Congresso promulga reforma tributária; entenda as principais mudanças

Defensores apostam que mudanças trarão simplificação ao sistema tributário brasileiro, eliminarão distorções setoriais e federativas e reduzirão contenciosos jurídicos e administrativos

Marcos Mortari

O Congresso Nacional durante sessão solene de promulgação da proposta de reforma tributária dos impostos sobre o consumo (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)
O Congresso Nacional durante sessão solene de promulgação da proposta de reforma tributária dos impostos sobre o consumo (Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado)

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O Congresso Nacional promulgou, na tarde desta quarta-feira (20), em sessão solene, a Emenda Constitucional (EC 132/2023) que estabelece a reforma tributária dos impostos sobre o consumo. O episódio marca o avanço de uma discussão que se arrastou por décadas no país e representa a mudança mais profunda já realizada no sistema tributário brasileiro em um período democrático.

A matéria foi aprovada em última instância, na sexta-feira (15), pelo plenário da Câmara dos Deputados, onde já havia sido aprovada em dois turnos em julho, mas teve que retornar após mudanças votadas pelo Senado Federal. Mesmo com as alterações durante a tramitação, a essência da versão original foi mantida na redação final.

Leia também: Reforma tributária: entenda as mudanças de última hora no texto aprovado pela Câmara

Apesar de ser de autoria de um parlamentar, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP), o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deu amplo apoio ao texto e entrou ativamente nas negociações por ajustes em busca do apoio necessário. Por se tratar de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), eram necessários 3/5 dos votos nas duas casas legislativas (ou seja, 308 deputados e 49 senadores), em dois turnos de votação.

A expectativa de integrantes da equipe econômica do governo é que as mudanças tragam simplificação ao sistema tributário brasileiro, eliminem distorções setoriais e federativas e reduzam o volume de contenciosos jurídicos e administrativos.

Com isso eles apostam em uma melhora no ambiente de negócios e um incremento no nível de investimentos no país. Um dos especialistas no assunto, o atual secretário extraordinário de reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, idealizador da versão original da PEC 45/2019, diz que as mudanças devem gerar um crescimento adicional de 12% ou mais em um intervalo de 15 anos.

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A aprovação da reforma tributária foi o gatilho para a agência de classificação de risco Standard & Poor’s elevar, ontem (19), a classificação da nota de crédito de longo prazo em moeda estrangeira (“rating”) do Brasil de “BB-” para “BB” − dois níveis abaixo do grau de investimento. Em comunicado sobre a mudança, a instituição pontuou que, apesar da implementação gradual do novo modelo, a reforma representa uma “revisão significativa” do sistema tributário “e deve se traduzir em ganhos de produtividade”.

Apesar da conclusão do processo legislativo, a reforma tributária depende de regulamentação para poder sair do papel. Por isso, o governo já trabalha em ao menos três projetos de lei complementar para encaminhar ao Congresso Nacional. A expectativa é que os textos possam ser apreciados ao longo de 2024.

Veja os principais pontos da Emenda Constitucional da reforma tributária:

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Simplificação

A proposta votada pelos parlamentares cria um Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) no formato dual, composto por dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

O primeiro substitui três tributos federais: a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI). E será gerido pelo governo federal.

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E o segundo substitui o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).

O IBS atenderá ao princípio da neutralidade e incidirá sobre operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou com serviços. Ele também recairá sobre a importação de bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou de serviços realizada por pessoa física ou jurídica. E não será aplicado sobre exportações, assegurados ao exportador a manutenção e o aproveitamento dos créditos relativos às operações nas quais seja adquirente.

O tributo terá legislação única e uniforme em todo o território nacional, e cada ente federativo fixará sua alíquota própria por lei específica, sem possibilidade de diferenciação de setores, bens e serviços para além dos já previstos na Emenda Constitucional. Uma resolução do Senado Federal fixará alíquota de referência do imposto para cada esfera federativa, nos termos de lei complementar.

