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As apostas esportivas on-line, as chamadas Bets, devem abalar a economia brasileira, com gastos estimados entre R$ 71,3 bilhões e R$ 239,4 bilhões até o fim deste ano. No entanto, essa empolgação vem acompanhada de impactos negativos que podem afetar negativamente o Produto Interno Bruto (PIB) de 0,6% até 2,1%, conforme apontado por analistas do Santander em relatório divulgado ao mercado.
Apesar do potencial de arrecadação que a regulamentação do jogo promete, os efeitos adversos no consumo e na saúde financeira da população são preocupantes, especialmente para setores como varejo, bens de consumo, instituições financeiras, educação, saúde e shoppings.
Isso porque os dados do relatório indicam que, em meio ao crescimento das apostas, muitos consumidores estão priorizando o jogo em detrimento de compras essenciais. Segundo a pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 1,3 milhão de pessoas entraram em inadimplência no primeiro semestre de 2024 devido ao jogo on-line. Esse cenário, apontam os analistas, afeta especialmente as famílias de baixa renda, que já lidam com desafios financeiros e agora se veem pressionadas a abrir mão de gastos em categorias como alimentação, vestuário e serviços básicos.
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Os estrategistas dizem que os setores de varejo e bens de consumo são os mais vulneráveis, com um impacto acentuado em produtos discricionários. Itens como roupas e acessórios estão sendo sacrificados em favor das apostas. As vendas de produtos essenciais não estão tão afetadas, mas a pressão sobre o consumo nas classes C, D e E é evidente. Em regiões como o Norte e Nordeste, onde a concentração de beneficiários do Bolsa Família é alta, os efeitos negativos do jogo se intensificam, uma vez que muitos apostadores são provenientes dessas áreas.
Saúde financeira e mental
Embora as taxas de inadimplência permaneçam estáveis, o aumento de empréstimos não vinculados a pessoas e a preocupação com os altos níveis de endividamento entre a população de baixa renda são alarmantes, segundo estudo do Santander. A proibição do uso de cartões de crédito para apostas on-line, a partir deste mês, pode acentuar essa crise, uma vez que muitos apostadores tendem a recorrer a empréstimos pessoais ou financiamento via Pix, que já é utilizado por 72% dos apostadores, de acordo com estimativa do banco.
Além do aspecto financeiro, os estrategistas também afirmam que a saúde mental da população está em risco. A dependência do jogo e a busca por tratamento podem sobrecarregar o sistema de saúde pública. Enquanto as instituições privadas podem beneficiar-se desse aumento na demanda, o setor público deve enfrentar pressão adicional para atender a problemas relacionados à saúde mental decorrentes do vício em jogos.
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Dados da Educa Insights, obtidos pelos analistas, revelam que 35% dos 10,8 mil entrevistados não iniciaram um curso superior em razão dos gastos com jogos. Segundo o estudo, a desaceleração nas taxas de matrícula, especialmente na educação a distância, onde 76% dos alunos provêm das classes sociais mais baixas, sinaliza uma preocupação crescente com o futuro educacional de uma geração que prioriza o jogo em detrimento de oportunidades de aprendizado.
Arrecadação
A regulamentação do jogo on-line, que deve entrar em vigor em janeiro de 2025, promete arrecadar entre R$ 3 bilhões e R$ 3,4 bilhões em 2024; e entre R$5 bilhões e R$10 bilhões em 2025. No entanto, esses números são um alívio parcial diante do impacto líquido previsto de 0,2% a 2,1% no PIB do Brasil.
Conforme os analistas, enquanto a arrecadação de impostos pode contribuir para os cofres do governo, os efeitos deletérios no consumo e a deterioração da saúde financeira de uma parcela significativa da população devem ser monitorados com atenção.
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Os setores mais afetados, segundo o Santander:
- 1. Varejo
Os consumidores estão abrindo mão de comprar roupas, acessórios e até alimentos para apostar. As vendas no setor de serviços discricionários, como entretenimento e lazer, estão em declínio, especialmente entre as classes de renda mais baixa, que costumam ser os maiores apostadores. - 2. Bens de consumo
As apostas afetam negativamente a demanda por produtos essenciais, levando a uma desaceleração nas vendas. As empresas que atendem a esses consumidores, especialmente no Norte e Nordeste, onde há maior concentração de beneficiários do Bolsa Família, podem sentir os impactos mais intensamente. - 3. Instituições financeiras
O aumento do endividamento entre os apostadores, principalmente nas classes de baixa renda, gera preocupações quanto ao aumento das taxas de inadimplência. Embora as taxas de inadimplência tenham se mantido estáveis até agora, a expectativa é de que os níveis de dívida elevem a pressão sobre o sistema financeiro, especialmente com a restrição do uso de cartões de crédito para apostas a partir de outubro de 2024. - 4. Educação
O setor educacional também enfrenta desafios. O número de matrículas em cursos de ensino superior caiu, com 35% dos entrevistados em uma pesquisa indicando que os gastos com apostas impediram o início de novos cursos. Isso pode ter implicações de longo prazo no desenvolvimento da força de trabalho. - 5. Saúde
O setor de saúde pública poderá ser sobrecarregado devido ao aumento de problemas relacionados ao vício em jogos, enquanto clínicas privadas podem ver um aumento na demanda por tratamentos relacionados à dependência do jogo e à saúde mental.