Publicidade
Enquanto o anúncio de Fernando Haddad para o Ministério da Fazenda do novo governo Lula foi recebido de forma morna pelos investidores na última sexta-feira (9), uma vez que o nome já era bastante esperado, os rumores sobre novas nomeações e mudanças de leis no novo mandato do petista abalaram – e muito – o mercado nesta segunda-feira (12). O dia já começou negativo, com queda de commodities como petróleo e minério – em meio a temores de alta de casos de Covid-19 na China e sobre alta de juros nos EUA podendo levar à recessão -, mas a baixa do mercado brasileiro foi causada, principalmente, por motivos internos.
O Ibovespa chegou a cair mais de 3% na mínima do dia desta segunda-feira (12), mas acabou fechando em queda de 2,02%, aos 105.343 pontos, em sua mínima desde o dia três de agosto, quando esteve nos 103.775 pontos. O dólar, por sua vez, chegou a subir até R$ 5,34, mas encerrou o pregão com ganho de 1,26%, a R$ 5,311 na compra e a R$ 5,312 na venda.
Uma série de notícias contribui para toda essa movimentação. Mais cedo, Lauro Jardim, colunista do jornal O Globo, afirmou que Aloisio Mercadante, coordenador da campanha presidencial de Lula em 2022 e hoje peça importante do governo de transição, estaria cotado para assumir a Petrobras (PETR3;PETR4) ou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). No entanto, a opção de comandar a petrolífera nacional é hoje mais forte, complementou Jardim.
“A bolsa brasileira inicia a semana em forte queda, ainda respondendo aos anúncios de nomes para os ministérios do presidente eleito ocorridas na sexta-feira, juntamente com algumas sinalizações dos novos participantes do governo que foram divulgados nessa manhã”, diz Vanessa Naissinger, especialista de investimentos da Rico. “No início do dia, o mercado recebeu mal a notícia de que Aloísio Mercadante é um nome cotado para assumir a presidência da Petrobras ou do BNDES, sendo que a probabilidade de comando da Petrobras segue com mais força”.
O Bradesco BBI destacou que a indicação de Mercadante não estaria em conformidade com a Lei das Estatais, dado seu envolvimento direto na campanha de Lula. Além disso, a sinalização com Mercadante na presidência da empresa seria significativamente negativa para a governança da estatal, apontou a equipe de análise.
Nesta linha, a XP Política apontou ainda que o governo Lula deve promover alterações na Lei das Estatais, como vem sendo dito por interlocutores do presidente eleito desde a campanha.
Continua depois da publicidade
A legislação, aprovada no governo Michel Temer, é vista como obstáculo para nomeações no governo e também para a promoção das mudanças que o PT pretende fazer na Petrobras para ter maior flexibilidade nas decisões sobre política de preços.
Ao menos duas indicações em análise poderiam sofrer algum tipo de vedação por parte da Lei das Estatais: o senador Jean Paul Prates, para a Petrobras, e Aloizio Mercadante, para o BNDES. O Broadcast, por sua vez, destacou que Mercadante estaria mais cotado para comandar o banco de fomento em vez da petroleira.
“Em seu parágrafo segundo, a lei veda a indicação, para o Conselho de Administração e para a diretoria, de pessoa que atuou, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral. A forma como a alteração da lei será feita ainda será debatida com o Congresso, que terá de dar a palavra final, seja sobre uma Medida Provisória, seja sobre um novo projeto”, aponta a XP Política.
Continua depois da publicidade
As ações ordinárias da Petrobras chagaram a ter baixa de 5,17%, a R$ 26,61, e as preferenciais, de 6,39%. Os papéis fecharam em queda de, respectivamente, 2,70% e 3,23%, ignorando a alta de 2,77% do barril de petróleo Brent, que fechou negociado a US$ 78,27.
Insegurança jurídica e descontinuidade
O Itaú BBA viu a notícia como negativa, uma vez que a lei das estatais introduziu um conjunto de regras destinadas a melhorar a regulação entre a relação entre o Estado, como acionista controlador, e as empresas estatais, principalmente com foco em governança corporativa e regras de aquisição para as companhias.
“Acreditamos que os investidores terão uma reação negativa a uma reviravolta nessa legislação, pois poderia facilitar as nomeações políticas para os cargos de diretoria e executivos da Petrobras, ao mesmo tempo em que potencialmente enfraqueceria outros aspectos importantes da governança da empresa, especialmente os relacionados à independência da área de compliance e requisitos para contratos e licitações”, apontam os analistas.
