Balanços dos “bancões” mostram disparidades e desafios de manter rentabilidade em cenário de inadimplência mais alta

Balanços também foram afetados por provisões com Americanas

Mitchel Diniz

Fonte: Reprodução
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A temporada de resultados dos “bancões” confirmou muito do que os analistas do mercado esperavam. Enquanto Banco do Brasil (BBAS3) e Itaú (ITUB4) se destacaram positivamente, Bradesco (BBDC4) e Santander (SANB11) entregaram números considerados fracos.

Em parte, parece uma reprise do que aconteceu no terceiro trimestre de 2022, mas a excepcionalidade do caso Americanas (AMER3) atingiu a todos, em maior ou menor escala.

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Mas deixando de lado as provisões sobre dívidas da varejista, que “sujaram” os balanços do quarto trimestre, os bancos expuseram outras fragilidades e algumas resiliências.

De maneira geral, as instituições financeiras tem lidado com um aumento da inadimplência e trabalha com um cenário de juros mais altos por mais tempo, além de um crescimento menor (com risco de estagnação) da economia em 2023.

O aumento na inadimplência do cliente pessoa física e de empresas  de pequeno porte atingiram, principalmente, os balanços de Bradesco e Santander, mais expostos a esse tipo de crédito.

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“Devíamos ter restringido mais cedo nossa política de crédito”, admitiu Octavio de Lazari, CEO do Bradesco, na teleconferência sobre o balanço com analistas. Segundo ele, a perda de renda de clientes do banco aconteceu de forma mais rápida que o esperado.

“Temos importante exposição à baixa renda e pequenas empresas”, lembrou Lazari.

O Itaú afirmou que vem fazendo ajustes no apetite de forma cuidadosa em função do cenário. O banco esperava crescer sua carteira de crédito entre 15,5% e 17,5% em 2022, mas expandiu apenas 11,1%, ficando, portanto abaixo do piso do guidance.

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“Fico muito confortável em ter entregue um número abaixo do guidance por essa razão”, explicou Milton Maluhy Filho, CEO do banco.

Santander: banco teve margens pressionadas

O Santander Brasil reportou lucro líquido gerencial de R$ 1,689 bilhão no quarto trimestre de 2022 (4T22), cifra 46% menor do que o reportado no terceiro trimestre de 2022 e uma queda de 56% na comparação com o mesmo período de 2021.

O número ficou 41,04% abaixo do consenso Refinitiv, que previa lucro líquido reportado de R$ 2,864 bilhões.

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O retorno sobre o patrimônio líquido (ROE, na sigla em inglês) foi de 8,35% no 4T22, uma queda de 7,3 pontos percentuais no trimestre.

As despesas líquidas com provisões para devedores duvidosos (PDD) ficaram em R$ 7,364 bilhões, 18,6% acima ante o trimestre anterior e 99,4% em relação ao quarto trimestre de 2021.

A carteira de crédito atingiu R$ 489,687 bilhões no dia 31 de dezembro de 2022, representando crescimento de 5,8% se comparado com o mesmo período do ano anterior.

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Santander Brasil: analistas reforçam ceticismo com ativos após 4º trimestre fraco

A margem financeira bruta alcançou R$ 12, 517 bilhões no quarto trimestre de 2022, com queda de -0,6% em relação ao 3T22 refletindo principalmente o menor resultado com clientes no período que apresentou queda de -2,6%.

Os analistas avaliaram que, por um lado, a abordagem mais seletiva do banco na concessão de crédito ao longo de 2022 resultou em um crescimento mais lento de sua carteira de crédito, pressionando sua margem financeira bruta.

Por outro lado, essa abordagem cautelosa permitiu ao banco manter sob controle suas taxas de inadimplência, que aumentou, mas para níveis ainda saudáveis de ​​3,1%.

Itaú: resultados operacionais impressionaram, mesmo com provisionamento

O Itaú registrou lucro recorrente gerencial, excluindo itens extraordinários de R$ 7,668 bilhões no quarto trimestre deste ano. O número é 5,1% menor que o registado no terceiro trimestre. Na comparação com o mesmo período do ano passado, a cifra cresceu 7,1%.

O consenso Refinitiv apontava para lucro líquido reportado de R$ 8,239 bilhões.

O retorno recorrente gerencial sobre patrimônio líquido (ROE) do Itaú caiu de 21% no terceiro trimestre para 20,3% no quarto tri.

A carteira de crédito do banco cresceu 2,7% na comparação com o terceiro trimestre, para R$ 1,141 trilhão. No ano, a carteira teve expansão de 14,2%, ficando abaixo do guidance previsto para 2022 (entre 19% e 21%).

A margem financeira gerencial total do banco foi de R$ 24,97 bilhões no quarto trimestre, com alta de 17,8% em bases anuais.

O índice de inadimplência de empréstimos acima de 90 dias no Brasil cresceu de 3,2% para 3,43%.

“O aumento ocorreu devido à maior inadimplência no segmento de pessoas físicas no Brasil, principalmente nas carteiras de cartão de crédito e financiamento de veículos”, diz o texto que acompanha o balanço.

Uma leitura mais detida dos números mostra a resiliência do banco, mesmo em um cenário desafiador. A tese da ação da instituição financeira como uma das preferidas entre os “bancões” foi reforçada após o balanço.

Itaú mostra números fortes no 4º tri, “limpa” balanço de Americanas e traz alívio

A XP aponta ver os resultados do 4T22 do Itaú como sólidos, apesar do lucro líquido abaixo do esperado e impactado pelo considerável provisionamento de R$ 1,3 bilhão relacionado provavelmente o caso da Americanas).

Os analistas do Credit Suisse reforçaram a recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra) no nome e acreditam que o desempenho operacional continuará a se distanciar de outros pares do setor privado.

A Genial Investimentos ressalta que a melhor notícia que vem com o provisionamento de Americanas em 100% é que, com o “balanço limpo” para 2023, a agenda volta ser de crescimento.

Em teleconferência com analistas, o presidente-executivo do banco, Milton Maluhy Filho, apontou que as provisões previstas pelo Itaú para 2023 já contemplam uma piora conjuntural do crédito no atacado brasileiro. Ele revelou que a expectativa de piora na qualidade do crédito com grandes clientes explica em parte o aumento de cerca de 20% do chamado custo do crédito em 2023 e que isso reflete uma política conservadora do banco.

O banco estimou que o custo do crédito neste ano vai ser de R$ 36,5 bilhões a R$ 40,5 bilhões. No ano passado, foi de R$ 32,3 bilhões.

Bradesco: banco tem desafios para recuperar rentabilidade

O Bradesco registrou lucro recorrente de R$ 1,595 bilhão no quarto trimestre de 2022 (4T22), uma queda de 75,9% na comparação anual. O resultado veio bem abaixo do consenso Refinitiv, que previa lucro de R$ 4,404 bilhões.

A margem financeira total atingiu R$ 16,677 bilhões, queda de 1,7% na comparação ano a ano.

Além disso, a qualidade de sua carteira de empréstimos – que cresceu 9,8%, a R$ 891,9 bilhões – voltou a piorar, com o índice de inadimplência acima de 90 dias chegando a 4,3%, ante 3,9% no fim de setembro e 2,8% um ano antes, com destaque para os segmentos pessoa física e de pequenas e médias empresas.

O retorno médio sobre patrimônio líquido (ROAE, na sigla em inglês), que mede como um banco remunera o capital de seus acionistas, foi a 13,1% no acumulado em doze meses. No trimestre, fechou a 3,9%, baixa de 13,6 pontos porcentuais em um ano e de 9,1 pontos em três meses.

“Estamos trabalhando intensamente em nosso objetivo de alcançar retorno recorrente de pelo menos 18%”, disse. No trimestre, com as provisões para Americanas e a piora na carteira de varejo, o rentabilidade do banco foi de apenas 3,9%.

O banco americano Goldman Sachs cortou a recomendação das ações BBDC4 de compra para neutro, após os resultados.

Além disso, analistas comentaram que as projeções (guidance) do Bradesco para 2023 apresentadas junto com o balanço foram muito mais conservadoras do que o esperado, indicando que levará tempo para que a lucratividade se recupere. O banco projeta um crescimento da carteira de crédito total entre 6,5%-9,5%; uma margem financeira com clientes registrando crescimento entre 7,0%-11%; um crescimento das Receitas de Seguros entre 6,0%-10,0% e um custo do crédito entre R$ 36,5 bilhões e R$ 39,5 bilhões.

