Em um relacionamento afetivo, há tempos que casar deixou de ser o único marco inicial possível para duas pessoas que decidem viver juntas. 

Se, por um lado, os costumes se tornaram mais livres, por outro, o cuidado com questões legais exige ainda mais atenção. Na falta de um documento que caracterize a relação, o patrimônio do casal que mora junto se mistura, e isso pode trazer consequências ao planejamento sucessório no futuro. 

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É justamente para regularizar situações de fato, como essa, que serve a união estável. O seu dispositivo está previsto na Constituição de 1998 (art. 226, parágrafo 3.°), posteriormente regulamentado pela Lei 9.276/96.

“Costumo dizer que o direito de família, diferentemente das outras áreas, não inventa, mas sim reconhece situações que a sociedade passa a aceitar com o tempo. É o caso da união estável, que surgiu como forma de relacionamento e a lei veio atrás para regulamentar”, observa Luiz Kignel, advogado que atua no direito de família e sucessões e sócio do escritório PLKC Advogados.

Embora já seja praticada há bastante tempo, ainda existem dúvidas sobre as implicações legais dessa forma de relacionamento, que envolvem direitos dos cônjuges e dependentes, partilha de herança, entre outras. Para saber mais sobre o tema, continue a leitura a seguir.

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O que é união estável?

Segundo a lei brasileira, para que uma relação seja considerada união estável, ela precisa ter quatro atributos: ser duradoura, pública, contínua e com o objetivo de constituir família. 

Quando duas pessoas se mostram à sociedade como se fossem um casal e a relação possui essas quatro características, isso define uma união estável. Ou seja, basta que haja a vida em comum, mesmo que não tenha acontecido nenhum ato de formalização.

O que configura uma união estável?

Atualmente, não existe mais um prazo mínimo para que uma relação possa ser caracterizada como união estável, desde que cumpra os requisitos que vimos anteriormente. E também não é preciso que as duas pessoas vivam na mesma casa para que ela seja reconhecida.

Outro ponto que configura uma união estável é a dependência financeira de um cônjuge em relação ao outro, segundo Kignel.

“Na prática, muitas pessoas fazem um contrato de namoro para fugir das implicações legais, patrimoniais e sucessórias da união estável. Mas se existe dependência financeira de alguma das partes, o contrato não tem validade”, explica o advogado.

Qual o estado civil de quem tem união estável?

A união estável não altera o estado civil de uma pessoa. Portanto, quem era solteiro, divorciado ou viúvo permanece nessa condição, mesmo que o casal oficialize a relação.

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Perante a lei, as partes são consideradas “companheiras” ou “conviventes”, mas isso não significa que não tenham direitos, conforme veremos na sequência.

Regimes de união estável

A união estável permite os mesmos regimes patrimoniais previstos para o casamento, sendo os mais comuns a comunhão parcial de bens, a comunhão universal de bens e a separação de bens. Esse é um ponto que exige bastante atenção quando se fala em união estável, especialmente se ela não tiver sido formalizada.

Quando um casal vive junto sem oficializar legalmente a relação, o regime patrimonial considerado é automaticamente o da comunhão parcial de bens. O mesmo ocorre quando a união estável é formalizada, mas não se faz a opção por um regime patrimonial. 

Na comunhão parcial de bens, é considerado patrimônio comum do casal somente o que foi adquirido depois do casamento ou da união estável, e a título oneroso. Em outras palavras, caso venham a se separar, não entra nessa conta o que um ou outro recebeu como doação ou herança mesmo depois da união.

Já na comunhão universal de bens, não existe patrimônio particular, pois todos os bens do casal são divididos ao meio no caso de uma separação. Mesmo que aplicações financeiras ou veículos, por exemplo, constem na declaração de Imposto de Renda de um dos cônjuges, tudo será partilhado à razão de 50% caso a união estável venha a terminar.

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Por fim, na separação de bens, o patrimônio dos cônjuges não se comunica, mesmo depois de terem formalizado a união estável. Nesse caso, não existe patrimônio comum do casal, e, se ocorrer uma separação, cada um fica com os bens que já possui.

É importante saber que, mesmo em uma união estável com separação de bens, os cônjuges podem adquirir bens juntos. No caso de um imóvel, por exemplo, é possível que conste os dois nomes na escritura, sendo que o contrato de compra e venda trará a informação de quanto cada um deles contribuiu financeiramente para a aquisição do bem.

União estável e casamento: qual a diferença?

Basicamente, o que diferencia a união estável do casamento é a formalização do vínculo entre o casal. No casamento, o processo é mais burocrático, e é preciso que um juiz de paz esteja presente no local e data agendados para realizar a cerimônia. 

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Por sua vez, a união estável não requer formalidades necessariamente, pois, como vimos, ela não precisa de um documento para que seja aceita como válida. 

