Correção normal ou estouro de bolha? Analistas avaliam futuro do Bitcoin após a queda desta quarta-feira

Após cair 38% na mínima, para US$ 30.681, Bitcoin ameniza perdas e se aproxima novamente dos US$ 40 mil; o que esperar agora?

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Apesar do cenário negativo no mercado de criptomoedas desde a semana passada, a derrocada dos preços desde a madrugada desta quarta-feira (19) pegou muitos investidores de surpresa, aquecendo novamente a discussão sobre o futuro dos ativos digitais como o Bitcoin.

A piora teve início após a Reuters e outras agências de notícias divulgarem que o governo chinês teria proibido instituições financeiras e empresas de meios de pagamento de participar de quaisquer transações relacionadas a criptomoedas.

E apesar de analistas destacarem que a informação não é uma novidade, mas sim um reforço do governo chinês em relação às moedas digitais, os preços passaram a desabar, com o Bitcoin chegando a bater no nível dos US$ 30 mil, seu menor valor desde fevereiro.

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Conforme aponta o site Alternative.me, um popular serviço de sentimento do mercado, neste momento há um “medo extremo” em relação às criptomoedas. Marcando 23, o valor é cerca de um terço inferior ao visto uma semana atrás, quando o indicador apontava uma “ambição” entre os investidores.

Mas diante dessas fortes perdas em poucas horas, muitos investidores – principalmente os novatos – devem estar se perguntando o que esperar agora. Será que podemos ter mais perdas pela frente, ou então seria essa uma hora boa para comprar Bitcoin na baixa?

Em participação no Radar InfoMoney desta quarta-feira (19) (assista no vídeo acima), Safiri Félix, diretor de produtos e parcerias da Transfero, recomendou que o investidor não faça nada neste momento: “A minha recomendação para quem é iniciante é: desligue a tela, não opere hoje. Deixe para os profissionais, espere as coisas se assentarem para depois você tomar uma posição relativa se você vai vender ou aumentar sua exposição. Hoje é aquele dia em que o melhor é não fazer nada”.

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Segundo ele, quem já está há mais tempo no mercado de criptoativos, apesar do susto, sabe que quedas como a de hoje não são inéditas e que, na maioria das vezes, o mercado conseguiu reagir de maneira positiva.

Safiri lembra que o Bitcoin já registrou quedas acentuadas antes e, mesmo assim, depois seguiu em trajetória de alta, conforme mostra o gráfico abaixo. Nesta quarta-feira, a moeda chegou a cair pouco mais de 38% na mínima, para US$ 30.681. Mas, por volta das 19h, já estava valendo US$ 39.241, reduzindo a queda para 8,16%.

Beibei Liu, CEO da NovaDAX, afirma as correções no valor do Bitcoin são esperadas, pois a alta recorde da moeda trouxe inúmeros investidores para o mercado de criptos, o que afetou a liquidez do Bitcoin.

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“É normal que as moedas passem por correções depois de um bull market [período de alta]. Semanas atrás, o Bitcoin atingiu sua máxima histórica, ao bater os US$ 64 mil. Para investidores com pouca experiência, uma queda de 10% já acaba preocupando e eles podem começar a vender”, destaca. Liu questiona, porém, se os investidores não verão esse movimento de baixa como algo que os deixa mais confortáveis para comprar bitcoins a um preço menor.

Outro ponto que vem derrubando as cotações é a discussão sobre o consumo de energia para mineração do bitcoin, amplificada após as manifestações do fundador da Tesla, Elon Musk. Críticos chegaram a questionar se a enorme energia gasta não seria o gatilho para estourar uma suposta bolha das bitcoins.

O Centro de Finanças Alternativas da Universidade de Cambridge (CCAF) estimou, recentemente, que o consumo total de energia do bitcoin está entre 40 e 445 terawatts-hora (TWh) por ano, próximo ao consumo de eletricidade em todo o Reino Unido, de pouco mais de 300 TWh por ano.

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Mas, para Felix, as afirmações sobre consumo de energia são “enviesadas”. Segundo ele, o gasto de energia com os bitcoins, estimado pela Universidade de Cambridge, fica abaixo do consumo das secadoras de roupa nos Estados Unidos em um ano. “Além disso, a mineração de bitcoin consome uma fração de toda a infraestrutura do mercado financeiro.”

Novo suporte

Safiri aponta que agora o mercado precisa encontrar qual será o novo suporte dos preços. Ele ressalta que já houve uma recuperação na casa de 20% desde a mínima em torno de US$ 30 mil atingida pela manhã, mas que ainda não dá para entender qual será o novo suporte.

Para ele, se o Bitcoin não encerrar o dia abaixo dos US$ 34 mil, a tendência, segundo a análise gráfica, é que ele mantenha em uma trajetória de alta no longo prazo.

