Ações de shoppings vão sofrer nos próximos anos e nem impeachment deve ajudar

A situação destas empresas não é nada boa e mesmo que os juros recuem, o ambiente pode continuar bastante negativo

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Em alguns momentos o mercado até pode parecer simples. Veja por exemplo o atual cenário, onde a política praticamente dita o movimento do mercado: se a Dilma sair, compre estatais e empresas favorecidas por um cenário de juros mais baixo; se Dilma ficar, aposte nas exportadoras e companhias beneficiadas por um dólar alto. Mas nesta regra tão simples existe uma “cilada”: nem toda empresa que se beneficia com juros menor tende a ganhar com isso. É o que mostra a análise feita pelo Credit Suisse.

O relatório enviado aos clientes do banco suíço nesta semana faz um estudo bem aprofundado sobre as empresas de shopping centers listadas na Bovespa. Historicamente, as ações deste setor costumam se comportar da maneira inversamente proporcional à curva de juros de longo prazo – se o DI longo começa a inclinar para baixo, as ações sobem, e vice-versa. Segundo o Credit, mesmo com a possibilidade de saída da presidente Dilma Rousseff pressionando os juros de longo prazo para baixo, estas empresas não devem mostrar muita empolgação no mercado, justamente por problemas dentro dos setores que elas atuam.

Os analistas Nicole Hirakawa, Luis Stacchini e Vanessa Quiroga fizeram um estudo sobre a saúde financeira das principais redes de loja dos shoppings e a exposição destas administradoras a essas lojas. Para isso, eles usaram a base de dados da Serasa, notícias e ainda mapearam o site de cada um dos shoppings listados para verificar os lojistas que compõem seu portfólio e a representatividade dos principais segmentos. A análise leva em conta a saúde financeira (nivel de alavancagem e protestos de credores) dos 170 maiores varejistas de diversos segmentos e que representam 6 mil lojas ou 27,5% do total de lojas. 

A conclusão deles foi que 6,5% destas empresas são “bandeira vermelha” – ou seja, entraram em recuperação judicial ou estão em situação financeira preocupante – e 25% são “bandeira amarela” por terem uma quantidade substancial de protesto de seus credores ou indicador Dívida Líquida/Ebitda acima de 2,5 vezes – ou seja, ela demoraria 2 exercícios e meio para pagar toda a sua dívida líquida apenas com a geração operacional de caixa estimada.

“Como um terço dos grandes lojistas estão nessa situação, ficamos preocupados com os pequenos varejistas, que representam 30% do total de lojas e tendem a ser mais vulneráveis a uma piora do cenario macroeconomico”, disseram em relatório. Em geral, a maior preocupação dos analistas é a inadimplência destas pequenas lojas e o impacto importante que terá sobre as administradoras em um período de bastante dificuldade financeira. 

Altas ficaram para trás
Para os analistas, após o recente rali, já não há muitas chances de os shoppings registrarem mudanças em relação ao cenário político. “Em 2016, esperamos que as micro condições se tornem mais aparentes, enquanto as valorizações não parecem prováveis”, disseram. Para a equipe do Credit, vacância e inadimplência são os maiores riscos e o fator-chave para estas empresas será a capacidade delas em substituir os atuais varejistas, reduzindo as lojas que têm maior risco de falência.

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Neste cenário, os analistas destacam que as maiores redes varejistas já estão em dificuldades, mas o que aumenta o risco são as lojas menores e independentes, muitas vezes com um negócio familiar, que são responsáveis por 32% das empresas em shopping. Segundo o Credit, estas lojas são mais expostas a crises econômicas por não terem uma gerência profissional e terem pouco ou nenhum acesso a capital.

Dentre as operadoras da shopping listadas na Bovespa, Multiplan (MULT3) e Iguatemi (IGTA3) têm a menor exposição a estas lojas familiares, que representam 22% e 27% de suas contagens de lojas, respectivamente. Entre as principais empresas listadas na Bolsa, apenas a Sonae Sierra (SSBR3) tem recomendação underperform (abaixo da média do mercado), enquanto as outras possuem uma recomendação neutra.

O cenário para este e o próximo ano devem ser de luta pela recuperação para as companhais varejistas, e consequentemente para as administradora de shopping. “Os custos de ocupação mais elevados e a menor produtividade (vendas por m²) nos faz acreditar que o futuro crescimento de SSS [vendas mesmas lojas, abertas a mais de 12 meses], servirá para recuperar as varejistas, levando mais tempo para se traduzir em crescimento de aluguel”, afirmam os analistas.

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Com isso, a companhia mais favorecida é a Multiplan, com sua menor exposição aos varejistas de risco e que possui uma capacidade acima da média para atrair novos inquilinos.

Setor seguro
Apesar de não projetarem mais altas, os analistas justificam suas recomendações neutras por conta da grande resiliência apresentada por estas companhias, favorecidas pela grande representatividade do que eles chamam de “inquilinos de primeira linha”, que ajudam a manter bons negócios mesmo com a crise econômica.

De acordo com o relatório do Credit, existem 387 lojas de nível superior (nível 1 ou 2), que juntas correspondem a 11 mil lojas em shoppings de administradoras listadas na Bolsa, ou 50% do total de lojas. “Nós definimos nível 1 aqueles inquilinos com mais de 25 lojas (ou marcas internacionais) e nível 2 aqueles com mais de 10 lojas”, explicam.

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Em geral, o risco do setor fica sobre o desempenho destas varejistas e pela quantidade de lojas consideradas de risco. Entre o fim de 2015 e início deste ano, os analistas afirmam que a abertura de lojas ficou concentrada em marcas nível 1, mas que estas são as que apresentam maior chance de um desempenho fraco no atual cenário. A Aliansce (ALSC3) foi a única que aumentou o número de lojas familiares, com alta de 3%.

Apesar das recomendações neutras, a Multiplan é a única que, segundo os analistas possui algum potencial de upside, mas este é de apenas 2,3%. No caso da BR Malls (BRML3), a equipe do Credit vê um downside de 8,2%. Para Iguatemi e Aliansce têm análises de queda de 5,9% e 1,9%, respectivamente.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.