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O modelo busca estabelecer uma definição ampla para o fato gerador do novo tributo, sem diferenciação entre produtos e serviços, e garantir a não cumulatividade plena (ou seja, acabar com o chamado “efeito cascata”), com dedução do tributo que incide sobre as operações anteriores, mesmo que indiretamente relacionado à atividade produtiva, em um sistema de crédito financeiro. Também fica estabelecido o regime de cobrança “por fora”, no destino das operações com bens e serviços.

Comitê gestor

No caso do IBS, será instituído um Comitê Gestor (órgão que substitui o Conselho Federativo, previsto na primeira versão da proposta votada pelos deputados), que terá entre suas atribuições editar regulamento único e uniformizar a interpretação e a aplicação da legislação do novo imposto; arrecadar o tributo, efetuar as compensações e distribuir o produto entre entes; e decidir o contencioso administrativo.

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No órgão, Estados, Distrito Federal e municípios serão representados, de forma paritária, na instância máxima de deliberação. Será assegurada a alternância em sua presidência entre o conjunto dos entes subnacionais. Ele será financiado por percentual do produto da arrecadação do imposto destinado a cada ente federativo e o controle externo será exercido pelos próprios Estados, Distrito Federal e municípios.

Na instância máxima do Comitê Gestor, haverá 27 membros, representando cada Estado e o DF; e igual número para o conjunto de municípios e o DF, sendo 14 escolhidos com base nos votos de cada município, com valor igual para todos, e 13 com base em votos ponderados pelas respectivas populações.

Serão consideradas aprovadas iniciativas que obtiverem, cumulativamente, maioria absoluta de seus representantes de Estados e do DF; votos de representantes desses entes que correspondam a mais de 50%; e a maioria absoluta dos representantes do conjunto de municípios e DF.

Pelo texto, pertence aos municípios 50% do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios ou, em relação a veículos aquáticos e aéreos, cujos proprietários sejam domiciliados em seus territórios; e 25% do produto da arrecadação do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação; e do IBS.

Do total arrecadado, 80% são distribuídos com base em critério de proporcionalidade da população; 10% com base em indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos; 5% com base em indicadores de preservação ambiental; e outros 5% igualmente para todos os municípios do respectivo Estado.

Alíquotas e setores beneficiados

No novo sistema, o novo IVA dual contará com uma alíquota padrão, outras duas diferenciadas (com reduções de 30% e 60% em relação à primeira) e uma quarta zerada. Mas não há indicação sobre qual tende a ser o patamar necessário de cobrança no início do funcionamento pleno do novo regime ‒ o que deve ficar para definição apenas na discussão de projeto de lei complementar sobre o assunto.

Eis os itens sujeitos à redução de 60%:

1) serviços de educação;

2) serviços de saúde;

3) dispositivos médicos;

4) dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência;

5) medicamentos;

6) produtos de cuidados básicos à saúde menstrual;

7) serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano;

8) alimentos destinados ao consumo humano;

9) produtos de higiene pessoal e limpeza majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda;

10) produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura;

11) insumos agropecuários e aquícolas;

12) produções artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional;

13) bens e serviços relacionados a soberania e segurança nacional, segurança da informação e segurança cibernética.

Eis os itens com previsão de isenção:

1) dispositivos médicos (a serem definidos por lei complementar);

2) dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência (a serem definidos por lei complementar);

3) medicamentos (a serem definidos por lei complementar);

4) produtos de cuidados básicos à saúde menstrual (a serem definidos por lei complementar);

5) produtos hortícolas, frutas e ovos;

6) serviços prestados por Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos;

7) automóveis de passageiros (conforme critérios e requisitos estabelecidos em lei complementar), quando adquiridos por pessoas com deficiência e pessoas com transtorno do espectro autista, diretamente ou por intermédio de seu representante legal ou por motoristas profissionais (nos termos de lei complementar) que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi);

8) serviços de educação de Ensino Superior nos termos do Programa Universidade para Todos (Prouni);

9) Atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística;

10) produtos da “cesta básica nacional”;

Pelo novo texto, composições para nutrição enteral ou parenteral e as composições especiais e fórmulas nutricionais destinadas às pessoas com erros inatos do metabolismo passam a ser considerados medicamentos, e com isso também receberão tratamento diferenciado com isenção dos tributos.