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“Nós temos um problema de fluxo agora. Tivemos um ajuste forçado nas posições, principalmente dos investidores institucionais, que os levaram a se desfazer de suas posições. Do outro lado, nós temos uma ponta compradora enfraquecida, então é natural que o mercado passe por esse estresse, mas, provavelmente, ao longo dos próximos dias e semanas, o mercado deve se assentar e ter uma visão mais clara do movimento de médio e longo prazo”, avalia o diretor da Transfero.

Bitcoin a US$ 100 mil

Para conseguir iniciar uma retomada, o mercado primeiro precisa assimilar o choque de hoje, e mantendo os patamares atuais, analistas apontam que ainda é possível o Bitcoin voltar para suas máximas históricas.

João Marco Cunha, gestor de portfólio da Hashdex, não se arrisca a fazer projeções sobre a cotação da moeda, mas acredita em uma recuperação no longo prazo. “Acaba sendo sempre extremamente especulativo você falar se vai cair mais ou não, ou se a tendência que vimos nos últimos meses vai continuar. O que eu gosto de mirar sempre é o longo prazo, na crença na tecnologia, e isso não mudou nada, nem com essas notícias e nem com a queda de hoje. Isso se manteve exatamente como antes”.

Apesar de ser considerado um ativo descorrelacionado do mercado “tradicional”, o Bitcoin também sofre impactos vindos do humor dos investidores. Assim como ocorreu em março do ano passado, quando registrou uma forte queda pelo pânico generalizado com o estouro da pandemia, agora outros fatores também têm reduzido o apetite por risco.

Recentemente, o que se tem visto é uma cautela maior do investidor diante dos temores do aumento da inflação nos Estados Unidos, que pode levar a uma alta de juros antes do previsto.

Maya Vujinovic, membro da mesa redonda anual promovida por Satoshi Nakamoto e membro do Conselho Consultivo da CoinDesk, destaca que o movimento de queda não se restringiu ao Bitcoin.

“O mercado inteiro está em baixa. Muitas ações de tecnologia e as criptos caíram por causa de um movimento de correção. Não é apenas a China que explica a queda. Existem muitos fatores envolvidos, mas pode ser apenas um movimento natural do ciclo. Estamos no período de baixa do ciclo, após um período de euforia que durou um algum tempo. E estamos vendo uma correção antes de uma mudança massiva no mercado”, diz Maya.

Felix afirma que hoje o apetite por risco é muito menor do que no começo do ano, quando o Bitcoin assumiu uma trajetória de alta. “Para que o Bitcoin retome sua trajetória e volte a buscar novas máximas, nós vamos precisar de um assentamento das expectativas e de um fluxo de compra, principalmente dos investidores institucionais. “, afirma ele.

Mas Safiri destacou no Radar InfoMoney que, se os riscos de inflação global não se concretizarem, a moeda pode buscar novas máximas em um horizonte não muito longo, chegando a passar dos US$ 70 mil. Considerando uma das formas de análise técnica mais utilizada no mercado de criptoativos, conhecida como stock-to-flow, o diretor da Transfero diz até mesmo que seria possível ver o Bitcoin atingindo os US$ 100 mil até o início do próximo ano.

Alavancagem

Sobre o ajuste das posições dos investidores, um dos fatores apontados por diversos especialistas para as quedas acentuadas desta quarta foi o mercado de derivativos, com grandes quantidades de posições em aberto. Com investidores operando alavancados e com ordens automáticas de vendas (stop loss) – buscando evitar perdas muito acentuadas -, o início de uma derrocada cria um efeito em cascata que aciona essas ordens e piora ainda mais a queda dos preços.

Liu destaca que o chamado DeFi (sistema de finanças descentralizadas) contribuiu para essa situação com o mercado de empréstimos garantidos.

Ela explica que, hoje, por exemplo, investindo US$ 10 mil em Ethereum é possível emprestar US$ 7 mil em stablecoin. Mas se o preço do Ethereum entrar em colapso, o sistema DeFi venderá automaticamente a posição do investidor na moeda para reembolsar ao credor o stablecoin emprestado.

Segundo Liu, no sistema DeFi, a maioria do mercado tem ordens de acionar o stop-loss quando os ativos atingem uma queda de 30% a 40%. “Isso significa que se a queda do preço da criptografia atingir 30% a 40%, todas as plataformas de DeFi venderão automaticamente mais criptos, o que pode acelerar a queda para 50%, 70%, 80% ou até 95% em minutos. Isso arruinaria a confiança no mercado cripto e pressionaria os reguladores a começarem a questionar se produtos financeiros não regulamentados deveriam ser disponibilizados para o investidor médio”, alerta Liu.

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Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.