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Já era esperado que os grandes bancos listados na Bolsa provisionassem uma parte da exposição a Americanas (AMER3), varejista que entrou em recuperação judicial no mês passado com uma dívida de mais de R$ 40 bilhões, em seus últimos resultados. Mas a cifra total dos recursos “separados” para um caso de calote da empresa chamou atenção pela pujança.
Com base na lista de credores apresentada inicialmente pela Americanas, é possível afirmar que Santander (SANB11), Itaú (ITUB4), Bradesco (BBDC4) e Banco do Brasil (BBAS3), juntos, provisionaram pelo menos R$ 9,588 bilhões para o caso. Para efeito de comparação, a cifra é quase oito vezes o lucro do Bradesco no quarto trimestre.
Algumas das instituições financeiras optaram por provisionar o valor total da dívida já nesse último balanço, enquanto outros decidiram deixar para diluí-la nos resultados futuros (e um caso específico utilizou provisões ao longo de 2022 para fazer um provisionamento menor no 4T22).
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Na avaliação de Conrado Rocha, gestor da Polo Capital, o banco que provisiona apenas uma parte da dívida dá a entender que há uma chance de recuperação do crédito – e essa mensagem chega a Americanas.
“Por outro lado, quando se provisiona tudo, pode ser que haja um incentivo errado. Para o devedor, chega a mensagem de que a dívida ‘já foi'”, explica Rocha, que acredita que o credor perde poder de negociação nesse caso.
Ainda assim, em caso de recuperação de crédito, as instituições que decidiram por provisionar 100% da dívida tendem a se beneficiar por ganhos extraordinários ao longo de 2023.
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“Eu prefiro o conservadorismo [de quem provisiona tudo], mas também acho que vai haver recuperação [dos valores provisionados]”, afirma Rocha.
Seja total ou parcial, a verdade é que as provisões afetaram, em maior ou menor escala, os lucros das maiores instituições financeiras também – além de bancos de menor porte, que também estão expostos à dívida bilionária. Veja a seguir, como o efeito Americanas foi sentido nos balanços.
Santander iniciou temporada sem detalhar valor das provisões
De acordo com a lista de credores que a Americanas entregou à Justiça, a varejista possuiu uma dívida de R$ 3,65 bilhões com o Santander. No entanto, o banco não confirmou a exposição exata ao caso nem o quanto foi provisionado no quarto trimestre de 2022 com essa finalidade em específico. Na teleconferência com analistas, sobre os resultados, o CEO do banco, Mario Leão, disse apenas que o banco havia feita provisão “com materialidade” para o evento subsequente.
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O Credit Suisse, contudo, estima que as provisões relacionadas a Americanas tenham sido da ordem de R$ 1,1 bilhão, algo em torno de 30% da exposição do Santander à varejista. O Itaú BBA também calcula que o provisionamento tenha ocorrido nessa mesma proporção.
Isso porque na carteira de crédito do banco, é possível observar um aumento nos volumes classificados como “escala E” – e que passaram de R$ 3,774 bilhões no terceiro trimestre para R$ 7,185 bilhões. O aumento equivale a um valor semelhante ao que seria a dívida da Americanas com o Santander. Créditos na “escala E”, por sua vez, exigem pelo menos 30% da exposição.
“Se estivermos certos e apenas 30% foi provisionado, estamos olhando para uma enorme revisão para baixo nas previsões de ganhos do banco para 2023”, escreveram os analistas do BBA.
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Na avaliação do Morgan Stanley, a falta de disclosure não ajuda a entender o quanto dessas provisões ajudam a cobrir o risco total. Sem esse dado também não foi possível saber o impacto da provisão tanto no lucro do banco quanto em sua rentabilidade. As demais instituições financeiras trouxeram isso no detalhe.
“Dada a falta de divulgação e orientação, a quantidade de estimativas do mercado para o lucro e retorno sobre patrimônio do Santander em 2023 será ampla”, escreveram os analistas do Morgan Stanley.
“Estamos cortando nossa estimativa de lucro líquido em 24%, mas, evidentemente, temos pouca convicção em nossa previsão, dada a relutância da administração em fornecer transparência adequada sobre isso”, concluíram.
