emergentes, com remuneração mais alta, em função de juros elevados.

“Não observamos grandes ingressos líquidos pelos riscos internos”, lembra Margato.

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O arcabouço fiscal apresentado pelo governo diminuiu a aversão por ativos de risco na sessão de ontem – fez a Bolsa subir e o dólar cair. Hoje, analistas ponderam que a nova regra não deve ser capaz de estabilizar a dívida pública, como é o caso da equipe do Credit Suisse.

“Acreditamos que a nova regra fiscal não é suficiente para estabilizar a trajetória da dívida pública. Além disso, ainda não há clareza sobre o que será anunciado em relação às receitas nas próximas semanas, o que impacta diretamente planos do governo para alcançar a meta primária”, diz relatório do banco.

Já a Guide Investimentos aponta, em nota a clientes: “sem entrar no tecnicismo da regra, ela tem dividido os analistas, mas nossa visão é que um limite das despesas por meio da receita passada pode ajudar a conter gastos excessivos”.

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A Bolsa hoje devolve uma parte do que ganhou na véspera, mas o dólar, mesmo sendo um ativo mais seguro, manteve sua trajetória de queda. A explicação aponta novamente para o diferencial de juros: os contratos futuros de DI operam em alta em toda a curva, mostrando que o mercado não enxerga um alívio monetário por aqui.

“Apesar da nova regra fiscal abrir espaço para um corte na Selic, é preciso ter cautela, a curva da inflação ainda preocupa e pode dificultar esse novo movimento”, diz Diego Costa, da B&T Câmbio.

“Teremos agenda muito forte nos EUA até o dia 12 de abril. Dados mais fortes (como emprego e CPI) deverão elevar as aposta de que o Fed não cortará juros, como está na curva de juros”, diz relatório da Wagner Investimentos, assinado por José Faria Júnior. Ele vê tendência de baixa de médio prazo e de alta no longo prazo, mas não acredita que a moeda americana fique abaixo de R$ 5.

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Costa, por sua vez, acredita que ” com a crise bancária [nos EUA] em segundo plano e regra fiscal entregue para debate no legislativo, é esperado que tenhamos uma maior previsibilidade na economia e no câmbio”.

Por enquanto a XP mantém a projeção de dólar a R$ 5,30 ao final de 2023, ainda que os modelos da casa sugiram que a moeda pudesse estar entre R$ 4,50 e R$ 4,85. “Teria espaço para romper os R$ 5, caminhar perto de R$ 4,70, mas não consideramos esse o cenário mais provável”, diz Margato. “Não vemos uma deterioração expressiva do real, algo mais estressado, mas a apreciação também deve ser limitada”.

“Para o câmbio, vale o mesmo racional que para o juros. Podemos ver descompressão de prêmio de Brasil, conforme o arcabouço for discutido no Congresso e andamento da reforma tributária. Mas há muita incerteza, os debates têm de ser encaminhados de maneira correta”, afirma Fabio Guarda, gestor da Galápagos Capital.

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados