Como os emergentes vão se comportar após estímulos da China e corte de juros nos EUA?

Mudanças nas duas maiores economias do mundo alteraram a dinâmica financeira global

Matheus Prado

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Depois de meses de muita expectativa, duas das maiores placas tectônicas do mercado se moveram praticamente ao mesmo tempo: o Federal Reserve (Fed) iniciou ciclo de afrouxamento monetário de forma contundente, com corte de 0,5 ponto percentual; e a China anunciou pacote agressivo de estímulos monetários e fiscais buscando revitalizar sua economia. Tudo mais constante, as duas medidas deveriam impulsionar mercados emergentes. 

Taxas mais baixas nos Estados Unidos fazem investidores buscarem oportunidades em outras geografias. Assim como uma recuperação da atividade e, principalmente, da confiança de investidores em relação à China levam fluxo para os ativos locais, de países exportado de emergentes e com mandato para alocar em emergentes no geral.

Nessa linha, segundo a TD Securities, houve fluxo de US$ 15,7 bilhões para mercados desenvolvidos e US$ 9,7 bilhões para emergentes na última semana, especialmente para o país asiático. Para o banco de investimento canadense, a dinâmica positiva para mercados secundários pode se estender diante dos anúncios feitos pelo governo chinês.

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A grande questão é quais países estão melhor posicionados para receber este capital que pode, finalmente, sair em alguma medida dos EUA.

“Se, em 2022 e 2023, a resposta de gestores globais provavelmente não fugiria de México e Brasil, hoje a Índia tem posição de destaque nas carteiras, tanto como aposta de boa performance no curto prazo, como de posicionamento estrutural.”

Índia ganha espaço global

Em cinco anos, o índice Sensex subiu 120% e o Nifty 50 avançou outros 127%, e os ativos do país alcançaram os da China em termos de peso no índice de emergentes da MSCI.

Malcolm Dorson, chefe de estratégia de mercados emergentes da Global X, diz que a combinação do estímulo chinês com a flexibilização do Fed cria um poderoso impulso para os mercados emergentes como classe de ativos. Mas espera que a tendência de ‘overperformance’ da Índia continue e que os mercados do sudeste asiático também performem bem.

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Ele diz que, historicamente, em janelas de 6 a 12 meses após o Fed encerrar ciclos de flexibilização, o mercado acionário indiano performa melhor até mesmo que S&P 500, Nasdaq, Russell 2000 e mercados emergentes no geral.

“E agora é também um case estrutural, com expectativa de crescimento forte nos próximos 20 anos, bônus demográfico e governança amigável ao mercado”, diz. “É para comprar e esquecer.”

Financeiro e commodities

O executivo nota ainda que, como a bolsa indiana tem cerca de 60% de exposição ao setor financeiro, é especialmente sensível às taxas de juros. Outros setores preponderantes no país são mineração e siderurgia, que pode se beneficiar de uma recuperação sustentada da China, e, mais recentemente, tecnologia.

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“Sua importância crescente nas cadeias de suprimentos globais fortalece ainda mais sua narrativa”, aponta Andres Abadia, economista-chefe para a América Latina da Pantheon Macroeconomics.

Brasil e México

Ele opina que, ⁠enquanto a Índia ganha terreno diante de perspectiva de crescimento robusta, Brasil e o México enfrentam desafios estruturais como governança mais fraca, ruído político, incerteza fiscal e reformas mais lentas. Ademais, diz, o papel crescente do país no comércio global continuará à medida que constrói infraestrutura e realiza melhorias regulatórias, criando uma vantagem de longo prazo em alocações de investimento.

Isso não impede, segundo Dorson, da Global X, que o mercado brasileiro seja uma opção em prazos menores, também porque as reformas recentes do México inspiram pouca confiança por ora. Entende, inclusive, que 2025 pode ser positivo para as ações e para os juros locais, na medida em que o Banco Central iniciou ciclo de alta de juros enquanto o Fed corta.

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Para ele, conforme o Brasil caminha para ter o maior juro real do mundo, haverá espaço para ciclo de cortes contundente no ano que vem e, quando o BC ‘pivotar’, os ativos tendem a performar bem.

“A inflação global está resfriando e a brasileira deve continuar a caminhar para a meta no início de 2025. Nesse ponto, poderemos ter um potente ciclo de corte de taxas. As ações brasileiras se recuperaram em 4 dos últimos 6 ciclos de corte de taxas do Copom, com uma alta média de aproximadamente 96% e apenas 17% de recuo nas duas quedas registradas. Além disso, as ações brasileiras historicamente se recuperaram cerca de 5% para cada movimento de 1% de baixa do dólar (conforme medido pelo DXY)”, diz.

Até lá, pelo menos segundo levantamento do Goldman Sachs, o cenário pode ser menos construtivo para a bolsa brasileira. Jolene Zhong e Sunil Koul afirmam que os períodos em que o Brasil sobe juros e o Fed corta frequentemente coincidem com o crescimento do prêmio de risco dos ativos locais, diante de incertezas idiossincráticas como a atual questão fiscal.

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Em média, dizem, as ações brasileiras caíram 15% em um período de 6 meses neste cenário. O banco tem posição comprada em KOSPI (índice sul-coreano) contra o Ibovespa.

Câmbio

O câmbio, por outro lado, é visto com mais otimismo no curto prazo. Yan Wang, da Alpine Macro, sugere que é um bom momento para comprar real contra o peso mexicano, para capitalizar a alta de juros do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC contra uma provável reaceleração do ciclo de afrouxamento pelo Banxico.

Para além do diferencial de juros, Wang argumenta que o peso mexicano é uma das moedas emergentes mais sobrevalorizadas atualmente, enquanto o real está entre as mais desvalorizadas. Segundo ele, o Brasil exporta mais em moeda local e em dólar e o peso mexicano tem mais posições especulativas de compra e o real, de venda; e as incertezas fiscais brasileiras tendem a diminuir à frente. “O último sell-off do real traz uma boa oportunidade de compra.”

Nick Bennenbroek, Brendan McKenna e Anna Stein, economistas do Well Fargo, enxergam espaço para o real também performar melhor que o dólar no curto prazo, conforme esperam que a Selic alcance o patamar de 11,75% no fim do ano. “Os aumentos da taxa do BCB, enquanto o Fed está flexibilizando, podem dar suporte à moeda brasileira”, dizem. “E acreditamos que o presidente Lula exercerá disciplina fiscal em 2025, respeitando a estrutura vigente.”

China

O real efeito dos estímulos anunciados pela China na segunda maior economia do mundo ainda é visto com desconfiança por agentes. Abadia, da Pantheon, entende que o que foi apresentado por aqui não será o suficiente para impulsionar uma recuperação sustentada, dado o profundo ajuste estrutural provocado no país pela crise do setor de construção civil. “Mas pode haver alguma mudança de fluxos de capital para mercados ligados às cadeias de suprimentos chinesas”, diz, como é o caso do Brasil.

Dorson, da Global X, opina que é difícil ler o mercado chinês em janelas de mais de 6 meses, mas entende que estímulo e retórica positiva certamente o tornam atraente de uma perspectiva tática – especialmente quando se olha para os nomes de consumo. Wang, da Alpine, espera que o governo anuncie ainda mais medidas e que o mercado acionário chinês continue se recuperando.

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