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SÃO PAULO – Após três anos registrando prejuízo, a BRF (BRFS3) finalmente conseguiu fechar um ano com lucro. A companhia de alimentos informou que fechou 2019 com um lucro de R$ 1,2 bilhão, sendo R$ 690 milhões apenas nos últimos três meses, em meio a um cenário de aumento da demanda chinesa no período (por conta da peste suína africana no gigante asiático) e recuperação das operações.
O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) ajustado da dona da Sadia e da Perdigão, por sua vez, atingiu R$ 1,413 bilhão no trimestre, 67,7% superior ante igual intervalo de 2018. Os números levam em conta apenas as operações continuadas. Já a receita líquida da BRF totalizou R$ 9,290 bilhões no quarto trimestre de 2019, avanço de 12,1% na comparação com o mesmo período de 2018.
A princípio, esses números poderiam se apresentar como positivos, principalmente por conta da reversão do forte prejuízo, de R$ 4,4 bilhões, registrado em 2018. Contudo, os números não agradaram os investidores, fazendo com que as ações caíssem 7,27%, também repercutindo o dia negativo na bolsa brasileira.
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Mas por que os números desagradaram o mercado? O Itaú BBA e o Credit Suisse, que avaliaram os números como fracos, deram destaque para o Ebitda ajustado pelos ganhos tributários com o ICMS, de R$ 1,32 bilhão, 7,5% abaixo do consenso do mercado.
Os resultados foram impactados negativamente pela deterioração do mercado Halal (tipo de produção de carne que segue as regras da religião islâmica), com o Ebitda registrando queda de 13,7% na base de comparação anual, apesar da depreciação de 8% do dólar no período.
Anualmente, os volumes caíam 1% seguindo menores exportações do Banvit (operação na Turquia) para o Iraque, devido à restrição parcial do mercado às importações de produtos da Turquia. Além disso, houve a interrupção temporária pela autoridade saudita das importações da planta de Abu Dhabi. “Tais restrições afetaram o mix de produtos e, uma vez que aumentaram as despesas com frete, explicam a maior parte da redução no lucro bruto”, ressalta a XP Investimentos.
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O Itaú BBA avaliou que já antecipava uma desaceleração no mercado Halal, mas a suspensão das importações da planta de Abu Dhabi teve um efeito mais forte do que antecipado, ofuscando o declínio dos preços de insumo para a divisão.
Do lado positivo, na Turquia, a participação de mercado cresceu 3,5 pontos-base na base anual, a 19,5% no quarto trimestre, como resultado da estratégia de fortalecimento da marca Banvit. Em relação ao mercado Halal como um todo, a BRF encerrou 2019 com uma participação de mercado de 39,4%, em linha com 2019.
Entre os pontos negativos, o Credit Suisse também aponta outros três: (i) menores volumes no mercado doméstico (queda de 2% na base de comparação anual), impulsionados principalmente pela diminuição de 2,2% dos volumes processados; (ii) perda de participação de mercado no Brasil, para 43,2% no quarto trimestre (versus 45,3% em igual período de 2018), principalmente por conta das categorias “congelados” e “salsichas”; e (iii) maior custo de produtos vendidos por quilo, com alta de 1,2% na base de comparação anual, para R$ 5,90 por quilo.
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Além disso, outro segmento não agradou. “Os resultados no Brasil foram mais fracos do que nossas estimativas otimistas, apesar da melhoria anual amplamente esperada em uma temporada de Natal mais forte e com maior lucratividade. Enquanto isso, a fraqueza nos mercados Halal mais do que compensou o crescimento do Ebitda em outros mercados internacionais por conta do impacto da gripe suína africana”, avalia o Itaú BBA.
Por outro lado, a XP avalia que, no Brasil, os resultados foram fortes, com reajuste de preços e recorde na temporada comemorativa. Sobre a participação de mercado consolidada da BRF, que caiu 2,2 pontos percentuais, para 43,2%. Betina Roxo, analista da XP, avalia que a empresa segue com a estratégia de estimular a lucratividade da operação reposicionando preços.
Com relação aos mercados internacionais além do Halal, como Ásia, África, Américas e Europa, o Ebitda ajustado foi de R$ 401 milhões, com os volumes superando as estimativas da XP em 7,3%, mas os preços ficando 5,2% abaixo do esperado e com queda de 1% no trimestre. Contudo, no ano, a alta dos preços foi de 31%, devido aos efeitos contínuos da peste suína africana, que ainda afetam a oferta em vários países asiáticos, resultando em maior demanda por produtos importados.
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Na China, por exemplo, os volumes aumentaram 92,3% na base anual; segundo a BRF, o Japão e a Coreia do Sul também viram uma dinâmica comercial aprimorada, com os importadores temendo uma eventual escassez de frango no mercado devido à maior demanda da China. “Vale ressaltar que em 2019 como um todo, a receita líquida cresceu 29,7% no ano, impulsionada pelo aumento de preço (alta de 26%) e crescimento de volume (alta de 3%), devido aos efeitos da Peste Suína Africana, aumento no número de plantas habilitadas e expansão de vendas para outros países, como Filipinas e Vietnã”, avalia a XP.
Riscos aumentaram
Neste cenário, os analistas do Credit Suisse apontam que, após os dados do quarto trimestre e apesar da enorme escassez de proteínas no devido à gripe suína africana, a BRF não parece estar exposta a um “conjunto interessante de variáveis daqui para frente”. É provável que as operações no mercado Halal continuam sofrendo, as exportações permanecem abaixo das expectativas iniciais e se prevê um período difícil do lado dos custos, principalmente de grãos.
“Os preços da soja no Brasil permaneceram acima dos níveis internacionais, dada a guerra comercial entre a China e os EUA. Além disso, a história parece se repetir no mercado de milho uma vez que, assim como 2015, a produção brasileira atingiu níveis muito altos e as exportações também, deixando o estoque em níveis baixos e os preços sujeitos a condições climáticas piores que o esperado”, afirmam os analistas do banco.
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Apesar disso, os analistas do Credit mantêm recomendação equivalente à compra para os ativos, com preço-alvo de R$ 46,00, mesma recomendação do Itaú BBA, que possui um preço-alvo um pouco menor, de R$ 42. Apesar disso, os analistas da última casa esperam revisar os seus números para a companhia nas próximas semanas, dado o impacto do segmento Halal mais forte do que o esperado e a contabilização dos preços mais altos de grãos, aumentando os custos da companhia, e o crescimento mais baixo da economia do Brasil.
Quem já revisou o preço-alvo após o balanço foi o Bradesco BBI, passando de R$ 47 para R$ 43, mas mantendo recomendação equivalente à compra para os ativos. “BRF está com uma performance abaixo do Ibovespa em cerca de 15 pontos percentuais no acumulado do ano em meio ao aumento das preocupações sobre a alta dos custos com grãos, o impacto do surto de coronavírus para as exportações de proteínas para a China e, hoje, por conta dos resultados mais fracos”, apontam os analistas.
Contudo, após atualizar as estimativas e cortar a projeção para o Ebitda de 2020 em 11%, para R$ 5,28 bilhões, os analistas do banco ainda veem os ativos BRFS3 sendo negociados a múltiplos atrativos.
Além disso, as mudanças nas resoluções sanitárias da China trazem riscos positivos. Durante teleconferência de resultados, os executivos da BRF apontaram que as suas exportações não foram impactadas pelo coronavírus em janeiro e fevereiro e que a empresa pode se beneficiar do suprimento potencialmente mais baixo de proteínas, uma vez que a China proibiu a venda de animais selvagens.
“Dito isto, enquanto nós conservadoramente assumimos uma desaceleração cíclica nos preços das proteínas em 2021 em todo o mundo, uma vez que há um aumento da produção global, a China pode optar por uma recuperação mais gradual / controlada de sua produção devido a problemas sanitários recentes, o que deve dar sustentação aos preços”, aponta o Bradesco BBI. Além disso, essa recuperação mais lenta que o esperado
da produção chinesa poderia levar a custos mais baixos de grãos. “Desta forma, os dados oficiais mensais da China sobre seu rebanho suíno podem fornecer mais clareza sobre o ritmo de recuperação de sua produção de proteínas”, apontam os analistas.
Com esse cenário, a maior parte dos analistas de mercado ainda recomenda compra para os ativos – segundo estimativas de analistas consultados pela Bloomberg, 12 casas de análise recomendam compra, 5 recomendam manutenção e nenhuma recomenda venda. Contudo, os riscos parecem maiores do que os registrados antes do resultado: “as ações estão em patamares atrativos, mas reconhecemos que o curto prazo pode ser pressionado por custos e coronavírus”, destaca a XP.
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