Curva de juros precifica alta da Selic em 2024, mas Focus segue igual: O que explica?

Enquanto DIs enxergam alta de 25 pontos-base dos juros ainda em 2024, Focus mantém Selic inalterada ao longo do ano

Vitor Azevedo

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O contrato DI para janeiro de 2025 fechou na véspera a 10,76%, indicando que o mercado aparenta enxergar uma alta de 25 pontos-base na taxa básica de juros até o fim do ano. No entanto, as projeções do Boletim Focus, que também usa como base a opinião de bancos e researchs, seguem as mesmas, com as perspectivas em 10,50% para o fim de 2024. Há uma diferença clara, então, entre as duas projeções.

Nesta quarta-feira (3), após a disparada na véspera das taxas, com remunerações do Tesouro atingindo máximas dos últimos anos, há um alívio. O DI 2025, por exemplo, hoje, cede 0,60%, para 10,70%. Apesar do alívio, entretanto, segue projetando um prêmio em relação ao Focus.

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Quando o assunto são os juros em 2026, a discrepância é ainda maior. A curva dos DIs, os juros futuros, coloca as taxas em 11,66%, enquanto os economistas ouvidos pelo Focus veem a Selic recuar para 9%. 

Por que curva de juros precifica alta da Selic em 2024, mas Focus não?

“O que justifica a alta recente dos DIs, para começar, é essa comunicação mal feita de governo. O chefe do executivo [o presidente Lula] fala uma coisa, o ministro da Fazenda [Fernando Haddad] fala outra e o mercado esperava uma terceira coisa totalmente diferente”, diz Flavio Bojikian, sócio da PRX Capital.

O presidente da República, nas últimas semanas, subiu o tom contra o Banco Central e contra o mercado financeiro. Há ainda a preocupação de que, quando o atual presidente do Banco Central sair, a pessoa que o governo Lula vai indicar pode ser um pouco mais leniente com inflação. Uma inflação mais alta, se o futuro chefe do BC for mais brando, implicaria em juro real menor.

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Fora isso, no ano, o executivo acumula uma série de medidas que preocupam do lado fiscal, como a revisão da meta de superávit para o próximo ano e a mudança na presidência da Petrobras PETR4 (que vem ajudando, há algum tempo, as contas públicas por meio dos seus dividendos). Maior risco financeiro leva o mercado a cobrar taxas maiores.

“O que a gente sempre tenta medir é se esses ruídos vindos do Governo são sinais de que alguma coisa vai mudar no âmbito da gestão. Alguns dizem que vai mudar totalmente a política econômica. Outros dizem que ele está apenas falando para a platéia dele. De qualquer forma, o ruído inibe o raciocínio técnico”, diz Bojikian. 

Mesas operam “mais no calor do momento”

A deterioração da visão dos investidores sobre a trajetória das contas públicas brasileiras, em grande parte, explica a abertura da curva dos DIs. 

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“Se você for um gestor de uma carteira de investimento de clientes, ou de um banco, e você está montando posições com base no que vai acontecer com a taxa de juros lá na frente, você precisa acertar. É um compromisso com o cliente.  Um gestor vai fazer um balanço de risco e retorno”, contextualiza o sócio da PRX. 

Ele menciona que, em seu caso, por exemplo, o fato de 2024 ser um ano eleitoral e 2025 contar com um “certo início da corrida pela presidência”, em 2026, ajudam a criar uma certa resistência por investir em taxas de juros nos patamares atuais da Selic. É normal, portanto, que políticos buscando a reeleição aumentem gastos públicos (ou até mesmo forcem queda dos juros, apesar da alta da inflação) para “inflar” a economia. 

“As tesourarias dos bancos operam no mercado em tempo real, reagindo rapidamente às mudanças econômicas e políticas, muitas vezes antes de essas mudanças serem refletidas nas projeções do Focus”, concorda Guilherme Jung, economista da Alta Vista Research.

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Economistas andam em “tempo mais lento”

Enquanto operadores têm de ajustar suas posições conforme as notícias saem, economistas-chefes e equipes escutados pelo Focus podem demorar mais para traçar as suas projeções — colocando ruídos na conta, muitas vezes, apenas quando eles trazem seus primeiros impactos reais. 

“Todas as instituições tentam fazer um modelo muito parecido (com o que o Banco Central usa para poder tomar suas decisões). Eles estão ali trabalhando em algo que não envolve o calor do momento ou o preço dos ativos. O trabalho é tentar ser o mais acurado possível” debate Flávio, da PRX.

Alexandre Dellamura, mestre em economia e head de conteúdo da MELVER Educação, acrescenta que o Focus não leva em conta qualquer negócio ou negociações de ativos, apenas as visões do que o BC fará. 

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“Juros são sintomas, e não causa. O maior spread entre previsões de Selic e a “pele em jogo” dos contratos DI nos mostra que o mercado, efetivamente, acredita na alta dos juros, não confiando em estabilidade para inflação e dólar”, fala esse último especialista. “Vários escritórios de assessoria já acreditam, inclusive, em mais uma alta de juros para a próxima reunião do Copom, o que traria uma Selic mais alinhada com o que o mercado está praticando efetivamente”.

O esperado, contudo, é que a diferença diminua conforme o cenário (mesmo que negativo) for se consolidando.