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Além da expectativa de uma forte queda das ações, diversos bancos e casas de análise colocaram a recomendação para as ações da Americanas (AMER3) sob revisão após o anúncio de “inconsistências contábeis” no valor de R$ 20 bilhões, que levaram à renúncia do CEO Sergio Rial e do CFO André Couvre.
XP, Itaú BBA, Morgan Stanley e Bradesco BBI estiveram entre as casas que colocaram a recomendação para os ativos “em revisão”, alegando falta de visibilidade após um rombo contábil sem precedentes. Analistas esperam que o impacto das inconsistências sejam detalhados para revisarem suas estimativas para a companhia que, a princípio, não são nada positivas. Rial, ex-CEO da Americanas, fala nesta manhã ao mercado sobre o tema, conferência essa cercada de expectativas por maiores esclarecimentos.
A XP, que antes tinha recomendação neutra para AMER3 com preço-alvo de R$ 20 (potencial de valorização de 67% frente o fechamento da última quarta), destacou que, apesar da companhia afirmar que o impacto pode ser limitado para o caixa, o comunicado da véspera adiciona várias incertezas para a tese de investimento na empresa. Além disso, traz pouca visibilidade sobre o que de fato aconteceu e quais são os impactos dessas medidas nos demonstrativos financeiros da companhia.
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Danniela Eiger, Gustavo Senday e Thiago Suedt, analistas que assinam o relatório, avaliam que o anúncio pode implicar em três efeitos negativos: i) maior alavancagem, dado que o endividamento da Americanas pode aumentar dependendo dos ajustes em seu balanço patrimonial; ii) maior custo de dívida, por conta da maior percepção de risco de crédito e liquidez; e iii) deterioração do capital de giro, dado que a companhia poderá ter problemas em manter os dias de pagamento a fornecedores, por conta de seu ciclo de caixa pior.
Há riscos ainda de processos judiciais nos EUA, dado que a companhia possui ADRs (American Depositary Receipts, na prática ativos da empresa negociados na Bolsa dos EUA), como observado em casos semelhantes onde os acionistas minoritários foram prejudicados por decisões dos executivos.
A saída de Rial também foi vista como bastante negativa, com o Itaú BBA apontando que a ação deve sofrer significativamente durante o pregão desta quinta uma vez que o desempenho recente (positivo) dos ativos foi impulsionado, principalmente, pelas expectativas do mercado em relação às entregas de Sergio Rial no médio e longo prazo.
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“Diante das notícias desfavoráveis, decidimos reavaliar nossa cobertura até que possamos entender melhor a situação. Desta forma, tanto a recomendação quanto o preço-alvo de AMER3 estão sob revisão”, apontaram os analistas do BBA, que antes tinham recomendação marketperform (desempenho em linha com a média do mercado, equivalente à neutra) para AMER3, com preço-alvo de R$ 15 (25% acima do fechamento da véspera).
Leia também: “É verdade que o impacto pode ser importante”, diz Rial sobre rombo bilionário no balanço da Americanas (AMER3)
O Bradesco BBI, que também tinha recomendação neutra, mas com preço-alvo mais baixo, de R$ 10,50 (12,5% abaixo do fechamento de quarta), colocaram os ativos sob revisão pela magnitude do evento e falta de informações, mas já projetando uma forte queda dos ativos. Os analistas da casa definiram a inconsistência contábil como considerável e sem precedentes.
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“[O anúncio é] muito negativo. Nós (e o mercado) ainda carecemos de detalhes para medir efetivamente como – e por quanto tempo – o balanço e P&L [Demonstrativo de Lucros e Perdas] podem ser impactados. O impacto potencial nos resultados futuros também é obscuro. Mesmo considerando um impacto supostamente não-caixa, vemos o anúncio como definitivamente negativo. A primeira razão se deve à sua magnitude anormal: de R$ 20 bilhões, que equivale a 2 vezes o valor de mercado, 1,3 vez o valor contábil ou 0,6 vez as vendas brutas dos últimos doze meses, o que sugere que a empresa acumulou muitos erros ou muitos anos de más práticas de contabilidade. Em segundo lugar, este anúncio levanta preocupações importantes sobre a credibilidade da empresa e, eventualmente, sobre sua capacidade financeira”, resumem os analistas do BBI.
O Morgan Stanley, por sua vez, colocou a recomendação sob revisão ante visão positiva anteriormente para os ativos. Em 5 de janeiro, os analistas da casa tinham reforçado exposição overweight (acima da média do mercado, equivalente à compra) para AMER3 dentro do universo de e-commerce, destacando as perspectivas positivas com a nova gestão. Na ocasião, o preço-alvo tinha sido cortado de R$ 21 para R$ 16, mas ainda representando um potencial de valorização de 33%.
“Retiramos nossa recomendação uma vez que a reviravolta operacional que vislumbrávamos ficou completamente nublada e temos visibilidade limitada sobre a extensão das inconsistências contábeis. Quando elevamos a recomendação para AMER3 a overweight em outubro de 2022, um pilar fundamental de nossa tese foi o potencial da nova administração para conduzir uma reviravolta operacional que, juntamente com um cenário de consumo melhor para 2023, poderia levar a um ciclo positivo de expansão da margem”, afirma o banco.
