Até algum tempo atrás, investir em fundos cambiais era coisa para poucas pessoas endinheiradas. Eles sempre foram tidos como boas opções para diversificar a carteira e proteger o patrimônio das oscilações da economia brasileira. Na verdade, continuam sendo – a diferença é que agora eles são uma alternativa de investimento muito mais acessível.
Existem fundos cambiais que exigem aplicações tão baixas quanto R$ 500 – e, mesmo assim, oferecem vantagens semelhantes às das carteiras estreladas. Ideais para quem tem dívidas ou outros compromissos em moedas estrangeiras, essas carteiras podem ser encontradas em corretoras de valores com bastante facilidade.
Os fundos cambiais também são indicados para quem quer fazer hedge da carteira de investimentos local. Isso porque o dólar, por exemplo, costuma ter uma correlação negativa com o desempenho da bolsa de valores. Não raro, épocas de queda do Ibovespa correspondem a períodos de alta do dólar. Ter investimento na moeda americana, portanto, ajuda a amenizar essas possíveis perdas.
Mas eles não costumam ser recomendados para qualquer tipo de investidor. Isso porque os fundos cambiais embutem certos riscos e um nível de volatilidade que nem todo mundo é capaz de suportar. Neste guia completo, o InfoMoney explica passo a passo o que são e como funcionam essas carteiras, além de detalhar as vantagens e desvantagens de investir nelas. Confira.
O que é um Fundo Cambial?
A característica especial de um fundo cambial é o fato de que o seu principal fator de risco é a flutuação de preço de moedas estrangeiras ou a variação do cupom cambial (taxa de juros em dólares no Brasil).
Para ser considerado cambial, um fundo deve manter pelo menos 80% do patrimônio investido em ativos relacionados a moedas. Os mais populares dessa categoria são os fundos cambiais de dólar, que apostam nas variações da cotação da moeda americana.
Como funcionam os Fundos Cambiais?
Os fundos, de maneira geral, funcionam todos do mesmo jeito. Eles representam um tipo de investimento coletivo, em que os recursos de vários investidores são aplicados em conjunto no mercado – nesse caso, em ativos relacionados a moedas. Os ganhos são divididos entre os participantes, na proporção do valor depositado por cada um.
O patrimônio do fundo – que é a soma do dinheiro dos investidores – é aplicado por um gestor profissional, que toma as decisões sobre o que fazer com os recursos segundo políticas predefinidas. Quando as aplicações têm resultado positivo, as cotas do fundo (menor fração do patrimônio) valorizam. Se o desempenho é ruim, elas desvalorizam.
Composição da carteira
Os fundos cambiais devem investir pelo menos 80% da carteira em ativos relacionados a moedas estrangeiras, como o dólar ou o euro. Não é necessário que as aplicações sejam feitas diretamente nas moedas – os gestores podem comprar títulos referenciados nelas, que sejam emitidos por bancos ou empresas, por exemplo, podem aplicar em derivativos ou ainda fazer outras operações que permitam replicar a variação cambial.
Por conta dessa composição, o desempenho dos fundos cambiais costuma acompanhar a performance da moeda de referência – dólar, euro ou outras. Também existem fundos que investem em cestas de moedas variadas, incluindo libra, iene e yuan.
Rendimento
Como acompanham a variação de ativos relacionados a moedas, os fundos cambiais têm uma característica fácil de observar: seu desempenho pode variar bastante. Às vezes, de maneira brusca, como acontece com os fundos de ações.
Entre janeiro e agosto de 2019, os fundos cambiais renderam 8,6%, segundo dados da Anbima (associação que reúne entidades do mercado de capitais). No mesmo período, o CDI – principal referência para investimentos de renda fixa – foi de 4,2%.
No entanto, entre os meses, o desempenho dos fundos cambiais foi bastante distinto. Em janeiro de 2019, por exemplo, a categoria registrou uma perda de 5,5% (o dólar recuou 5,8% no período). Já em março, o retorno foi positivo, de 4,7% (o dólar avançou 4,2%). O gráfico abaixo mostra as variações mensais dos fundos cambiais ao longo de 2019:
Janeiro | Fevereiro | Março | Abril | Maio | Junho | Julho | Agosto | |
Fundos | (5,46) | 2,84 | 4,65 | 0,63 | 0,21 | (1,96) | (0,64) | 8,62 |
Dólar * | (5,75) | 2,37 | 4,23 | 1,25 | (0,12) | (2,87) | (1,76) | 9,92 |
* Fonte: Ipeadata (Taxa de câmbio comercial para venda, fim do período)
Custos
Um fundo cambial prevê algumas taxas para remunerar as instituições envolvidas, como o administrador e o gestor. Considere esses valores na sua escolha, porque eles têm impacto direto sobre o retorno da aplicação.
Uma das taxas é a de administração, que remunera os serviços de administração e gestão e incide sobre todo o patrimônio mantido pelo investidor. Não importa se o fundo lucrou ou teve prejuízo, a taxa de administração é sempre cobrada.
O percentual varia de acordo com as instituições. Embora seja apresentada como um valor em base anual, a cobrança é feita diariamente, de maneira proporcional.