Em relação aos direitos e deveres dos cônjuges, não existe diferença entre casamento e união estável, seja para fins patrimoniais (no caso de uma separação), sucessórios (quando existe herança envolvida) ou para receber pensão por morte. Inclusive, um dos companheiros em união estável pode adotar o sobrenome do outro, a exemplo do que ocorre em alguns casamentos.

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O que pode tornar a união estável um vínculo mais subjetivo é quando ela não é formalizada, pois nesse caso não existe uma data de início definida para o relacionamento.

Até alguns anos atrás, era possível a formalização retroativa da união estável. Segundo Luiz Kignel, era bastante comum que casais fizessem escrituras públicas informando que já estavam juntos desde determinada data, mas isso já não é mais permitido.

“Em 2021, o STJ determinou que o pacto de conviventes não pode retroagir, ou seja, você só pode firmar uma união estável daqui para frente. Temos vários casos aqui no escritório de casais com dois regimes: um de comunhão parcial antes da assinatura do contrato, e outro de separação de bens, válido a partir da formalização”, diz o advogado.

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Como comprovar a união estável?

Quando a união estável não é registrada em cartório, algumas das formas de comprová-la são depoimentos de pessoas que conviviam com o casal, fotos, postagens em redes sociais, inclusão em apólice de seguro, entre outros aspectos que demonstram que a relação tinha o objetivo de constituir família.

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O Decreto 3.048/99, em seu artigo 22, parágrafo 3.°, traz uma lista de documentos que podem comprovar vínculo e/ou dependência financeira entre o casal, o que serve também para comprovar a união estável. São eles:

  • – certidão de nascimento de filho havido em comum;
  • – certidão de casamento religioso;
  • – declaração de IR em que conste o companheiro como dependente;
  • – disposições em testamento;
  • – declaração especial feita por tabelião;
  • – prova de mesmo domicílio;
  • – prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão na vida civil;
  • – procuração ou fiança reciprocamente outorgada;
  • – conta bancária conjunta;
  • – registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;
  • – anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados;
  • – apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;
  • – ficha de tratamento em instituição médica, da qual conste o segurado como responsável;
  • – escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;
  • – declaração de não emancipação do dependente menor de vinte e um anos; ou
  • – quaisquer outros que possam levar à convicção do fato a comprovar.

O que acontece com a herança na união estável?

Como vimos, para fins de sucessão patrimonial, a união estável é igual ao casamento. 

No caso da comunhão universal de bens, os companheiros são meeiros um do outro (têm direito à metade dos bens), e não herdeiros. Ou seja, um deles recebe a metade de todo o patrimônio, e a outra metade será dividida entre os herdeiros.

Já na comunhão parcial de bens, o companheiro se torna meeiro do patrimônio que construíram juntos e herdeiro em relação aos bens particulares, desde que ainda estejam juntos no momento da morte. 

Por exemplo, um casal sem filhos comprou uma casa juntos, e cada um deles tinha um carro antes de firmarem a união estável. Se um deles morrer e a união estável ainda estiver vigente, o outro será meeiro na casa e herdeiro do carro deixado pelo falecido.

Quanto à separação de bens, existem duas possibilidades: a separação convencional, escolhida pelos companheiros, e a obrigatória, adotada por força de lei em alguns casos.

Na separação convencional, o companheiro sobrevivente é considerado herdeiro, desde que não tenham se separado. O mesmo não acontece na separação obrigatória, que o exclui automaticamente da herança, a não ser que ele consiga comprovar que participou da aquisição dos bens.

Os casos de separação de bens obrigatória são aqueles em que um dos cônjuges (ou ambos) têm mais de 70 anos e quando existe patrimônio de relacionamento anterior em processo de inventário.

Como fazer a união estável?

A união estável pode ser oficializada por meio de uma escritura pública ou de um contrato particular.

A escritura pública é feita por um tabelião em um cartório de notas, torna-se pública automaticamente e não precisa de testemunhas. Já o contrato particular pode ser feito pelos próprios conviventes, e precisa ser registrado em um cartório de registro de títulos e documentos. Nesse caso, recomenda-se que o documento tenha a assinatura de duas testemunhas.

Como desfazer a união estável?

A dissolução da união estável pode ocorrer de forma extrajudicial ou judicial.

No caso de ser extrajudicial, a dissolução deverá ser feita no cartório, mesmo que a união estável não tenha sido formalizada. Esse processo somente é possível quando não existem divergências entre o casal sobre a separação, e quando não há dependentes envolvidos.

Mas se existem dependentes ou discordâncias em relação à partilha de bens, guarda dos filhos, pensão alimentícia ou outros aspectos, o processo deve correr pela via judicial. Nesse caso, cada um precisará de um advogado próprio para que possa representá-los.

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