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Itaú provisionou 100% da exposição à dívida da Americanas
Ao contrário do Santander, o Itaú deixou claro o impacto do provisionamento para Americanas em seus principais números. As provisões referentes à exposição do banco a Americanas geraram um impacto de R$ 1,307 bilhão no custo do crédito do Itaú no quarto trimestre e o banco deixou de lucrar mais R$ 719 milhões no período, ao decidir provisionar 100% da dívida da varejista.
Na primeira lista de credores apresentada pela Americanas a Justiça, no final de janeiro, constava que a empresa devia R$ 2,8 bilhões ao Itaú. No entanto, a varejista atualizou os valores em uma segunda lista, entregue após a divulgação do balanço do banco. Nela, a dívida passa para R$ 4,3 bilhões.
Ao que tudo indica, o provisionamento feito até então diz respeito ao valor divulgado inicialmente.
“Na divulgação, o banco falou em R$ 1,3 bilhão de provisão adicional e transferiram R$ 1,5 bilhão de provisão ‘em excesso’ que já possuíam direto para Americanas”, explica Rocha, da Polo Capital.
Ainda que impactado, o Itaú registrou lucro recorrente gerencial, excluindo itens extraordinários, de R$ 7,668 bilhões no quarto trimestre deste ano. O número é 5,1% menor que o registrado no terceiro trimestre.
A despesa de provisão para créditos de liquidação duvidosa do banco foi de R$ 9,907 bilhões no quarto trimestre de 2022. A cifra cresceu 19,7% em relação ao terceiro trimestre. Na comparação anual, houve um salto de 45,1%.
Na avaliação da XP, a provisão de 100% sobre a exposição a Americanas “limpa os resultados de 2023 de qualquer impacto adicional”.
Para os analistas do Bradesco BBI, “o atual momento positivo do banco permitiu o provisionamento de 100%, evitando impactos em 2023”, avalia.
Para a Genial Investimentos, “com o balanço limpo” para 2023, a agenda volta ser de crescimento”.
Bradesco lucrou R$ 3 bilhões a menos com efeito Americanas
Sem citar diretamente o nome de Americanas, o Bradesco informou ter feito 100% de provisionamento relacionado a um caso de “um cliente Large Corporate específico”, ocorrido no início de 2023, no valor R$ 4,9 bilhões.
“A administração reavaliou os riscos inerentes e, de forma prudencial, provisionou 100% da operação, afetando o lucro do 4T22”, diz o comunicado. Sem levar em conta essa provisão, o retorno sobre patrimônio líquido médio (ROAE) do trimestre teria sido de 10,3%.
O lucro líquido recorrente do banco, sem esse efeito, seria de R$ 4,262 bilhões, informou o Bradesco. Ou seja, o impacto líquido da provisão foi de aproximadamente R$ 3 bilhões, já que o banco acabou registrando lucro líquido de R$ 1,256 bilhão no período.
Ao contrário do Itaú, o Bradesco não usou provisão complementar previamente feita para a exposição a Americanas.
Para a XP, um lado bom do provisionamento total de Americanas foi eliminar totalmente possíveis impactos deste caso em 2023.
Enquanto isso, o Itaú BBA avaliou que, mesmo excluindo o “efeito Americanas” do balanço, o lucro de R$ 4,3 bilhões também teria ficado aquém das suas estimativas com a tendência de crédito pior.
O Citi, por sua vez, aponta que, sem o impacto da varejista, o lucro teria ficado 3% acima de suas projeções e 8% além do consenso de mercado. Mas, mesmo assim, os dados não foram positivos, uma vez que o custo de risco foi de R$ 10,5 bilhões, acima do guidance de R$ 8 bilhões a R$ 10 bilhões.
“Não fosse o provisionamento de Americanas, o banco teria entregue um lucro líquido acima da expectativa. Mas, olhando as outras linhas, o resultado foi ruim, a inadimplência continua alta, e o Retorno sobre o patrimônio líquido (ROE, na sigla em inglês), que figurava entre os melhores junto com Itaú, acabou decepcionando”, aponta André Fernandes, head de Renda Variável e sócio A7 Capital.
Banco do Brasil provisionou 50% da dívida da varejista
O BB informou ter provisionado R$ 788 milhões para o caso. O valor corresponde à metade da dívida que a Americanas tem com o banco, de R$ 1,3 bilhão.
“A provisão é técnica, baseada em nossos modelos e requer acompanhamento do caso daqui pra frente”, afirmou Felipe Prince, vice-presidente de controles internos, na teleconferência com analistas sobre os resultados da companhia.