Em direção similar, o texto inclui no rol de alimentos sujeitos à alíquota com desconto de 60% os sucos naturais sem adição de açúcares e conservantes.

Durante a tramitação no Senado Federal, foi criada uma alíquota intermediária com redução de 30% em relação à padrão. Tal condição se aplicará a serviços de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, desde que sejam submetidas a fiscalização por conselho profissional.

Cálculos feitos pelo Ministério da Fazenda com base no substitutivo apresentado pelo relator no Senado Federal, Eduardo Braga (MDB-AM), em novembro, indicam que a alíquota padrão acumulada pelos dois novos tributos giraria em torno de 26% e 27,5% para manter a atual carga tributária do país. Os números, porém, são apenas estimativas, e o percentual exato será conhecido apenas com a implementação do modelo.

Regimes especiais

Há, ainda, uma especificação de setores que contarão com regimes diferenciados de tributação, por terem atividades não-conciliáveis ao modelo do IVA. São eles:

1) Combustíveis e lubrificantes, sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade. Neste caso, as alíquotas serão uniformes em todo o território nacional, específicas por unidade de medida, e diferenciadas por produto (a versão final retirou previsão de que elas seriam estabelecidas por resolução do Senado Federal);

2) Serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos, podendo prever alterações nas alíquotas, nas regras de creditamento e na base de cálculo; e tributação com base na receita ou no faturamento;

3) Sociedades cooperativas, que será optativo, com vistas a assegurar sua competitividade, observados os princípios da livre concorrência e da isonomia tributária. Neste caso, serão definidas as hipóteses em que o imposto não incidirá sobre as operações realizadas entre a sociedade cooperativa e seus associados, entre estes e aquela e pelas sociedades cooperativas entre si quando associadas para a consecução dos objetivos sociais; além de regras sobre o aproveitamento do crédito das etapas anteriores.

4) Serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, agências de viagens e de turismo, bares e restaurantes, atividade esportiva desenvolvida por Sociedade Anônima do Futebol e aviação regional, podendo prever hipóteses de alterações nas alíquotas, nas bases de cálculo e nas regras de creditamento;

5) Operações alcançadas por tratado ou convenção internacional, inclusive referentes a missões diplomáticas, repartições consulares, representações de organismos internacionais e respectivos funcionários acreditados;

6) Serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual, ferroviário e hidroviário, podendo prever hipóteses de alterações nas alíquotas e nas regras de creditamento; e

7) Operações que envolvam a disponibilização da estrutura compartilhada dos serviços de telecomunicações, que preverá hipóteses de alterações nas alíquotas e nas regras de creditamento.

Durante a tramitação no Senado Federal, havia sido incluída previsão de regime especial para serviços de saneamento e de concessão de rodovias, com previsão de desoneração do imposto na aquisição de bens de capital e hipóteses de alterações nas alíquotas e nas regras de creditamento. O dispositivo, porém, foi suprimido pelos deputados.

No item que trata dos serviços de transporte, a Câmara dos Deputados também retirou o modal aéreo da lista sujeita a regime específico. Desta forma, o setor fica enquadrado nas regras gerais de tributação previstas na emenda constitucional.

No caso dos serviços financeiros, o texto determina que as alíquotas e as bases de cálculo sejam definidas de modo a manter, em caráter geral, a carga tributária decorrente dos tributos extintos até o final do quinto ano da entrada em vigor do regime.

Além disso, a emenda estabelece que não seja elevada a carga incidente sobre operações relacionadas ao funcionamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e abre a possibilidade, por lei complementar posterior, de ampliação de tal tratamento a outros fundos garantidores ou executores de políticas públicas previstos em lei.

“Imposto do Pecado”

Além da CBS e do IBS, a proposta cria um Imposto Seletivo (IS), que poderá incidir sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

O rol de itens sujeitos a tal tributação será definido por lei complementar posterior, mas o texto impede a cobrança sobre exportações, operações com energia elétrica e com telecomunicações.

Durante a tramitação na Câmara dos Deputados, foi retirado dispositivo que tornava explícita a possibilidade de cobrança sobre e armas e munições, exceto quando destinadas à administração pública.

O texto prevê, ainda, a cobrança do tributo no caso de extração, a uma alíquota máxima de 1% do valor de mercado do produto.

Regra de transição

O texto traz duas transições: uma para o consumidor, com duração prevista de sete anos (entre 2026 e 2032). Neste caso, a partir de 2033, os atuais impostos já serão completamente substituídos pela CBS e o IBS.

A outra envolve a redistribuição de receitas entre Estados e municípios a partir da migração da cobrança na origem para o destino. Esta fase, invisível para o contribuinte, terá duração de 50 anos e é acompanhada por lupa por gestores estaduais e municipais, em razão de sua relevância no planejamento fiscal dos entes.

Durante a tramitação no Senado Federal, chegou a ser incorporado mecanismo que premiaria os entes que mais arrecadassem, criando um fator de ajuste a ser considerado na distribuição dos recursos entre estados e municípios. Mas ele foi suprimido pelos deputados na fase final de análise.

“Trava” para carga tributária

Durante a tramitação no Senado Federal, o relator Eduardo Braga incluiu ao texto dispositivo que impõe um limite para a carga tributária com os novos impostos, que será a média de 2012 a 2021, na proporção com o Produto Interno Bruto (PIB), em comparação com os tributos substituídos pela CBS e pelo IBS: PIS/Pasep, Cofins, IPI, ISS e ICMS.

De acordo com a Secretaria Extraordinária de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, a média da carga tributária sob esses parâmetros no intervalo de dez anos indicado foi de 12,5% do PIB.

O mecanismo foi uma alternativa construída em meio à pressão de senadores para que fosse estabelecido um teto para a alíquota padrão cobrada no novo sistema − o que poderia acarretar perda de arrecadação para a União e os entes subnacionais, dependendo do desenho que sair do Congresso Nacional, em razão do volume de exceções e regimes especiais aprovados.

Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional

A proposta institui, ainda, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) com o objetivo de reduzir as desigualdades regionais e sociais, mediante repasses da União para a realização de estudos, projetos e obras de infraestrutura; o fomento a atividades produtivas com elevado potencial de geração de emprego e renda, incluindo a concessão de subvenções econômicas e financeiras; e a promoção de ações com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação.

Há previsão de prioridade a projetos que prevejam ações de sustentabilidade ambiental e redução das emissões de carbono.

Os recursos serão distribuídos anualmente, em valores atualizados pela inflação acumulada, da seguinte forma a cada ano:

1) R$ 8 bilhões em 2029;

2) R$ 16 bilhões em 2030;

3) R$ 24 bilhões em 2031;

4) R$ 32 bilhões em 2032;

5) R$ 40 bilhões em 2033;

6) R$ 42 bilhões em 2034;

7) R$ 44 bilhões em 2035;

8) R$ 46 bilhões em 2036;

9) R$ 48 bilhões em 2037;

10) R$ 50 bilhões em 2038;

11) R$ 52 bilhões em 2039;

12) R$ 54 bilhões em 2040;

13) R$ 56 bilhões em 2041;

14) R$ 58 bilhões em 2042;

15) R$ 60 bilhões a partir de 2043, por ano.

Os recursos serão entregues aos Estados e ao Distrito Federal de acordo com coeficientes individuais de participação, calculados com base em dois critérios: 1) população de cada ente, com peso de 30%; e 2) coeficiente individual de participação do Estado ou do Distrito Federal nos recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE), com peso de 70%.