O Goldman espera que o retorno sobre o patrimônio liquido (ROE, na sigla em inglês) siga pressionado neste ano e volte aos patamares de 17% apenas em 2025.

Enquanto isso, segundo Goldman Sachs, o ROE provavelmente permanecerá abaixo do custo de capital próprio de 13% por pelo menos mais alguns trimestres e provavelmente durante todo o ano de 2023, “justificando uma avaliação abaixo do valor contábil”.

Os fatores além de Americanas que impactaram o resultado do Bradesco no 4º tri

A recomendação do banco vai em linha com o ceticismo de mais analistas de mercado, que veem uma demora para o Bradesco voltar a registrar bons números. Isso em um contexto em que os executivos do banco admitiram que os modelos de risco demoraram a detectar a piora na qualidade da carteira de crédito, o que deve implicar em avanço da inadimplência na primeira metade deste ano.

“Embora acreditemos que os investidores já esperavam resultados fracos para o quarto trimestre de 2022 e primeiro semestre de 2023, o guidance do Bradesco sugere um ambiente ainda mais difícil pela frente”, disse o Citi em relatório assinado por Rafael Frade e equipe.

Banco do Brasil teve a melhor rentabilidade da temporada

O Banco do Brasil registrou lucro líquido ajustado de R$ 9,039 bilhões no quarto trimestre de 2022. A cifra é 52,4% maior que a registrada um ano antes.

O resultado ficou acima do esperado. O consenso Refinitv previa R$ 8,083 bilhões de lucro reportado.

A margem financeira líquida do Banco do Brasil foi de R$ 14,917 bilhões no período, crescimento de 35,5% em bases anuais.

A carteira de crédito ampliada do banco atingiu R$ 1,004 trilhão no período, aumento de 14,8% em relação a um ano antes e de 3,7% na comparação trimestral.

O retorno sobre patrimônio líquido (RSPL) anualizado alcançou 23,0% no 4T22, o melhor da temporada.

O índice de inadimplência para empréstimos acima de 90 dias foi de 2,34% em setembro para 2,51% ao final de dezembro de 2022.

“Mais uma vez, o perfil defensivo de sua carteira continua prevalecendo e leva a um índice de inadimplência de 2,5% (alta de 17 pontos-base na comparação trimestral) e bem abaixo de seus pares”, apontaram os analistas da XP. Com relação ao tema, em teleconferência, o vice-presidente financeiro do BB, José Ricardo Forni, afirmou que a inadimplência da carteira pessoa física da instituição vai se estabilizar nos próximos trimestres.

O Bradesco BBI, que classificou os resultados como impressionantes, destacou que a Margem Financeira Bruta apresentou outra sólida expansão, pois os ganhos relacionados ao mercado continuaram se beneficiando do crescimento dos títulos de renda fixa, enquanto a margem com clientes se beneficiou da expansão da carteira e do aumento das taxas de juros.

Na esteira dos bons resultados e também nas projeções do banco para 2023, o JPMorgan elevou a recomendação para os ativos BBAS3 de equivalente a neutro para overweight (exposição acima da média do mercado, ou recomendação equivalente à compra), com o preço-alvo sendo elevado de R$ 50 para R$ 56.

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Além do bom resultado de 2022, as projeções positivas se reforçaram com o guidance para 2023. O banco projeta um lucro líquido entre R$ 33 e 37 bilhões (o BBI, por exemplo, tem uma projeção de R$ 32,0 bilhões em seu modelo), uma carteira de empréstimos crescendo entre 8 e 12%, despesas de provisão entre R$ 19 e 23 bilhões e crescimento de despesas operacionais de 7 a 11%.

Para o BBI, o Banco do Brasil divulgou uma orientação geral agressiva para 2023 – ainda que, de fato, reconheça o excelente ano, impulsionado por seu correto posicionamento para se beneficiar de taxas de juros mais altas e menor exposição a segmentos de maior risco.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados