Analistas explicam como as ações das varejistas devem reagir à Black Friday

Empresas podem se beneficiar com a data, mas vão precisar entregar rentabilidade e não apenas volumes

Mitchel Diniz

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SÃO PAULO – As ações de varejistas passaram por maus bocados nos últimos tempos – algumas mais do que outras – impactadas pela piora no quadro inflacionário brasileiro e também por resultados piores que o esperado no terceiro trimestre. Agora, investidores se perguntam se a tão aguardada Black Friday seria capaz de dar algum alento a essas empresas, levando a uma recuperação dos papéis penalizados nas últimas sessões.

“A Black Friday pode dar um impulso, mas não vai ser capaz de recuperar o tombo que essas ações tiveram no ano”, afirma Waldir Morgado, sócio do Nexgen Capital. Seria querer demais que uma única data fosse capaz de reverter as perdas acumuladas de alguns desses papéis ao longo de 2021, sendo que alguns caíram mais de 60% no período (veja abaixo).

A exceção foi o chamado “varejo de alta renda”, que acumula saldo positivo, indicando que a inflação impactou menos o poder de compra do consumidor com maior poder aquisitivo.

Para os analistas, a expectativa é que a Black Friday deste ano também tenha uma maior participação das classes A e B e seja marcado por compras mais “racionais”. “Não acho que vai ser uma data que vai frustrar o varejo, acredito que não vai ser muito diferente do histórico de faturamento”,  afirma Angelica Marufuji, analista de renda variável da Meraki Capital.

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) calcula que a Black Friday deve movimentar R$ 3,93 bilhões este ano. Mas ainda que o número represente um aumento de 3,8% em valores nominais, ao descontar a inflação de 10,67% acumulada em 12 meses até outubro, o resultado implica em uma queda de 6,5%.

Mas, independentemente de volumes vendidos, é a rentabilidade que vai fazer a diferença na percepção do investidor, explica Eduardo Rebouças, sócio da Helius Capital.

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“Rentabilidade era um assunto pouco falado até este ano. A intenção era só crescer em volume de vendas. Agora, se for só volume com rentabilidade ruim, o mercado não vai gostar. Se for um volume menor, mas com rentabilidade boa, o mercado gosta”, afirma Rebouças.

Pressão por frete grátis

Rentabilizar as vendas, porém, não vai ser uma tarefa simples para as varejistas na Black Friday deste ano. Morgado, da Nexgen, diz que as margens das empresas tendem a ser pressionadas, a começar pela inflação dos custos logísticos. “Com o aumento de combustível, o frete para entrega está mais caro, o que gera uma pressão sobre a margem dessas empresas”, explica.

Por outro lado, pesquisas apontam que o frete grátis é um dos principais critérios de compra dos consumidores na data. “E é a empresa que vai ter que arcar com isso porque o frete é grátis para uma das pontas só”, afirma Rebouças, da Helius Capital.

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A entrega gratuita virou diferencial dentro de um mercado cada vez mais competitivo. Empresas de Market Place como Mercado Livre e, mais recentemente, Shopee, têm subsidiado a entrega de seus vendedores para ganhar market share.

Angelica Marufuji, da Meraki, ressalta, por outro lado, vantagens para as empresas que trabalham principalmente com estoques próprios (1P) em detrimento do market place (3P).

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“A parte ruim de quem tem mais estoques próprios é que precisa de mais capital de giro. A parte boa, é que a empresa gerencia melhor a precificação, podendo decidir se o estoque vai ser mais promocional ou não. Historicamente, vimos Magazine Luiza (MGLU3) tendo um desempenho muito bom nas Black Fridays por ter um 1P muito forte, além de ser favorecida por lojas físicas”, afirma Angelica.

Os analistas Danniela Eiger, Gustavo Senday e Thiago Suedt, da XP, também enxergam riscos em relação à rentabilidade. Eles ressaltam que a Magalu, por exemplo, provisionou R$ 395 milhões em estoques, que devem ser diluídos ao longo do quarto trimestre, “devido à maior competição e um consumidor mais fragilizado diante da deterioração macroeconômica”, diz o relatório dos analistas, que mantêm visão neutra para o setor.

Por outro lado, a XP vê como positiva a estratégia de distribuir promoções ao longo do mês e não apenas na data em si, o que impacta o consumidor durante maior tempo e aumenta a chance de conversão de  compra. Com isso, há um controle maior sobre o custo de aquisição de clientes, que aumenta no fim de semana da Black Friday.

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Os analistas esperam vendas melhores que o esperado impulsionadas por preços e um “mix mais premium“. “A intenção de compra dos consumidores permanece alta, apesar do macro desafiador”, afirmam. O relatório da XP cita também uma pesquisa do Facebook, na  qual os brasileiros responderam que devem gastar menos com compras – o ticket médio deve ser 7% menor na comparação com a Black Friday do ano passado.

Vestuário, calçado e joias

Ainda que a categoria de smartphones apareça nas pesquisas como item mais desejado da data, os analistas veem potencial de forte demanda no segmento de vestuário e calçados. Ainda que sejam compras de tíquete mais baixo, geradas por impulso, as empresas investiram alto em digitalização ao longo da pandemia para compensar as lojas fechadas e chegam na Black Friday como players fortes.

“Lojas Renner (LREN3) é uma empresa que pode se beneficiar, pois precisou investir recursos nas vendas on-line para correr atrás do prejuízo com a pandemia”, afirma Angélica, da Meraki. Ela também destaca o potencial da Vivara (VIVA3), que comercializa joias. “É uma categoria que foge do óbvio, mas vai muito bem”, afirma Angélica, lembrando dos últimos resultados da companhia. A Arezzo (ARZZ3), que atende um público de maior poder aquisitivo, também deve se beneficiar com a data, segundo a analista.

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A tendência é que o consumidor perceba maiores descontos nesses segmentos. “Serviços, vestuário e outros segmentos que não são mainstream podem se beneficiar com a abertura da economia. Quanto a eletrônicos, vai ser difícil o consumidor perceber os descontos”, afirma Eduardo Rebouças, da Helius.

De qualquer forma, o impacto da Black Friday para as varejistas só vai ser conhecido quando a data chegar, ainda que muitas das empresas tenham trabalhado para transformar a data em uma Black Week ou Black Month.

“O consumidor deixa para comprar muito na data, no evento. Vai ser nos 45 do segundo tempo para saber como foi a Black Friday”, conclui Rebouças.

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados