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Após mais uma safra de resultados corporativos, que foram considerados, em sua maioria, positivos – com alta de 55% do lucro médio das companhias –, surgem os questionamentos entre os investidores sobre onde estão as “pechinchas” da bolsa. Por mais que a combinação macroeconômica de aperto monetário, inflação persistente e risco de recessão esteja no radar do mercado, as oportunidades estão presentes, em meio ao mau momento do mercado acionário.
Segundo especialistas consultados pelo InfoMoney, um dos principais parâmetros que os investidores podem utilizar para comparar ações e índices é por meio da relação entre o lucro de uma companhia e o seu preço de mercado, o P/E (preço sobre lucro, na sigla em inglês). Outro múltiplo de destaque entre os analistas é o que leva em conta o patrimônio e o preço de mercado de uma empresa, ou P/VPA (preço sobre valor patrimonial).
“A gente sempre olha um conjunto de múltiplos ao analisarmos uma ação. Além de preço sobre lucro e valor patrimonial, costumamos também olhar muito para a relação do valor de mercado e o caixa e do valor de mercado e o Ebitda”, diz Guto Leite, gestor de renda variável da Western Asset.
De maneira geral, é necessário saber que atualmente várias companhias estão “baratas” ao se olhar os múltiplos pelo fato de existir ainda muita incerteza quanto aos futuros das economias brasileira e mundial.
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“Não há um múltiplo verdadeiro [único]. São ferramentas que usamos. Sempre olhamos para eles, mas é necessário olhar com cuidado. Às vezes, é preciso fazer ajustes, que muitas vezes são trabalhosos”, comenta o gestor da Western. “Não necessariamente um múltiplo baixo indica uma boa oportunidade de investimento. Ele é sim um bom sinal, mas é necessário entender porque está barato. Há uma transição tecnológica? A empresa está sob ataque?”, completa.
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Quando se analisa a relação entre o preço de mercado de uma companhia e o seu lucro, por exemplo, Leite lembra que um múltiplo baixo pode significar que parte do mercado não acredita que os ganhos da empresa se manterão no patamar atual no futuro. Quanto o assunto é patrimônio, um múltiplo baixo pode significar que investidores veem que a companhia pode estar queimando caixa ou se desfazendo de ativos.
O cenário atual, com uma série de incertezas provindas do ambiente macroeconômico, também cria, entretanto, uma série de boas oportunidades para se investir.
De acordo com um levantamento da ComDinheiro, realizado para o InfoMoney na última semana, por exemplo, o múltiplo de valor de mercado sobre lucro de todas as companhias do Ibovespa está em 5,6 vezes – se seguissem na mesma dinâmica atual, todas as empresas que compõem o principal índice da Bolsa brasileira faturariam em 5,6 anos o equivalente ao seus valores de mercado, “se pagando” em um curto período de tempo.
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Algumas das companhias têm preço de mercado menor do que patrimônio
Com os atuais descontos, dado todo o cenário, algumas companhias chegam a valer menos do que o patrimônio que elas possuem. Ou seja, o P/VPA está abaixo de 1: neste caso, isso mostra que, trazendo a valor presente o fluxo de caixa esperado no longo prazo para empresa a uma taxa de desconto, isso resulta em um valor menor do que o valor do patrimônio dela hoje.
A Cyrela (CYRE3), por exemplo, segundo levantamento da ComDinheiro, negociava a um P/VPA 0,79, frente ao fechamento da última segunda-feira (23). A MRV (MRVE3), outra construtora, também negocia a menos de um, a 0,71.
As duas empresas, para Guto Leite, são empresas boas e que, no momento, estão baratas. “Gostamos em especial da Cyrela. Dado a alta dos juros, contudo, que mexe com a capacidade de pagamento dos clientes, e à pressão de custos, o mercado está em dúvida sobre como vai ser a venda de imóveis e também como será a margem”, explica. “Mas se você me disser que tem um prazo de investimento longo, me parece uma boa oportunidade”, finaliza.
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Porém, o gestor também aponta oportunidades na Bolsa mesmo entre aquelas ações que negociam com esse múltiplo acima de 1. Ele destaca a Equatorial (EQTL3), que negocia a um múltiplo de 5,67 P/L e a 1,42 P/PVA. “Gostamos muito da Equatorial e ainda vemos a Eletrobras como uma oportunidade, no caso de a capitalização sair”, diz.
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Andre Luzbel, head de renda variável da SVN Investimentos, concorda no ponto de que a Eletrobras (ELET3;ELET6) pode ser um bom investimento, com a privatização no radar. Ele, porém, vê o setor de infraestrutura com mais ressalvas.
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“Uma empresa de infraestrutura teoricamente tem boas margens, mas é necessário gastar muito dinheiro para crescer em ativos. Ao mesmo tempo, o crescimento das tarifas é sempre um problema, uma vez que governos sempre tentam achar jeitos de limitar ajustes”, explica.
Confira as companhias com preço de mercado abaixo do patrimônio
Companhia | Ticker | P/PVA |
ORIZON | ORVR3 | 0,01 |
GAFISA | GFSA3 | 0,26 |
GERDAU MET | GOAU4 | 0,28 |
SYN PROP TEC | SYNE3 | 0,28 |
P.ACUCAR-CBD | PCAR3 | 0,33 |
CEA MODAS | CEAB3 | 0,34 |
LIGHT S/A | LIGT3 | 0,35 |
COGNA ON | COGN3 | 0,36 |
TENDA | TEND3 | 0,41 |
EVEN | EVEN3 | 0,42 |
BANRISUL | BRSR6 | 0,46 |
USIMINAS | USIM5 | 0,50 |
MOBLY | MBLY3 | 0,51 |
IOCHPE-MAXION | MYPK3 | 0,57 |
TRISUL | TRIS3 | 0,58 |
BR MALLS PAR | BRML3 | 0,64 |
BR PROPERT | BRPR3 | 0,64 |
ALIANSCSONAE | ALSO3 | 0,65 |
ANIMA | ANIM3 | 0,65 |
LOG COM PROP | LOGG3 | 0,66 |
COPASA | CSMG3 | 0,69 |
MRV | MRVE3 | 0,71 |
ALUPAR | ALUP11 | 0,72 |
BRASIL | BBAS3 | 0,72 |
EMBRAER | EMBR3 | 0,73 |
LOJAS MARISA | AMAR3 | 0,74 |
SANEPAR | SAPR11 | 0,74 |
ABC BRASIL | ABCB4 | 0,77 |
CYRELA REALT | CYRE3 | 0,79 |
LAVVI | LAVV3 | 0,81 |
IRB | IRBR3 | 0,81 |
GUARARAPES | GUAR3 | 0,82 |
VIA | VIIA3 | 0,82 |
EZTEC | EZTC3 | 0,83 |
ELETROBRAS | ELET3 | 0,84 |
MARCOPOLO | POMO4 | 0,85 |
COPEL | CPLE6 | 0,87 |
NEOENERGIA | NEOE3 | 0,87 |
CIELO | CIEL3 | 0,90 |
SID NACIONAL | CSNA3 | 0,93 |
MULTILASER | MLAS3 | 0,93 |
POSITIVO TEC | POSI3 | 0,97 |
ENERGIAS BR | ENBR3 | 0,97 |
GRUPO NATURA | NTCO3 | 0,97 |
INFRACOMMERCE | IFCM3 | 0,98 |
HAPVIDA | HAPV3 | 0,99 |
MODALMAIS | MODL11 | 0,99 |
INDS ROMI | ROMI3 | 0,99 |
PETROBRAS | PETR4 | 1,00 |
Oportunidades até mesmo em setores mais arriscados
Se no setor de infraestrutura – composto de empresas de energia elétrica, saneamento, até rodovias e mais – o governo pode ser visto como um risco, e que pode em alguns casos justificar múltiplos mais baixos, no de varejo o que é visto como obstáculo para a performance das companhias é, principalmente, o cenário macroeconômico.
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“Companhias de varejo não têm margem. Se errarem, tomam prejuízo. Consomem caixa. Podem quebrar se não conseguirem capital”, diz Luzbel. “Olhando o mercado macro, precisamos achar, no micro, o que tem potencial de crescimento”.
Mesmo assim, investidores se debruçam em alguns cases e afirmam que há diversas oportunidades.
Recentemente, Octavio Magalhães, diretor de investimentos na Guepardo, defendeu, em episódio do Stock Pickers, por exemplo, que a Vulcabras (VULC3) é uma boa oportunidade de aporte – a companhia negocia a um P/VPA de 1,92.
Segundo o gestor, a companhia é uma empresa desalavancada, que cresce em um ritmo alto, operando marcas fortes como a Olympykus, a Under Armor e a Mizuno.
“É uma empresa que está crescendo, entregando resultado. Tem expansão de margens, repassa preços, é líder de mercado”, defendeu Magalhães. “Você me para e pergunta se ela está valendo 30 vezes o lucro: eu digo não. É uma empresa que negocia a cerca de sete ou oito vezes o lucro”, comenta.
Henrique Esteter, especialista de mercados do InfoMoney, por sua vez, lembra do caso do GPA. “Se você faz o sum of the parts (somando o valor das participações das empresas que tem no portfólio), o GPA valeria muito mais do que o negociado em tela”, pontua.
Atualmente, o GPA, segundo a ComDinheiro, negocia a um P/VPA de 0,33 e a um P/L de 2,42.
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Já em relatório, a casa Nord Research destacou que, mesmo após quedas, Via (VIIA3), Natura (NTCO3) e IRB (IRBR3), que negociam abaixo do valor patrimonial, não são boas oportunidades para entrar agora.
Para a Via, a Nord avalia que o papel poderia ser considerado como potencial oportunidade. Entretanto, acredita que a diferença de preços se dá por riscos percebidos pelo mercado, dentre eles: cenário macro bastante desafiador e resultados ainda não tão satisfatórios.
No caso de Natura, os analistas da casa apontam que, conforme informado pela própria empresa, a combinação de desafios internos (simplificação do portfólio, mudança do modelo comercial) e externos (inflação, guerra, suprimentos) fará com que a empresa continue adotando medidas de contenção de gastos e disciplina financeira. Recentemente, a companhia informou ao mercado que suas metas, anteriormente previstas para 2023, foram postergadas para 2024.
“A ação da Natura encontra-se negociando-se abaixo de sua média histórica entretanto, vemos na precificação atual um reflexo dos resultados presentes e das incertezas quanto ao resultado futuro. Nos preços atuais, preferimos aguardar maiores entregas/resultados”, aponta.
Já no caso do IRB, os analistas da Nord avaliam que os prejuízos acumulados dos últimos trimestres mostram a dificuldade em trazer a lucratividade e a rentabilidade da companhia pelo menos para a média de outras resseguradoras do mundo.
“Apesar do preço de tela de IRBR3 parecer bem atrativo, principalmente quando observados os preços que ela já negociou, os riscos em investir na empresa ainda são bem elevados”, apontam.
Setores têm diferença em análise de múltiplos
Ao se observar múltiplos, então, o investidor deve se atentar às particularidades que cada setor possuir. Se no de infraestrutura as possíveis intervenções do governo pesam sobre o preço das companhias, bem como o cenário macro no varejo, todos os setores têm as suas particularidades
No de commodities, por exemplo, os múltiplos geralmente são negociados a menores patamares, por conta de toda incerteza que roda o setor.
“Uma empresa de commodities, dependendo do momento do ciclo, pode estar com múltiplo atrativo e não ser barata. A commodity pode estar, momentaneamente, com o preço anormalmente elevado e a empresa estar com um múltiplo estar barato, mas, do outro lado, você acredita que o preço do produto está errado”, explica Guto Leite.
Andre Luzbel, por exemplo, afirma que não vê a Petrobras (PETR3;PETR4) como uma empresa barata – isso mesmo com a companhia tendo registrado, recentemente, lucros recordes e negociando a um P/L de 2,91 e um P/VPA de 1.
Além dos riscos governamentais e de cenário envolvendo a companhia, Luzbel pontua que ela teve também seus números recentes, principalmente o lucro, impulsionados pela venda de ativos.
Paolo Di Sora, sócio-fundador e CIO da RPS, e André Lion, sócio, CIO e gestor de ações da Ibiuna, do outro lado, defenderam a companhia como atrativa em episódio recente do Stock Pickers. Para os dois, atualmente, a Petrobras não precifica em nada a possibilidade de uma privatização, o que é passa a ser bem possível no caso de uma reeleição do atual presidente Jair Bolsonaro.
“A Petrobras tem zero da privatização precificada e se o Bolsonaro ganha e privatiza, a ação explode”, afirmou André Lion. “Há um upside desproporcional se a privatização acontecer”, disse Sora.
Ainda em commodities, Henrique Esteter lembra do caso da CBA (CBAV3) – que atualmente negocia a um P/L 6,07 e a um P/VPA de 1,57. “A companhia tem uma capacidade de produção de energia similar a uma Cesp (CESP6). Quando se exclui o negócio de energia, o business de alumínio não vale nada”, pontua.
O que o investidor tem de ter em mente ao analisar múltiplos, então, é que, além dos números, é necessário estudar o negócio da empresa. “O múltiplo, às vezes, está barato por um motivo. É ai que vem o trabalho de análise, para entender o múltiplo antes de comprar”, diz o gestor da Western. “No final das contas, é importante saber usar com diligência”.
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