O Banco do Brasil adotou uma postura diferente de outros “bancões” em relação à divida da varejista em recuperação judicial. Itaú e Bradesco optaram por provisionar 100% de suas exposições já no balanço do quarto trimestre de 2022.
“Com o tempo, colocamos novas variáveis nesse modelo que vão dizer se a provisão é suficiente ou se vamos ter de elevá-la”, explicou Prince. Contudo, ele afirmou estar certo de que o banco será capaz de recuperar ao menos uma parte do crédito.
O banco estatal registrou lucro líquido ajustado de R$ 9,039 bilhões, segundo balanço divulgado na noite de segunda-feira (13). A cifra é 52,4% maior que a registrada um ano antes.
Desconsiderando o evento subsequente, o lucro líquido ajustado seria de R$ 9,4 bilhões no trimestre, equivalente a um Retorno sobre o Patrimônio Líquido (RSPL, ou ROE em inglês) anualizado de 23,4%.
Caso o banco decidisse provisionar 100% da exposição, o lucro líquido ajustado no trimestre seria de R$ 8,6 bilhões, com um RSPL anualizado de 21,8%.
No ano de 2022 como um todo, o resultado ajustado do Banco do Brasil alcançou R$ 31,8 bilhões, crescimento de 51,3% na comparação com 2022. O RSPL foi de 21,1%.
Sem o provisionamento de Americanas, o lucro líquido ajustado de 2022 seria de R$ 32,2 bilhões. Se o banco optasse por ter feito 100% de provisão para o caso, em uma simulação, o lucro líquido ajustado teria sido de R$ 31,4 bilhões no ano.
Outros bancos
Na lista de credores da Americanas, o BTG Pactual (BPAC11) aparece com R$ 3,5 bilhões a receber da empresa em recuperação judicial. No balanço do quarto trimestre, o banco afirma ter feito uma provisão não-recorrente de R$ 1,2 bilhão – sendo R$ 1,123 bilhão na área de Corporate & SME Lending em função da exposição de crédito e R$ 77,0 milhões na área de Sales & Trading.
De acordo com o BTG, a cifra corresponde a 63% da exposição de R$ 1,9 bilhão. Há mais R$ 1,2 bilhão bloqueado pelo banco para compensar dívidas da Americanas, tema de discussão na Justiça.
Com as provisões, o BTG deixou de lucrar R$ 580 milhões no trimestre e o retorno sobre patrimônio (ROAE, na sigla em inglês), que seria de 22%, ficou em 16,7%. No trimestre, o lucro líquido ajustado foi de R$ 1,767 bilhão, queda anual de 0,84%.
O ABC Brasil (ABCB4), especializado na concessão de crédito e serviços para empresas de médio a grande porte, provisionou R$ 117 milhões para o caso específico. O valor inclui R$ 50 milhões de provisões genéricas, que já estavam no balanço anteriormente, mais R$ 67 milhões específic0s para o evento isolado.
A cifra total corresponde a menos de 1% da carteira de crédito do ABC Brasil. “A gente não vê como uma exposição relevante para nós”, afirmou Ricardo Moura, diretor de Relações com Investidores do banco, em entrevista ao InfoMoney, sem citar o nome da varejista, já que o banco não comenta sobre clientes específicos. O caso é tratado como evento isolado no segmento de CIB (corporate e investment banking).
O executivo calcula que esse evento teve impacto de aproximadamente R$ 29 milhões no lucro líquido recorrente do banco no 4T22 (que ficou em R$ 197,3 milhões). Já o retorno sobre patrimônio líquido, que foi de 15,3% no período, teria sido de 17,5%, não fosse o provisionamento.
Fora da Bolsa, o banco Daycoval fez uma provisão de 50% dos cerca de R$ 500 milhões que tem com o grupo; a instituição lucrou R$ 378 milhões no quarto trimestre de 2022, aumento de 9,2% ante igual período do ano anterior. O resultado recorrente somou R$ 394,2 milhões, expansão de 21%.
Já o banco BV (ex-Votorantim) encerrou o quarto trimestre de 2022 com lucro líquido recorrente de R$ 279 milhões, queda de 33,8% em relação ao mesmo intervalo de 2021, também impacto pelo efeito Americanas. O banco é um dos credores da companhia com uma exposição de R$ 206 milhões. A provisão do caso fez com que o banco apresentasse ROE de 9% no trimestre, queda de 5,5 pontos porcentuais em um ano.
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