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Na tarde da última segunda-feira (13), o teto estabelecido para o juro do crédito consignado para beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi reduzido de 2,14% para 1,70% ao mês na reunião do Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS), com potencial impacto para os bancos brasileiros, segundo analistas de mercado.
Já as operações de cartão de crédito tiveram a taxa reduzida de 3,9% para 2,65% ao mês.
O ministro Carlos Lupi comentou a decisão. “Vejo as atuais taxas como abusivas para os beneficiários do INSS, que são pessoas, em sua grande maioria, extremamente vulneráveis”, disse Lupi em nota.
A redução dos juros do consignado e do cartão de crédito para aposentados e pensionistas do INSS atende também a um pedido da Força Sindical. Na última sexta-feira, a entidade já havia publicado nota cobrando a queda dos índices das duas taxas, que considera perversas e abusivas. Isso porque as instituições de crédito assumem risco baixo e com muitas garantias, já que no consignado, os descontos são feitos direto na folha de pagamento dos segurados do INSS.
O Bradesco BBI avalia que a notícia é negativa para o setor bancário, principalmente considerando que o custo de captação deve continuar alto, pois a taxa Selic continua em patamares elevados (13,75% ao ano).
Conforme destaca o Itaú BBA, o crédito consignado de aposentados e pensionistas do INSS corresponde a uma fatia relevante de R$ 230 bilhões do bolo de crédito no Brasil (conforme dados de janeiro de 2023), ou 7% de todo o crédito a
pessoas físicas.
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De acordo com estimativas de Pedro Leduc e equipe, que assinam o relatório do BBA, o setor perderá R$ 9 bilhões por ano em margem financeira líquida (NII), com spreads cortados quase pela metade.
“Em nossa cobertura, o crédito consignado do INSS tem destaque especial para o Banco Pan BPAN4, com uma fatia de 30% do crédito total, e Bradesco BBDC4, com 6% do crédito total”, apontam.
Para os analistas, o impacto no resultado do Banco Pan pode ser ainda mais significativo, uma vez que os lucros atribuídos a esses créditos serão acumulados. Isso é também indiretamente uma má notícia para seu controlador, o BTG Pactual ([ativo=BPAC11).
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Já o Inter ([ativo=INBR32]) tem uma exposição total de 4% de sua carteira de crédito total, mas suas taxas já estão próximos do novo limite, portanto não terá impacto direto nos lucros. O peso do Banco do Brasil (BBAS3) neste segmento é menor, em cerca de 2% do crédito total.
Leia também: Bancos brasileiros estão bem posicionados para superar caso SVB, mas percepção de risco pode aumentar no setor
O Nubank (NUBR33) ainda não possui crédito consignado, mas o vê como um importante mercado para os próximos anos.
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Segundo análise do Bradesco BBI, apenas 11,1% do total dos bancos cobram taxas menores ou iguais a 1,7% ao mês, enquanto 41,7% cobram taxas entre 1,7% a 2,0%. A maior parte (47,2%) está cobrando tarifas acima de 2,0%. Além disso, a taxa mais alta está em 2,14%, a mais baixa em 1,31%, enquanto a média está em 1,93%.
Entre as ações de sua cobertura, Banrisul (BRSR6) e o Banco Pan têm a maior exposição a esse segmento (20,6% e 17,2% do total de empréstimos, respectivamente), enquanto o Banco do Brasil tem a menor exposição, com 1,9% do total da carteira de crédito, de acordo com cálculos do banco. Para o Itaú (ITUB4), o empréstimo consignado corresponde a 5,9% da carteira de crédito do banco, seguido pelo Santander (SANB11).
O Banco Pan cobra a maior taxa de juros para consignado (2,14% mensal), seguido por Itaú (2,13% mensal), Santander Brasil (2,02% mensal), Banrisul (2,00%) e Banco do Brasil (1,96%).
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Levando em conta esses números, o BBI projeta um impacto de 20,9% nas estimativas de lucro para 2023 do Banco Pan, seguido pelo Banrisul (impacto de 20,6%), Itaú (4,4%), Santander Brasil (2,7%) e BB (1,9%).
“No geral, a notícia não será bem recebida pelos investidores bancários. Além do impacto direto sobre os ganhos, é um lembrete hostil do risco de incertezas em tempos de transição [de governo]. Os spreads neste produto de folha de pagamento já estavam nas mínimas em uma décadas”, apontam os analistas do BBA.
Além disso, eles lembram que o Brasil também está em meio a uma discussão para limitar as taxas do cartão de crédito rotativo.
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“Continuamos cautelosos com os grandes bancos, enquanto o Banco do Brasil mais uma vez se destaca como relativamente menos afetado devido à sua carteira de crédito mais diversificada e estrutura de NII resiliente”, avalia a equipe de análise do BBA.
Na mesma linha, o Bradesco BBI avalia que a notícia deve ser negativa para os bancos no Brasil, pois aumenta
riscos regulatórios, enquanto o novo teto pode reduzir a rentabilidade dos produtos de crédito consignado, embora veja diferentes níveis de impacto nos bancos que cobre.
“Além disso, acreditamos que esse tipo de decisão pode ser um gatilho para discussões adicionais sobre o nível de taxas de juros cobradas pelos bancos no Brasil, principalmente em cartões de crédito rotativo. Mantemos assim a nossa
visão mais pessimista sobre os bancos brasileiros devido a muitos riscos, incluindo (i) regulatório, (ii) deterioração da qualidade dos ativos e (iii) concorrência de bancos estatais [no novo governo]”, avaliam os analistas. Cabe destacar que o BBI rebaixou a recomendação de diversos bancos no começo de março, vislumbrando um cenário desafiador para 2023.