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“Assim, com os novos CEO e CFO saindo em menos de duas semanas de trabalho, agora vemos os catalisadores fundamentais como limitados para reverter a situação da Americanas em vendas online e offline e pressões de margem”, aponta, também destacando o grande valor da inconsistência contábil em relação ao tamanho do negócio.
“As investigações estão em andamento, detalhes iniciais são limitados e os impactos na demonstração de resultados e no balanço são desconhecidos neste momento”, avalia a equipe de análise do Morgan, apontando esperar mais detalhes para revisitar os pontos de vista.
JPMorgan segue com recomendação de venda para ativos
O JPMorgan, por sua vez, seguiu com a sua recomendação underweight (exposição abaixo da média do mercado, equivalente à venda) para os ativos AMER3. A classificação foi cortada no início de novembro de 2022 com a visão de alavancagem alta e desafio nas lojas físicas, com então preço-alvo de R$ 12,50 (4% maior ante o fechamento da véspera).
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“Vemos a situação de fluxo de caixa da empresa, que foi o motivo pelo qual recentemente cortamos a recomendação para a ação a underweight, como muito mais delicada do que o previsto, com a empresa alavancando significativamente as
transações de financiamento de fornecedores – aparentemente não devidamente contabilizadas – para financiar seu capital de giro. Assim, à medida que a nova gerência sai citando mudanças nas prioridades da empresa, vemos o reequilíbrio da estrutura de capital e gerenciamento de passivos como o foco mais provável do curto prazo”, avalia o JP.
Antes do anúncio, os analistas do banco estimavam a necessidade de cerca de R$ 4 bilhões a R$ 6 bilhões para endereçar a estrutura de capital, que se compara ao valor de mercado da empresa de R$ 11 bilhões.
“Em uma visão mais ampla, a empresa deve reconhecer R$ 20 bilhões em passivos adicionais, que provavelmente serão contabilizados no curto prazo dada a natureza típica de tais transações. E esse valor provavelmente será principalmente reservado no patrimônio líquido, mesmo após eventuais ajustes. O valor do patrimônio líquido era de cerca de R$ 15 bilhões no 3T22, sugerindo potencial patrimônio líquido negativo à frente”, aponta.
Além disso, a magnitude das operações de financiamento de fornecedores está próxima do Custo de Produtos Vendidos (CPV) previsto para o ano de 2022 (R$ 19 bilhões), o que pode significar que a empresa estava potencialmente pagando fornecedores apenas por meio de transações de financiamento, que são tipicamente transações de curto prazo, indicando uma situação financeira ainda pior do que o JP acreditava.
Além disso, pode implicar também que a empresa vem acumulando dívidas de financiamento de fornecedores com instituições financeiras há algum tempo, algo que seria surpreendente dada a elevada magnitude da soma e a ausência de reclamações (pelo menos públicas) de instituições financeiras sobre o tema.
“Dito isto, mais discussões sobre uma possível rodada de capitalização podem surgir, já que a empresa tem uma posição de caixa de R$ 9 bilhões com R$ 5 bilhões em recebíveis e R$ 6 bilhões em estoques a partir do 3T22 em meio ao aumento potencial de R$ 20 bilhões em passivos no curto prazo”, afirma o banco.
Além disso, dependendo dos impactos no Demonstrativo de Lucros e Perdas, a empresa pode quebrar suas cláusulas de dívida de 3,5 vezes a dívida líquida sobre o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações, na sigla em inglês).
A Genial Investimentos, por sua vez, rebaixou ações da Americanas de compra para venda, reduzindo o preço-alvo de R$ 28,40 para R$ 9,40, salientando que esse preço-alvo estará sujeito a novas revisões tão longo tiver acesso a mais informações sobre o caso.
Segundo a casa de análise, a saída de Rial com menos de 2 semanas de casa transparece que as extensões do ocorrido terão graves impactos na geração de valor da companhia. Além disso, a saída dele leva a uma perda de confiabilidade em relação à capacidade de execução dos projetos de expansão da Americanas para os próximos anos, como as franquias da Vem Conveniência (Ex. BR Mania) e Uni.co e Ame Digital.
Para eles, a descoberta dessa inconsistência deve causar um mau humor em relação ao setor de varejo e-commerce, uma vez que os investidores irão se questionar se outras empresas estariam adotando as mesmas práticas contábeis da Americanas, “o que evidencia um risco (e nesse momento, é apenas um risco) de ocultação de informações relevantes no balanço dessas companhias”.
O Citi afirma que ainda não é possível dimensionar o real passivo da empresa (no 3T22, a dívida líquida era de R$ 10 bilhões e alavancagem de 3,3 vezes a dívida líquida/Ebitda. “Claramente, este ainda é o começo de uma longa e complexa história”, avaliam analistas.
“Desnecessário dizer que isso deve gerar um grande sentimento negativo, dado o golpe na credibilidade/governança”, diz Citi. A recomendação foi mantida em neutra, com preço-alvo de R$ 15,70.