Ainda falta muito para estrangeiro voltar a apostar no Brasil

O ingresso de capital externo no mercado brasileiro está mais fraco do que no início da maioria das administrações passadas

Bloomberg

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(Bloomberg) — Apesar da agenda econômica liberal do governo, o investidor estrangeiro ainda não entrou no país como se esperava. O ingresso de capital externo no mercado brasileiro está mais fraco do que no início da maioria das administrações passadas. Isso apesar de a reforma da Previdência já ter sido aprovada pela Câmara.

O fluxo financeiro para o país, excluindo as operações de comércio exterior, está negativo em US$ 14 bilhões este ano, segundo o dado mais recente do Banco Central. Entre janeiro e agosto de 2018, o fluxo foi negativo em US$ 12 bilhões. Vale lembrar que, no ano passado, o contexto era de elevada incerteza, diante de uma eleição polarizada.

A desaceleração global, a guerra comercial entre EUA e China, a crise na Argentina e questões internas, como as pendências sobre reformas e privatizações, deixam o investidor com o pé atrás.

Ainda não há evidências concretas de que as polêmicas do governo do presidente Jair Bolsonaro, como a mais recente envolvendo a questão das queimadas na Amazônia, estejam afetando os investimentos estrangeiros. Mas o mercado monitora o risco de impactos na economia, sobretudo no comércio exterior, caso o Brasil venha a sofrer algum tipo de sanção.

Incertezas externas

O ambiente internacional está mais restritivo para ativos de risco em geral e o Brasil também sofre com esse cenário de busca por liquidez, diz Rodrigo Azevedo, ex-diretor do Banco Central e sócio-fundador da Ibiuna Investimentos. “Não vejo essa situação como algo específico nosso, mas é preciso maior clareza acerca de se teremos ou não uma desaceleração mais abrupta do crescimento global ou mesmo uma recessão no horizonte.”

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Esta época de férias no hemisfério norte, quando o volume de operações fica menor, combinada aos receios da guerra comercial, também ajuda a distanciar o investidor estrangeiro do Brasil, diz Carlos Gribel, operador de renda fixa da Andbanc Brokerage.

Mesmo no período de maior otimismo, quando o Ibovespa chegou a passar dos 105 mil pontos no intradiário em julho, as ações foram impulsionadas principalmente pelo investidor local. O saldo de capital externo na B3 está negativo em quase R$ 19,5 bilhões no acumulado do ano até o dia 19 de agosto. Esse déficit é mais de três vezes superior à saída de R$ 5,6 bilhões no mesmo período de 2018.

O capital estrangeiro tem aparecido nas ofertas de ações feitas por empresas, mas o saldo líquido do fluxo cambial financeiro, considerando não apenas os negócios com ações, continua negativo.

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A falta de dólar no mercado à vista ajudou o câmbio a superar os R$ 4,12 na última semana, obrigando o Banco Central a estender para até setembro a venda da moeda conjugada com oferta de swaps reversos. Na segunda-feira, ruídos políticos e a queda da popularidade do presidente ajudaram o dólar a ampliar a alta para R$ 4,15.

Reformas e privatizações

Há ainda um coro de investidores que cobram o avanço de outras reformas, como a tributária. Se a Previdência é uma prioridade para resolver o problema fiscal, a tributária é vista como mais importante para a retomada do crescimento. Ela simplificaria o sistema de impostos, que é apontado como um dos principais problemas estruturais do país.

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“A reforma da Previdência está longe de resolver todos os problemas”, diz Juan Prada, estrategista de câmbio do banco Barclays em Nova York.

Além disso, a ideia de que a reforma está precificada após passar na Câmara não é consensual. Para parte do mercado, o investidor ainda espera a conclusão da votação no Senado e a implementação das mudanças antes de responder mais favoravelmente.

A agenda de privatizações e concessões, que também tem potencial de atrair investidores para o país, ainda não fez diferença para o fluxo de capitais. A venda de empresas mais vistosas e com mais chances de despertar interesse de fora, como a Eletrobras, e a tão esperada cessão onerosa de petróleo, seguem dependentes de aprovação do Congresso.

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Economia ainda fraca

O crescimento fraco do PIB, previsto em menos de 1% para este ano, é mais um fator que ajuda a afastar o investimento externo por duas vias. Por um lado, a alta ociosidade da economia significa que o investimento em novas instalações não é necessário.

E por outro lado, o baixo crescimento da economia reduz as pressões inflacionárias. Isso permite ao Banco Central reduzir o juro a uma mínima histórica, o que é potencialmente positivo para o consumidor, mas diminui o chamado carry trade, o diferencial entre as taxas internas e externas que, no passado, foi responsável por atrair muito dinheiro estrangeiro para o Brasil.

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Os juros baixos em um cenário de cautela no mercado internacional estariam estimulando empresas a trocar endividamento no exterior por dívida local, diz Maurício Oreng, estrategista do banco Rabobank. Ele considera que as reformas e privatizações tendem a prevalecer no médio prazo, mas existe uma defasagem temporal para que estas ações gerem bons frutos.

Questão ambiental

As polêmicas do presidente Bolsonaro, como as que levaram países europeus a cortarem recursos destinados à proteção da Amazônia e o presidente francês, Emmanuel Macron, a ameaçar se colocar contra o acordo com o Mercosul, não passam despercebidas entre analistas. Há temor de prejuízos para a agenda reformista do governo e para as exportações.

As queimadas na Amazônia geraram fortes críticas ao governo, tanto internas quanto externas. Ainda é cedo para se falar em impacto no fluxo de investimentos, mas o sentimento do mercado pode ter alguma deterioração se o governo não agir para resolver os problemas, diz Georgette Boele, estrategista do ABN Amro.

Um risco considerado é que eventuais turbulências políticas causadas por controvérsias envolvendo o presidente acabem dificultando a aprovação das reformas, como a da Previdência, ainda pendente no Senado.

“Quanto mais brigas ele escolhe, menor a chance de entregar as reformas necessárias”, diz Prada, do Barclays.

Na última sexta-feira, todos os principais jornais do país destacaram a pressão externa contra as queimadas na Amazônia, que levaram Macron a propor que o tema fosse debatido no G-7. Bolsonaro, mesmo admitindo o maior desmatamento, reclamou de países que “aproveitam o momento” para criticar o Brasil e prejudicar sua economia. Rodrigo Maia, por sua vez, disse que as queimadas minam a imagem do país e é preciso defender o meio ambiente.

A “verborragia acusatória” do presidente em relação às principais lideranças europeias pode levar a retaliações econômicas contra o Brasil, principalmente ao agronegócio, diz Nathan Blanche, sócio-fundador da Tendências Consultoria. “Seria uma péssima notícia, pois se somaria às quedas de preços das commodities já ocorrida como resultado da crise entre EUA e China.”

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