Posicionamento ABBC
No fim da tarde, a Associação Brasileira de Bancos se posicionou sobre o tema. A nota na íntegra segue abaixo:
A ABBC tomou conhecimento da recomendação do Conselho Nacional da Previdência Social – CNPS para que o INSS reduza o teto para o empréstimo e cartão consignado e de benefícios, conforme abaixo:
• Empréstimo Consignado: 2,14% a.m. para 1,70% a.m.
• Cartão Consignado e de benefícios: 3,06% a.m. para 2,62% a.m.
Entretanto, em sentido contrário, desde a última discussão do teto de juros do INSS, em Dez/2021, houve um forte aperto da política monetária, que levou a Selic de 9,25% a.a. para 13,75% a.a. e que teve impacto significativo no custo de captação das IFs.
É importante destacar, também, que os bancos da ABBC são predominantemente de médio e pequeno porte, com custo de captação mais elevado se comparado ao dos grandes bancos.
Sobre esse mercado, é relevante que se sublinhe uma queda importante nas concessões dos empréstimos aos aposentados e pensionistas do INSS. Excluído o público BPC/LOAS, que estão fora do consignado pela Medida Provisória 1164, os novos empréstimos foram de:
o 2019: R$ 78 bilhões
o 2020: R$ 104 bilhões
o 2021: R$ 85 bilhões
o 2022: R$ 56 bilhões
Durante a reunião do CNPS, o setor financeiro se manifestou afirmando que, considerando-se a trajetória de elevação das despesas de captação, comprimiu significativamente as margens que contemplam os custos operacionais e de administração. Nesse sentido, uma eventual redução do teto poderia comprometer ainda mais as condições para a oferta das modalidades empréstimo e do cartão consignado.
Há preocupação de que os baixos tetos estabelecidos afetem de maneira relevante a oferta de crédito, de modo que este público seja obrigado a migrar para modalidades com taxas mais elevadas, como o empréstimo pessoal (taxa média de 5,24% a.m.). Como agravante, um levantamento junto às IFs associadas indicou que mais de 40% dos tomadores do Consignado INSS estão negativados, o que os levaria a recorrer linhas com taxas aproximadas de 20% a.m.
Quanto ao Cartão Consignado e de Benefícios, o produto é utilizado hoje por mais de 8 milhões de aposentados e pensionistas, com compras da ordem de R$ 3 bilhões em 2022.
Sobre os aposentados e pensionistas do INSS, lembramos que se trata de um público de baixa renda, com uma parcela relevante de negativados e não-bancarizados (aproximadamente 8 milhões de aposentados e pensionistas não têm conta em bancos, recebendo por meio de cartão magnético), muitos deles residentes em zonas rurais e locais de difícil acesso.
Acreditamos que haverá impacto também na atuação dos correspondentes, responsáveis por aproximadamente 50% da originação dos valores emprestados, prestando atendimento inclusive em regiões rurais e de difícil acesso, áreas não totalmente assistidas pela rede bancária.
De acordo com dados da Autorregulação, temos hoje 77 mil empresas atuando na oferta do consignado, em sua maioria de pequeno e médio portes, contando com aproximadamente 240 mil profissionais certificados para a venda do produto. Acreditamos que os novos tetos fixados poderão resultar em deterioração importante no mercado de trabalho para esta mão-de-obra, sem falar dos impactos nos quadros das próprias instituições financeiras.
Com o teto aprovado pelo CNPS, estimamos forte impacto nas operações das nossas associadas, o que resultará em redução da oferta da linha ao público-alvo, com riscos relevantes de concentração do mercado em instituições de maior porte e bancos públicos.
Conforme divulgado pelo Banco Central, verificamos hoje instituições que atuam com taxas abaixo do teto, confirmando que o teto não impede a concorrência entre os bancos. A depender do custo de captação ou da estratégia comercial, é normal que bancos atuem com taxas inferiores ao teto.
No entanto, o teto nunca teve como objetivo alijar bancos da atuação no convênio do INSS. Várias instituições, em especial de pequeno e médio portes, já apresentam rentabilidade baixa na operação com o teto atual. Assim, a redução traz riscos à continuidade das suas atuações nesta operação com a implementação dos novos tetos, o que poderá resultar em concentração de mercado em poucos bancos, prejudicando a concorrência na prestação de serviços ao aposentado, em especial para o público não-bancarizado.
Mesmo com este cenário de forte elevação do custo de captação, Febraban e ABBC apresentaram proposta de redução do teto do empréstimo de 2,14% para 2,08% a.m. e do Cartão de 3,06% para 3,00% a.m., como demonstração de esforço do Sistema Financeiro, patamares que consideramos mínimos para não haver impacto na oferta do consignado. O setor também sugeriu a criação de Grupo de Trabalho para avaliar mais a fundo as medidas propostas e suas repercussões antes da tomada de decisão, proposta que não foi acolhida pelo CNPS.
Iniciativas como essas geram distorções relevantes na precificação dos produtos financeiros, produzindo efeitos contrários ao que se deseja, na medida em que tendem a restringir a oferta de crédito mais barato, impactando na atividade econômica, especialmente no consumo. Sendo dessa forma, contrária às iniciativas do Governo de fomentar o crédito no país.
(com Agência Brasil)