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*Texto elaborado por Márcio Ferracini, criador do blog ZigZag Trader e trader profissional há mais de 15 anos
Na semana passada os mercados acionários globais enfim atingiram um topo importante e caíram forte na sequência, com o S&P 500 chegando amargar queda de 12% entre a mínima de 2.532 e o topo marcado nos 2.873 pontos. Contudo, o verdadeiro crash ocorreu no mercado de volatilidade – e isso quase ninguém viu.
Quando o assunto é volatilidade, o VIX Index, frequentemente referido como o “índice do medo”, é o produto mais conhecido. O VIX representa uma medida das expectativas do mercado sobre a volatilidade do S&P 500 nos próximos 30 dias. Quanto maior seu valor, maior o nível de aversão ao risco. De tão bem sucedido, futuros e opções de VIX são responsáveis por 25% das receitas financeiras da CBOE (Chicago Board of Options Exchange), a maior bolsa de opções do mundo.
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Fonte: volatilitytradingstrategies.com
Em meio ao pânico que tomou conta do mercado na última segunda-feira (5), o VIX disparou 115% em um único pregão. Para se ter ideia da magnitude do movimento, a maior alta no “índice do medo” havia sido de 64% em 27 de fevereiro de 2007, quando temores de aumento de juros na China causaram estresse nas bolsas globais. Apesar da queda “contida” de 4% do S&P 500 na segunda-feira, o que vimos nos mercados de derivativos foi uma brutal carnificina dos investidores que estavam posicionados na ponta de venda de volatilidade, que pelo histórico de calmaria dos últimos tempos não esperavam por uma “porrada” desta do índice de volatilidade, o que acabou causando um verdadeiro Cisne Negro naquele mercado, uma vez que era algo totalmente imponderável (até então). Mas o que causou tamanho salto?
Tudo muito calmo…
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Coloquemos este movimento recorde do VIX em contexto histórico. A tabela abaixo mostra que o S&P 500 vinha operando na maior sequência de altas (311 dias úteis) sem sequer uma correção de 3%. Em apenas uma outra ocasião em 1996 esta sequência de altas sem correções relevantes do S&P ultrapassou 200 dias úteis.
Fonte: volatilitytradingstrategies.com
O gráfico abaixo mostra o número de ocorrências de VIX abaixo de 10% nas últimas décadas: apenas 4 vezes na década de 1990 e 2000, mas ficou por 59 oportunidades de 2010 em diante, com o detalhe de que todas essas ocorrências foram de 2017 para cá – ou seja, poucos estavam esperando pela volta da volatilidade. Em contrapartida, o VIX vinha operando perto de suas mínimas históricas, abaixo de 10%.
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Fonte: volatilitytradingstrategies.com
Este fenômeno (VIX muito baixo, S&P em alta e sem correções por múltiplos dias) estava sendo causado por uma confluência de fatores fundamentais positivos: inflação global contida; suporte contínuo dos bancos centrais globais aos mercados via estímulos econômicos; melhora nos lucros das empresas; reforma fiscal nos EUA, o que causou uma onda de revisões positivas nas projeções de lucro futuro das empresas. Tudo isso vinha causando uma complacência excessiva nos investidores. Diante disso, não é de se estranhar que uma correção mais contundente no S&P pudesse causar tamanha oscilação no VIX.
…até que veio a tempestade
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Oscilações bruscas na volatilidade causam estragos nos produtos negociados em bolsa vinculados ao VIX, especialmente os alavancados que visam duplicar ou até mesmo triplicar o movimento dos seus índices constituintes. Um dia depois de subir mais de 100%, o VIX passou de 50% e de volta para 25%, provocando suspensão dos negócios em vários ETFs (Exchange Traded Funds) e ETNs (Exchange Traded Note) ligados ao indicador. Um dos produtos financeiros de VIX mais populares e que é negociado em bolsa como se fosse uma ação é o XIV (Credit Suisse Velocityshares Daily Inverse VIX Short ETN. Como revela o gráfico abaixo, o XIV caiu de US$100 para US$6 com a disparada do VIX.
Fonte: StockCharts
Existem cláusulas de termination (execução) em caso de movimentos bruscos no prospecto da maioria desses produtos – e quedas superiores a 80% certamente se enquadram em “movimentos bruscos”. O XIV será liquidado, assim como o produto similar da Nomura Securities. A notícia ruim é que há ainda mais instrumentos alavancados disponíveis no mercado e parece que essas implosões estão se espalhando e contágio é uma palavra preocupante no curto prazo em mercados. A notícia boa é que isso é um “problema mecânico” que o mercado tem que resolver; e uma vez consertado a paz volta a reinar.
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Outro fator agravante se misturou a este ambiente de incertezas expostas acima: a liquidez dos principais mercados, incluindo o S&P futuro, evaporou. É prática comum aos provedores de liquidez diminuir o tamanho dos lotes enviados ao mercado nas duas pontas (compra e venda) através de seus sistemas automáticos em momentos de incertezas, quando o mercado passa por uma condição conhecida como fast market. Isso ocorre por instinto de preservação, pois a enxurrada de ordens abertas e canceladas pode travar sistemas e tornar execuções mais lentas – milissegundos que causam estragos em tempos de HFT (High Frequency Trading). O que não é comum é essa situação perdurar mais do que alguns minutos; no entanto isso ocorreu todos os dias na semana passada e segue sendo observada esta semana, segundo dados da Nanex LLC.
Cisne Negro
Recapitulando, este excesso de volatilidade nos preços das ações foi consequência direta de falta de liquidez nos principais mercados + quebra de paradigma em produtos financeiros ligados à volatilidade (alta recorde no VIX após este índice ter apresentado leituras muito baixas historicamente e por um período prolongado de tempo sem precedentes = complacência recorde). Com a migração do otimismo excessivo para um pessimismo excessivo, ao longo da semana passada as retiradas em massa de recursos dos fundos de ações nos EUA somaram US$ 23 bilhões, cerca de 9% do total de ativos sob gestão.
Portanto, enquanto fundos e ETFs com excesso de derivativos não forem liquidados ou desalavancados os mercados continuarão sob o estresse de não saber qual é o tamanho do estrago, o que se traduz em redução da liquidez, que, por sua vez, facilita a ocorrência de grandes movimentos nos preços dos ativos, porém de direção imprevisível. Grandes oscilações nos preços aumentam o desconforto dos investidores e favorece ambiente de saques contínuos em fundos de ações – tudo isso é fenômeno de curto prazo. Os mercados de risco estavam sobrecomprados e essa correção nos preços é saudável, uma espécie de “megaliquidação” que pode ser aproveitada por investidores com horizonte maior.
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