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Enquanto o Ibovespa avança 2,28% nos últimos seis meses, as principais ações do setor imobiliário acumulam alta de 7%, segundo o IMOB. O desempenho chama ainda mais atenção ao considerar que um ciclo de alta da Selic, que costuma penalizar os papéis do segmento, começou nesse período. Mas especialistas destacam que as estratégias das construtoras para mitigar os efeitos ruins dos juros altos em seus balanços vêm sendo bem sucedidas.
Para desafiar a tendência de queda das ações em ciclos de aperto monetário, empresas como Cyrela (CYRE3), MRV (MRVE3), Direcional (DIRR3) e Cury (CURY3) estão controlando melhor os custos, acelerando o ritmo de lançamentos, reduzindo o endividamento e até pagando dividendos – algo incomum para os setores de crescimento, onde a expectativa é ter retorno via valorização da empresa, não distribuição dos lucros.
Há três meses, analistas mostraram ao InfoMoney quatro fatores que explicavam o otimismo com as ações das construtoras mesmo com a Selic alta. Agora, após os resultados do terceiro trimestre, eles respondem se a melhora na gestão dessas companhias as torna menos dependentes dos juros básicos e, consequentemente, mais seguras para alocações em tempos de Selic a 11,25%.
Receita da recuperação
“Apesar das dificuldades macroeconômicas, como a alta da Selic e a inflação elevada, as construtoras têm se mostrado resilientes, conseguindo gerar lucro e aumentar a rentabilidade, o que sugere uma recuperação mais sustentável do setor”, diz Régis Chinchila, head de research da Terra Investimentos.
Já Gianluca Di Matina, especialista em investimentos da Hike Capital, destaca que “algumas empresas estão adotando medidas para reduzir o endividamento, enquanto outras já operam com uma estrutura financeira sólida”. Ele lembra que mesmo os players que apresentaram leve aumento na Dívida Líquida/Ebitda, como Direcional e Cury, operam em níveis “baixos e gerenciáveis”, com relações de 0,3x e -0,4x no indicador, respectivamente.
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A “adaptação das empresas ao cenário de juros altos aliada a uma gestão financeira mais eficiente” explica os últimos balanços positivos, segundo Marcos Duarte, analista da Nova Futura Investimentos.
Sabendo que a Selic alta inibe o consumo e afeta a confiança de compradores que precisam de financiamento para adquirir seus imóveis, as construtoras seguiram dois caminhos principais. Na baixa renda, o foco está em acelerar os lançamentos em programas habitacionais, como o Minha Casa Minha Vida, onde as margens são mais baixas, mas a demanda não é tão impactada pela Selic, já que as taxas dos programas não são vinculadas aos juros básicos. Não à toa, a MRV, que teve aumento de 59,7% nos lançamentos nacionais no 3T24, passou a ser mais citada em reuniões de investidores, segundo relatório do Itaú BBA.
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Já os segmentos de média e alta renda focaram em oferecer financiamento direto a clientes que já são menos dependentes de financiamento bancário com a intenção de reduzir a sensibilidade às variações dos juros, explica Gianluca Di Matina.
A distribuição de dividendos também animou os investidores e é, inclusive, critério de desempate entre Tenda e Direcional para o Bradesco BBI, que prefere a segunda após pagamento de R$ 0,46 por ação em dividendos em setembro.
Chinchila diz que o movimento “indica que as empresas estão em uma fase mais sólida financeiramente e com uma gestão mais eficiente”, mas pondera que a distribuição de lucros pode ser vista como “uma forma de atrair investidores em um setor tradicionalmente volátil”.
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Efeito da Selic sumiu?
Embora reconheçam e elogiem os esforços das construtoras para melhorar as estruturas de capital e margens de lucro, os analistas deixam claro que o setor “ainda depende de fatores como estabilidade fiscal e taxa de juros”, segundo o head de research da Terra Investimentos. Para ele, as empresas estão mais eficientes, mas ainda devem ser avaliadas como sensíveis ao ciclo de juros.
Duarte, da Nova Futura, lembra que os esforços das companhias não mudam um fator essencial: o consumidor segue “completamente dependente da Selic para manter seu poder de compra”.
Em relatório, a Genial Investimentos diz que “os recentes aumentos nas taxas de juros imobiliários e aumento de restrições no montante financiável por bancos” colocam medo nos investidores, o que mostra que as empresas seguem consideravelmente expostas aos riscos macroeconômicos. A corretora diz que o setor “está esquecido” pelo mercado atualmente.
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Portanto, não é possível esperar unanimidade na recomendação de ações do setor imobiliário enquanto o Brasil atravessa um ciclo de aperto monetário, como acontece em setores mais defensivos, como bancos, saneamento e energia. Duarte conclui que as estratégias ajudam a “navegar cenários adversos”, mas reduzem “parcialmente” a ciclicidade e “não eliminam a influência dos juros altos”.