Bradesco (BBDC4): por que o mercado viu com bons olhos o surpreendente anúncio de mudança do CEO?

Mudança foi recebida como surpresa já que CEOs do banco costumam ficar no cargo por mais de 10 anos, mas também indica reação após fracos resultados

Lara Rizério

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Em uma decisão considerada surpreendente por muitos agentes de mercado, o Bradesco (BBDC4) anunciou nesta quinta-feira (23) que seu conselho de administração aprovou a indicação de Marcelo de Araújo Noronha para o posto de presidente-executivo do grupo financeiro, em substituição a Octavio de Lazari Jr.

A visão do mercado foi de uma mudança positiva em meio aos diversos desafios que o banco enfrenta e levando em conta a grande experiência de Noronha no setor, ainda que siga a cultura do antecessor por já também contar com experiência também no banco. Assim, os ativos BBDC4 subiram 2,67%, a R$ 16,15, bem longe das máximas do dia após chegarem a R$ 16,65 no intraday, ou avanço de 5,85%, mas ainda com ganhos expressivos.

Lazari, de 60 anos, assumiu o comando do Bradesco em 2018. O executivo iniciou sua carreira no próprio banco em 1978. Noronha, de 58, é atualmente vice-presidente do banco para operações de varejo.

“A mudança tem o propósito de iniciar um ciclo de projetos e objetivos estratégicos robustos para os próximos anos”, afirmou o presidente do conselho de administração do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco Cappi, em comunicado do banco à imprensa.

“O contexto de mercado é absolutamente desafiador, do ponto de vista da eficiência operacional, aumento da competitividade e ambiente regulatório”, acrescentou.

O Bradesco encerrou o terceiro trimestre com queda de 11,5% no lucro líquido recorrente sobre um ano antes, carteira de crédito estável e atingindo o pico da inadimplência dos últimos períodos, mas vendo os próximos trimestres como de recuperação na margem financeira.

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O rival Itaú (ITUB4), enquanto isso, teve alta de 12% no lucro líquido recorrente, com avanço na carteira de crédito e inadimplência quase estável.

Durante o mandato de Lazari, período marcado pela aceleração na expansão dos bancos digitais, o Bradesco reduziu o número de agências de 4.617 ao final de 2018 para 2.754, um corte de 1.863 pontos de atendimento. Apenas entre setembro de 2021 e setembro deste ano, o banco fechou cerca de 300 agências no país, buscando ganhar eficiência com redução de custos de atendimento. O Itaú (ITUB4), enquanto isso, tinha 3.509 agências no final de setembro ante 4.940 no fim de 2018, uma redução de 1.431 unidades.

O próprio Lazari afirmou durante a divulgação dos resultados do terceiro trimestre deste ano que “não dá mais para ter rentabilidade com agência física voltada apenas para recebimento de boletos”. Na ocasião, ele disse que o banco deve acelerar a reestruturação de sua rede de agências no próximo ano.

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Ele também apontou que “o pior ficou para trás” e que os índices de inadimplência antecedente, de 15 a 90 dias, mostram redução para os próximos trimestres.

Segundo o Bradesco, a nomeação acatou recomendação do comitê de nomeação e sucessão do banco.

O JPMorgan ressalta que a mudança com Lazari sendo CEO somente desde 2018 é incomum, já que os presidentes anteriores geralmente ficavam cerca de 10 anos ou mais.

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“Desde a sua fundação em 1943, o Bradesco teve apenas 5 CEOs”, avalia, citando que Lazari exerceu seu cargo durante um período em que o Bradesco teve lucros maiores que o Itaú, em 2020, beneficiando-se de taxas referenciais mais baixas e ganhos de  gestão de ativos e passivos (ALM), mas também esteve no comando durante resultados mais fracos nos últimos dois anos, com um agravamento do ciclo de crédito e rendimentos mais fracos no mercado. Noronha será o sexto presidente.

O Bradesco vem numa trajetória descendente de rentabilidade, com o ROE (rentabilidade, ou retorno sobre o patrimônio) saindo do patamar de quase 20% em 2015 para os atuais 11%.

Assim, a primeira visão do JPMorgan sobre a mudança do CEO é positiva. “Embora acreditemos que a cultura de decisões em grupos e colegiados deva permanecer no lugar, acreditamos que os investidores podem ver uma mudança de gestão como uma resposta por conta dos últimos anos”, destacam os analistas.

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A XP vê que a mudança demonstra a proatividade do Bradesco em aprimorar suas atividades operacionais e reduzir os níveis de inadimplência, visando à retomada do crescimento.

“O banco tem um grande desafio para recuperar a rentabilidade nos próximos anos. No entanto, o novo Diretor-Presidente traz consigo uma vasta experiência nos setores bancário e de pagamentos, o que nos leva a crer que ele está apto a liderar uma grande reestruturação operacional no banco. De forma geral, este anúncio reflete o compromisso do Bradesco em tomar medidas e implementar as mudanças necessárias para alcançar crescimento e rentabilidade a longo prazo”, avalia a equipe de análise.

Pedro Canto, analista da CM Capital, também vê possíveis mudanças no radar após a troca “surpreendente” de CEO.

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“A troca vem no momento desafiador para o banco, que vem apresentando sucessivamente resultados trimestrais ruins e ficando para trás do principal concorrente direto [o Itaú] e também com outras fintechs competindo e em busca do market share do banco. No último resultado [do 3T23], o banco apresentou a menor rentabilidade entre os grandes bancos brasileiros”, avalia citando que, mesmo com a melhora da inadimplência da última divulgação, o banco tem ficado para trás na comparação com outros bancos, sendo esta uma fonte de pressão para a troca.

Na visão de Canto, num primeiro momento, o CEO poderia elevar os investimentos no negócio. Isso, no curto prazo poderia parecer algo negativo, pois naturalmente a parte do lucro não seria distribuída via dividendos e juros sobre capital próprio (JCP) e sim seria reinvestida no banco.

“Porém, no médio e longo prazos seria positivo, com melhora dos indicadores de desempenho, uma vez que consequentemente melhoraria as margens da operação e, mais à frente, melhoraria o lucro líquido, gerando maior retorno para o acionista. Esse retorno para o acionista, naturalmente, viria através do ganho de capital. Futuramente, quando a operação estiver mais redonda, mais produtiva, com uma performance melhor e com margens melhores, poderá voltar a distribuir os dividendos de sempre”, avalia.

Hulisses Dias, analista CNPI, vê que a mudança do CEO é um movimento da empresa para criar um fato novo, em busca de recuperar os patamares de lucratividade que o mercado tinha se acostumado a ver, sendo que as ações em alta são indício de que o mercado vê com bons olhos a mudança.

Já o Goldman Sachs vê essa mudança como uma continuidade da atual equipe de gestão e não como uma mudança significativa. “O Bradesco possui uma forte cultura de desenvolvimento interno da alta gestão”, reforça, também destacando o fato da instituição ter contado com apenas 5 CEOs em seus 80 anos de história.

O Goldman mantém recomendação neutra para as ações BBDC4, com preço-alvo para doze meses de R$ 14,70, ou um valor 6,5% abaixo do fechamento da véspera. “Observamos o ambiente operacional desafiador em que o Bradesco opera atualmente, com um ROE historicamente baixo de 11,0% no acumulado dos últimos nove meses versus média histórica de 20,3%”, avalia.

O Citi, que avaliou a entrada do novo CEO como positiva dada a reputação sólida de Noronha, também tem recomendação neutra para BBDC4, mas com preço-alvo maior, de R$ 17,50 (upside de 11% frente o último fechamento).

Já o JPMorgan segue com recomendação overweight (exposição acima da média, equivalente à compra) para o Bradesco, pois vê que o desconto de cerca de 60% em relação ao Itaú como exagerado. “Embora a recuperação possa ser mais lenta do que esperávamos inicialmente, acreditamos que os ROEs retornarão acima do custo de capital, o que significa que a empresa acabará sendo negociada acima do valor contábil. O Bradesco é negociado a aproximadamente 1 vez o valor patrimonial”, avalia, com preço-alvo de R$ 19 para os papéis preferenciais (upside de 21%).

Para o futuro próximo, o JP vê tendências positivas na qualidade dos ativos, melhores rendimentos de mercado e espaço para controle de custos como ventos favoráveis para o guidance, enquanto o crescimento dos empréstimos, a margem financeira dos clientes e a regulação (ruídos sobre cartões e JCP) continuam a ser os maiores desafios.

De acordo com compilação da LSEG com 14 casas que cobrem o ativo BBDC4, 9 possuem recomendação neutra e 5 de compra, com um preço-alvo médio de R$ 16,97, ou avanço de 8% frente o fechamento de quarta-feira. Assim, mesmo com a visão imediata positiva da troca, os analistas também ponderam que o novo CEO terá diversos desafios para enfrentar.

(com informações da Reuters)

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.