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“A taxação de plataformas estrangeiras é bem-vinda, mas ainda não é o suficiente”. Essa é a visão de Pedro Bartelle, CEO da Vulcabras (VULC3) e conselheiro da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados). Assim como no e-commerce, em geral, que vêm sendo inundando por “blusinhas” asiáticas, entre outros diversos produtos, o setor calçadista já aponta essa preocupação com o avanço, especialmente, os chineses, há muito tempo.
Como gaúcho, nascido em Farroupilha (RS), a reconstrução do Rio Grande do Sul também está no centro das falas do empresário. Já a Vulcabras, com marcas como Olympikus, Mizuno e Under Armour em seu portfólio, não tem tirado o sono de Bartelle.
O empresário conta que, há anos, a companhia investe no parque fabril para ingressar na linha de alta performance. O resultado veio no sucesso da linha de tênis para corrida, que tornou-se queridinha dos praticantes da modalidade. A companhia também tem apostado em chuteiras desenvolvidas no Brasil da Mizuno. “Então, são todas essas iniciativas que têm feito a Vulcabrás continuar crescendo e continuar alavancando”, afirma. Além disso, Bartelle afirma que a empresa segue atenta para novas marcas e realizações de parcerias para representação de nomes no Brasil.
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Incertezas domésticas
Em relação ao cenário macroeconômico, o executivo considera que o Brasil tem muitas incertezas e não é de hoje. O empresário evita vincular o problema a um governo específico, destacando que entende como um problema doméstico já antigo, mas que se intensificou agora. “O Brasil é um país instável, a gente sabe e soube conviver com isso. Mas como toda hora tem uma notícia nova, toda hora tem uma incerteza no mercado, isso tem prejudicado”, aponta.
Apesar disso, a Vulcabras tem apresentado crescimento e, no primeiro trimestre, avançou 5%. Mesmo considerando incertezas, o executivo se diz otimista por confiar tanto na atuação da companhia quanto no potencial que o Brasil tem, em sua visão. Para além de questões macroeconômicas, a concorrência chinesa é um dos pontos que atrapalha a expansão tanto da companhia quanto do setor em si, de acordo com Bartelle.
Concorrência asiática
O tema não é novo mas tem preocupado cada vez mais a indústria calçadista. De acordo com dados elaborados pela Abicalçados, somente em junho, entraram no País mais de 705 mil pares chineses, 261% mais do que no mesmo mês do ano passado. O crescimento é alarmante, de acordo com Bartelle, e parece inexplicável. O executivo explica que a mão de obra representa cerca de 50% do custo do calçado e é aí que o produto chinês apresenta valor mais baixo, além de subsídios.
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“A gente não precisa de nenhuma vantagem para competir com o asiático, nós temos mão de obra muito boa, experiente, nós temos todas as máquinas, todos os sistemas à nossa disposição, de fato a gente faz produtos de altíssima performance aqui, de todos os tipos, todas as matérias-primas, a única coisa que a gente não tem é competitividade por causa de custo”, afirma.
Em sua visão, iniciativas como tarifa de anti-dumping (antes aplicada no Brasil e agora parcialmente presente) não funcionaria considerando a triangulação entre diversos países asiáticos, não apenas a China. A competitividade também não é alcançada com o presente imposto de importação, mas sim através de iniciativas de fortalecimento do mercado e compensação para produtores do setor.
“Hoje, nós conseguimos nos defender do mercado interno, mas você imagina se o Brasil pudesse voltar a ter a competitividade e até pela proximidade o Brasil iria abastecer os Estados Unidos, o Canadá… E depois ia ter que brigar por outros países, mas assim, o Brasil poderia voltar a ser um grande exportador. Isso seria fantástico, isso transformaria ainda mais essa indústria e cresceria muito”, entende. De acordo com o executivo, o Brasil já foi o vice-líder mundial no setor e poderia retomar esse posto (hoje, o país seria o quinto maior exportador mundial de calçados).
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Rio Grande do Sul preocupado
Mais de dois meses após a tragédia das enchentes no Rio Grande do Sul, Bartelle destaca que, se há uma palavra para descrever a situação, é ainda “preocupação”. O empresário é conselheiro do Instituto Caldeira, um hub de inovação que visa fomento de tecnologia e inovação, em Porto Alegre. Em reuniões no instituto, o executivo considera que ainda há muita demora para recebimento do necessário auxílio para reconstrução da região. “Está demorando mais, na minha visão, do que precisava”, afirma.
“O Rio Grande do Sul está com muita gente desabrigada, muita gente na casa de parentes e muita gente que não tem condições esperando os auxílios. O Brasil é um país que precisa empregar, que não é rico, né? Então, no estado que sofre algo tão forte assim, precisa de ajuda”, pondera. Ainda que considere que recursos mais práticos, como colchões e cestas básicas, tenham sido recebidos e bem distribuídos, em sua visão ainda falta estrutura e investimentos para reconstrução da infraestrutura.
Setor de calçados em recuperação
De acordo com o executivo, como conselheiro da Abicalçados, cerca de 1 mil lojas foram atingidas e muitas não abriram até agora. “A indústria que foi atingida praticamente já se recuperou. A indústria, não o comércio”, ressalta Bartelle. A produção do estado representa aproximadamente 25% dos calçados brasileiros mas o consumo na região é de 4 a 5%.
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Para a Vulcabras, as vendas na região gradualmente são retomadas e estão muito próximas da normalização. “O faturamento em maio foi zero. Em junho, já foi 40% do que a gente normalmente faz e, em julho, nós estamos orçando que será 90%. E temos a pretensão de conseguir recuperar um pouquinho o perdido ao longo do ano, até o final do ano”, comenta o CEO.
Mesmo no período de enchente ou logo depois, de acordo com as vendas informadas, as lojas que permaneceram abertas venderam mais do que costumavam. Segundo o CEO, a explicação vai além da possibilidade de ser impacto do apoio de pessoas ao comércio local. O movimento pode ser justificado, também, tanto pela dificuldade logística de entregas de e-commerce no momento, favorecendo vendas em lojas físicas, quanto pela forte corrente de doações que permitiu compras realizadas na região.
E a Argentina?
Mais de 20 anos atrás, o CEO da Vulcabras abriu pessoalmente a filial da companhia na Argentina. No ápice da crise econômica no país portenho, os negócios da companhia praticamente acabaram por lá. “Terminaram porque havia insegurança jurídica gigantesca, falta de dinheiro, falta de crédito, falta de políticas econômicas e tudo mais”, comenta.
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Hoje, no entanto, as exportações foram retomadas e o executivo enxerga mais possibilidades de negócios no país que já representou 10% do volume exportado da companhia (hoje, em torno de 1 a 2%). Outros países da América Latina também deixaram de receber produtos da companhia, como Venezuela.