Outra taxa que pode existir nos fundos cambiais é a de performance, uma remuneração baseada no resultado. É como se fosse um bônus cobrado pelo administrador por ter conseguido obter uma rentabilidade superior a um referencial previamente combinado.
Se um fundo cambial previr taxa de performance e tiver desempenho acima do benchmark, parte do ganho excedente – 10% ou 20%, por exemplo – ficará com o administrador. Ela não é cobrada se o fundo tiver rentabilidade negativa.
Tributação
Os fundos cambiais estão sujeitos a dois impostos: o Imposto de Renda e o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).
O Imposto de Renda incide sobre a rentabilidade das carteiras, e não sobre o patrimônio inteiro. Assim como os fundos multimercado ou de renda fixa, os fundos cambiais são divididos em dois tipos para efeitos de tributação. Eles podem ser classificados como de curto ou de longo prazo.
Os fundos de longo prazo são compostos por papéis com vencimento acima de 365 dias, em média. Já os de curto prazo, por papéis com vencimento abaixo de 365 dias.
O período de permanência no fundo afeta o tamanho da alíquota cobrada. Na prática, quanto mais tempo o dinheiro ficar investido, menor será a taxa paga ao governo. O Imposto de Renda nos fundos cambiais segue as seguintes alíquotas regressivas:
Fundos de Curto Prazo | |
Até 180 dias de aplicação | 22,5% |
Acima de 180 dias de aplicação | 20% |
Fundos de Longo Prazo | |
Até 180 dias de aplicação | 22,5% |
De 180 a 360 dias de aplicação | 20% |
De 361 a 720 dias de aplicação | 17,5% |
Acima de 720 dias de aplicação | 15% |
A cobrança do Imposto de Renda nos fundos cambiais também segue a sistemática aplicada nos multimercados ou de renda fixa. Ela é semestral. Nos fundos de ações, isso é diferente, já que a tributação ocorre apenas na hora do resgate.
No caso dos fundos cambiais, os administradores calculam quanto os investidores devem de imposto duas vezes por ano: no último dia útil dos meses de maio e novembro. É considerada a menor alíquota de cada categoria (curto ou longo prazo). A cobrança é feita recolhendo cotas do fundo – por isso, a cobrança é conhecida como “come-cotas”.
Caso o investidor queira resgatar os recursos do fundo em um período menor, em que as alíquotas de IR seriam maiores do que recolhidas pelo come-cotas, a diferença entre o que já foi pago e o que resta acertar é retida pelo administrador na hora do saque.
O IOF, por sua vez, é cobrado apenas se o resgate do investimento for realizado em um período inferior a 30 dias a partir da aplicação. Nesse caso, a alíquota sobre o rendimento pode variar de 96% a 0%, dependendo do prazo.
Vantagens e desvantagens
Existem algumas vantagens de investir em ativos cambiais por meio de fundos, no lugar de apostar diretamente nas moedas. A gestão profissional e especializada oferecida pelos gestores é uma delas, assim como a praticidade de simplesmente transferir o dinheiro da conta para o fundo (não é preciso fechar nenhum tipo de operação mais sofisticada).
A diversificação proporcionada pelos fundos – muitos dos quais exigem aplicações iniciais relativamente baixas – também é uma vantagem. Fora a proteção do dinheiro das variações de preço das moedas estrangeiras, importante para quem tem compromissos lá fora.
Para ter acesso a tudo isso, no entanto, é preciso gastar com o pagamento das taxas de administração, coisa que não existe para quem compra as moedas por conta própria. A volatilidade do investimento também é uma questão a ser considerada – embora ela atinja tanto os fundos cambiais quanto as moedas em si.
Quando vale a pena investir?
Os especialistas em finanças costumam recomendar os fundos cambiais para os investidores que:
– tenham de realizar despesas no exterior, com viagens ou intercâmbios, por exemplo. Nesse caso, os fundos cambiais ajudam a proteger o valor do dinheiro na moeda estrangeira;
– queiram fazer hedge cambial para proteger os investimentos feitos localmente, em aplicações de renda variável ou outras que também tenham correlação negativa com moedas;
– tenham dívidas em moeda estrangeira para quitar;
– tenham algum tipo de negócio realizado com parceiros internacionais;
– queiram diversificar a carteira de investimentos, assumindo riscos mais ligados à economia internacional;
– por alguma razão, acreditam que podem obter retorno com a aplicação em moedas estrangeiras.
O mais importante, sempre, é que os investidores analisem seu próprio perfil antes de apostar em qualquer tipo de aplicação – inclusive, nos fundos cambiais. Como eles podem sofrer variações importantes em períodos de tempo relativamente curtos, vale a pena verificar a sua disposição para encarar os riscos.
Como você se sentiria se, durante um mês, seu fundo cambial registrasse um prejuízo de 5% ou 10%? Qual seria sua reação? Por quanto tempo você estaria disposto a persistir? Todas essas perguntas podem ajudá-lo a verificar se investir nessas carteiras vale a pena para o seu caso em especial.
- Leia mais: Como investir em Fundos Imobiliários?