Compensação de perdas com ICMS

Também é criado o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-Fiscais, que tem por objetivo compensar, até 31 de dezembro de 2032, pessoas jurídicas e físicas (este último grupo incluído na nova versão do texto) beneficiárias de isenções, incentivos e benefícios fiscais concedidos por governos estaduais e covalidados por legislação aprovada pelo Congresso Nacional.

Neste caso, o texto prevê que a União aporte ao Fundo recursos que corresponderão aos seguintes valores (também atualizados pela variação acumulada pelo IPCA):

1) R$ 8 bilhões em 2025;

2) R$ 16 bilhões em 2026;

3) R$ 24 bilhões em 2027;

4) R$ 32 bilhões em 2028;

5) R$ 32 bilhões em 2029;

6) R$ 24 bilhões em 2030;

7) R$ 16 bilhões em 2031;

8) R$ 8 bilhões em 2032.

Uma lei complementar a ser discutida posteriormente estabelecerá os critérios e limites para apuração do nível de benefícios e de sua redução e os procedimentos de análise, pela União, dos requisitos para habilitação do requerente à compensação mencionada.

Zona Franca de Manaus (ZFM)

O texto manteve dois regimes tributários favorecidos estabelecidos na Constituição Federal. São eles: a Zona Franca de Manaus (ZFM) e o Simples Nacional. A manutenção do segundo regime, segundo cálculo do relator da matéria na Câmara dos Deputados, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), preserva 90% das empresas do setor de serviços das mudanças no sistema tributário.

No caso da primeira, o texto do Senado Federal chegou a instituir a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) sobre importação, produção ou comercialização de bens que tenham industrialização incentivada na ZFM ou em áreas de livre comércio referidas pela proposta, garantindo tratamento favorecido às operações nesses locais. Mas o trecho foi retirado pelos deputados.

Como alternativa, a Câmara dos Deputados suprimiu a extinção do Imposto sobre Produtos Industrializados quando a referida CIDE fosse instituída. O texto promulgado estabelece, ainda, que o IPI tenha alíquotas zeradas partir de 2027 – exceto em relação aos produtos que tenham industrialização incentivada na ZFM.

A Emenda Constitucional também institui Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas, que será constituído com recursos da União e por ela gerido, com a efetiva participação do Estado do Amazonas na definição das políticas, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento e a diversificação das atividades econômicas no Estado.

Uma lei complementar estabelecerá o montante mínimo de aporte anual de recursos ao fundo, bem como os critérios para sua correção. Também haverá possibilidade de uso dos recursos para compensar eventual perda de receita do Amazonas em função das alterações no sistema tributário.

O texto traz, ainda, previsão de criação de um Fundo de Desenvolvimento Sustentável dos Estados da Amazônia Ocidental e do Amapá, a ser constituído e gerido pela União, com a efetiva participação dos entes mencionados na definição das políticas, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento e a diversificação de suas atividades econômicas.

Setor automotivo

A Emenda Constitucional prorrogou até 2032 benefícios fiscais concedidos a partir de crédito presumido a indústrias automobilísticas do Nordeste e do Centro-Oeste. O movimento atende sobretudo a montadoras como a Stellantis, que produz veículos das marcas Fiat e Jeep, e a chinesa BYD, que está iniciando operações em Camaçari (BA).

A medida vale tanto para montadoras de carros elétricos quanto para fábricas de veículos tracionados por motor de combustão interna que utilize biocombustíveis isolada ou cumulativamente com combustíveis derivados de petróleo.

Contribuições estaduais

O texto promulgado também tem dispositivo que autoriza Estados a instituir contribuições sobre produtos primários e semielaborados destinadas a financiar investimentos em obras de infraestrutura e habitação. A regra vale apenas para os entes que possuíam instrumento similar, em 30 de abril de 2030, estabelecido como condição à aplicação de diferimento tributário.

Pela regra, a alíquota ou o percentual de contribuição não poderão ser superiores e a base de incidência não poderá ser mais ampla que os das respectivas contribuições vigentes neste ano. E a destinação terá que ser a mesma das regras hoje existentes. A nova contribuição poderá ter validade até 31 de dezembro de 2043.