Continua depois da publicidade
Durante a tarde, o próprio Mercadante afirmou desconhecer qualquer discussão no governo eleito sobre a possibilidade de alterar a lei das estatais, e tirou um pouco de pressão do índice e do dólar. “No governo de transição, desconheço iniciativa de alterar lei das estatais”, disse Mercadante ao chegar à cerimônia de diplomação do presidente eleito da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin. Mercadante não quis comentar os rumores sobre sua ida para a Petrobras ou BNDES.
Cabe destacar que, ainda sobre a Petrobras, o site especializado PetróleoHoje mencionou que o novo governo não vê o acordo entre Petrobras e Cade para a venda de refinarias pela estatal como uma barreira para investimento no segmento de refino.
“A decisão do Cade não aumentou a concorrência, não concedeu investimentos no setor e nem reduziu os preços dos combustíveis”, disse William Nozaki, membro do governo de transição. no ministério de Minas e Energia. “A Petrobras aceitou passivamente a decisão do Cade e não se defendeu, o que abre a possibilidade de prevaricação e conluio”, completou Nozaki.
Continua depois da publicidade
O BBI acredita que o novo governo poderia pressionar por uma nova votação no plenário do Cade, que poderia mudar os termos ou mesmo suspender o acordo. O investimento em refinarias pela Petrobras é mal visto pelo mercado, uma vez que é visto como pouco rentável, com analistas vendo como preferível o investimento em exploração e produção.
Ações ligadas ao mercado interno também puxam Ibovespa
Para além das ações da Petrobras, o principal índice da Bolsa brasileira sofreu também nesta segunda com a sangria imposta aos papéis ligados ao mercado interno brasileiro.
“Acho que as notícias internas, com o novo governo, são bem desanimadoras do ponto de vista mercadológico. Há uma preocupação social sem preocupação fiscal e o viés que tem sido passado é preocupante”, diz Francisco Levy, estrategista-chefe da Empiricus Investimentos. “Papéis de consumo, com drivers domésticos, caíram. Utilidades também. Isso foi ligado à piora das perspectivas para o futuro fiscal brasileiro. Vemos a taxa de juros subir forte, acompanhando o noticiário político”, complementa Luiz Adriano Martinez, portfolio manager da Kilima Asset.
Continua depois da publicidade
Os contratos de juros brasileiros, por conta do risco fiscal, fecharam em alta considerável. Os DIs para 2024 ganharam 16,5 pontos-base, com taxa de 13,97%, e os para 2025, 33 pontos, a 13,41%. Os DIs para 2027 foram a 13,12%, com mais 26,5 pontos, e os para 2029, a 13,15%, com mais 26 pontos. No fim da curva, os DIs para 2031 ganharam 25 pontos, a 13,16%.
Além de Mercadante, circulou também o nome da economista Esther Dweck, ex-secretária de Orçamento Federal durante o governo Dilma Rousseff e considerada heterodoxa, ganhou força para ocupar o Ministério do Planejamento.
O temor de investidores é que os nomes ventilados tendem a intensificar s gastos públicos e levem o país a ter mais dificuldades em arcar com suas responsabilidades financeiras no futuro. Com isso, o mercado pede mais prêmio para “emprestar” dinheiro no país, tanto ao governo quanto a empresas e pessoas.
Por isso, companhias ligadas ao mercado interno se destacaram entre as quedas do Ibovespa – elas dependem do consumo dos brasileiros e, com esse cenário, gastam mais para capitar dinheiro e investir. As ações ordinárias da Méliuz (CASH3) perderam 7,14%, as da Cogna (COGN3), 4,76% e as da MRV (MRVE3), 4,71%.
Bolsa brasileira na contra mão do exterior
Lá fora, o dia foi mais otimista: em Nova York, os índices Dow Jones, S&P 500 e Nasdaq subiram, respectivamente, 1,58%, 1,43% e 1,26%, na iminência da decisão do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), que se dá na próxima quarta.
“O mercado projeta que as autoridades monetárias americanas continuarão com o processo de alta de juros, mas com menos força do que as últimas elevações implementadas. O esperado é um aumento de 50 pontos base, após quatro altas de 0,75% consecutivas – elevando a taxa básica de juros americana para o patamar entre 4,25% e 4,50%”, debate Naissinger. “Além das possíveis mudanças na taxa de juros, investidores também aguardam os dados da inflação americana que serão divulgados na terça”.