Como escolher um Fundo Cambial
Ficou com vontade de investir em um fundo cambial? Antes de aplicar o seu dinheiro em um fundo, será preciso considerar alguns aspectos importantes para tomar essa decisão. Listamos alguns aqui abaixo, confira:
Avaliar o Risco
O investimento em fundos cambiais envolve uma dose considerável de volatilidade, assim como as aplicações em fundos de ações. As chances de ganhar são grandes, mas as de perder dinheiro, também são. As taxas de câmbio podem subir ou cair rapidamente, e cada vez que isso acontece as cotas sentem diretamente o impacto – seja para o bem, seja para o mal.
Verifique a aplicação mínima
Dependendo do valor que você tiver disponível para investir, o tamanho da aplicação exigida pelos fundos pode ser um fator importante a considerar. Em geral, os gestores costumam estabelecer uma aplicação inicial, que é um valor mínimo que deve ser aportado no primeiro investimento.
A aplicação varia muito de acordo com o nível de sofisticação e risco da carteira. Dentre os fundos cambiais disponíveis no mercado, por exemplo, há opções a partir de R$ 500. Mas há também fundos que exigem um aporte de pelo menos R$ 25 mil.
Alguns fundos cambiais podem determinar ainda um valor mínimo para cada movimentação, o que significa que novos aportes – depois do inicial – também devem obedecer uma faixa de corte.
Performance e rentabilidade
Quer saber como são os resultados do fundo cambial em que você pretende investir? Então procure os dados históricos de performance dele. Você já deve ter aprendido que rentabilidade passada não representa uma garantia para o retorno futuro. Mas avaliar o desempenho anterior ajuda a identificar como a carteira – e o seu gestor – se comporta em períodos distintos de mercado.
Essas informações ficam disponível nos sites da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Anbima (associação que representa as entidades do mercado de capitais), além de serem apresentados pelos administradores dos fundos em documentos como a lâmina. Acompanhar essas publicações permitirá a você se preparar para encarar os altos e baixos das cotas, sem sustos.
Benchmark: verifique a performance
Além do histórico de rentabilidade, também é importante verificar qual é o benchmark dos fundos cambiais que você estiver analisando. O benchmark é um indicador usado como referência para a performance da carteira. No caso dos fundos de ações, por exemplo, normalmente um índice de ações (como o Ibovespa) tem esse papel.
No caso dos fundos cambiais, o benchmark normalmente é um indicador relacionado a taxas de câmbio das moedas em que eles investem. Como muitos deles têm o dólar como referência, a Ptax é uma das possibilidades. Ela representa a média da taxa de câmbio praticada pelas instituições financeiras, calculada a partir de quatro consultas diárias feitas pelo Banco Central junto ao mercado. A Ptax tem um valor diferente do câmbio turismo ou comercial.
Assim, se um gestor afirma que o benchmark de um determinado fundo cambial é a Ptax, significa que ele vai procurar fazer todas as aplicações de modo que a rentabilidade da carteira siga de perto ou supere o desempenho dela em um determinado período.
Liquidez e Resgate
É muito importante verificar o que o regulamento dos fundos cambiais estabelece em relação à liquidez das carteiras. Esse é um assunto relevante porque determina quando você poderá ter o dinheiro de volta nas mãos, caso decida resgatar o investimento.
No regulamento, devem estar especificadas a data de conversão (quando o cálculo do valor das cotas será feito para o pagamento do resgate) e também a data de pagamento (quando os recursos serão efetivamente disponibilizados ao investidor).
Se o regulamento de um fundo cambial prevê que a data de conversão ocorre em D+1, significa dizer que o cálculo do valor das cotas usado como referência para o pagamento do resgate será um dia útil após a data em que o resgate foi pedido. Isso tem um efeito prático relevante: na data de conversão, as cotas podem ter um valor diferente da data do pedido do resgate.
Se a data de pagamento prevista no regulamento desse mesmo fundo for em D+3, o depósito do dinheiro será feito três dias úteis depois. Fundos Simples ou DI costumam ter prazos de pagamento bem curtos. Já nos de ações ou crédito privado, isso é diferente. Como os títulos emitidos por empresas são mais difíceis de negociar, as carteiras podem precisar de tempo e o pagamento pode acontecer em D+10, D+30 ou até D+90.
Rating: confira avaliações de agências
Avaliações externas – de casas de análise ou de especialistas – sobre os fundos cambiais são uma boa ferramenta para ajudar na sua escolha. Em geral, elas consideram fatores objetivos, como rentabilidade e nível de risco, para indicar quais carteiras são as melhores do mercado.
O rating de fundos elaborado pela Morningstar, casa de análise americana presente no Brasil desde 2012, é um exemplo. A empresa atribui até cinco estrelas a cada carteira avaliada. O objetivo é dar referências para os investidores que querem aplicar.
O rating da Morningstar se baseia em três pilares: quanto o fundo cobra em taxas, a sua rentabilidade em comparação com o CDI e a volatilidade. Para que seja elegível a receber a classificação, a carteira precisa ter pelo menos 36 meses de histórico