“Cesta básica nacional”

Há no texto promulgado a previsão de criação de uma chamada “cesta básica nacional”, com desoneração completa de tributos sobre os produtos desta categoria. A definição da lista de produtos ficaria para lei complementar posterior.

Os senadores chegaram a incluir um dispositivo que prevê a criação de uma Cesta Básica estendida, com outros alimentos, aos quais seria aplicado o desconto de 60% em relação à alíquota padrão. Mas o trecho foi retirado pelos deputados.

“Cashback”

Há, ainda, previsão de um modelo de devolução de imposto a pessoas físicas (mecanismo que ficou conhecido como “cashback”), aplicável a pessoas de baixa renda e grupos menos favorecidos da sociedade, com objetivo de reduzir desigualdades de renda. Os critérios, porém, ficaram para definição por lei complementar.

Neste caso, o relator no Senado Federal, Eduardo Braga (MDB-AM), também incluiu novo dispositivo que torna a devolução obrigatória nas operações com fornecimento de energia elétrica e com gás liquefeito de petróleo ao consumidor de baixa renda. E abre a possibilidade de lei complementar determinar que seja calculada e concedida no momento da cobrança da operação.

Compras governamentais

No tratamento das compras governamentais, na parte que trata das importações, foi incluída a expressão “assegurada a igualdade de tratamento em relação às aquisições internas”. O dispositivo busca evitar favorecimento entre os fornecedores brasileiros e sobretudo de fornecedores externos.

Quando entes federativos e as entidades imunes adquirem bens e serviços no mercado interno, o contribuinte de tributos é a pessoa jurídica que os vende, e não o ente ou entidade imune adquirente, o que faz com que haja incidência ordinária dos tributos. Já quando os entes federativos e as entidades imunes importam os mesmos bens e serviços, eles são os contribuintes de direito dos referidos tributos, o que afasta sua incidência na operação e torna a importação mais barata do que a aquisição no mercado interno.

Por isso, o dispositivo incluído determina que, nas importações realizadas pela administração pública direta, por autarquias e por fundações públicas, a imunidade recíproca dos entes federativos deve ser implementada mediante aplicação das mesmas regras válidas para as compras governamentais em geral.

Outros impostos

O texto também avançou sobre matérias que vão além dos chamados impostos indiretos e trouxe determinação de que a segunda etapa da reforma, que tratará dos impostos sobre a renda, seja encaminhada ao Congresso Nacional em até 90 dias.

O substitutivo prevê a cobrança de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) sobre veículos aquáticos e aéreos e a possibilidade de o tributo ser progressivo de acordo com o tipo, o valor, a utilização e o impacto ambiental. Ficam de fora da cobrança: 1) aeronaves agrícolas e de operador certificado para prestar serviços aéreos a terceiros; 2) embarcações de pessoa jurídica que detenha outorga para prestar serviços de transporte aquaviário ou de pessoa física ou jurídica que pratique pesca industrial, artesanal, científica ou de subsistência; 3) plataformas suscetíveis de se locomoverem na água por meios próprios; e 4) tratores e máquinas agrícolas.

No caso do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), estabelece regra de progressividade em razão do quinhão, do legado ou da doação e não incidirá sobre as transmissões e as doações para as instituições sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos.

O texto determina, ainda, que a cobrança do tributo compete ao Estado onde era domiciliado o de cujus, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal.

Atendendo a uma demanda de prefeitos, o texto incluiu dispositivo que autoriza que o Poder Executivo local atualize a base de cálculo do imposto por meio de decreto a partir de critérios gerais previstos em lei municipal, sem necessidade de deliberação por Câmara de Vereadores.

Em outro aceno aos prefeitos, o texto também trouxe dispositivo que autoriza os municípios e o DF a instituir contribuição para o custeio, expansão e melhoria do serviço de iluminação pública.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.