Quando um relacionamento acaba, seja ele um casamento ou uma união estável, é preciso reorganizar a vida, e isso envolve não só os laços afetivos, mas também algumas questões legais.

Em relação ao casamento, o marco formal do término é o divórcio. O tempo e o dinheiro gastos nesse processo dependerão da complexidade de cada situação – se existe consenso quanto à guarda dos filhos, aos valores de pensão alimentícia, à divisão do patrimônio, e por aí vai. E, para evitar surpresas ou prejuízos para as partes, é muito importante conhecer todas essas peculiaridades.

Neste conteúdo, reunimos orientações de especialistas relativas aos principais aspectos gerais de um divórcio. Confira:

O que é divórcio?

Divórcio é o procedimento legal que desfaz o vínculo formal de duas pessoas que se uniram pelo casamento. 

Marina Dinamarco, advogada especialista em direito de família e sucessões, observa a importância de se diferenciar a separação de corpos do divórcio em si.

“Os efeitos do casamento são interrompidos no momento em que um casal se separa e passa a viver em casas distintas. Isso significa que as obrigações conjugais, inclusive a comunicação patrimonial termina com a separação de corpos, mesmo que o divórcio ainda não esteja formalizado”, explica.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

A formalização do divórcio e os efeitos sobre o patrimônio

Quando o regime de bens do casamento é o de comunhão parcial ou total de bens, o esforço para construir patrimônio termina com a separação de corpos. Ou seja, tudo o que os ex-companheiros adquiriram depois de separados pertence a cada um, e não mais a ambos, mesmo que ainda não tenham assinado o divórcio.

Como toda separação envolve custos, é muito comum que os casais deixem de viver juntos e venham a formalizar o divórcio somente tempos depois. Mas, em algum momento, será preciso estabelecer as condições para o término do vínculo, para que a separação não configure abandono do lar, como alerta Julia Prado Moreira, advogada e sócia do escritório PLKC Advogados.

E como provar a separação de corpos se o ex-casal ainda não deu entrada no divórcio? Segundo Marina Dinamarco, o contrato de aluguel do cônjuge que saiu de casa, declarações de vizinhos ou da portaria que atestam que o casal não está mais junto, a conta de luz de um imóvel de férias do casal que estava zerada e aumenta de valor de repente são algumas maneiras de comprovar a separação. 

Porém, algumas situações são difíceis de se comprovar. Nesse sentido, Marina relata o exemplo de um casal que, depois de separados, a mãe foi morar com os filhos na Europa e o pai permaneceu no Brasil, sem que o divórcio tivesse sido formalizado. De tempos em tempos, o pai ia ao encontro dos filhos no exterior e, como ambos mantinham uma boa relação, ele ficava no apartamento da ex-cônjuge com as crianças.

Durante as visitas do pai, eram frequentes as idas a restaurantes e a outros locais públicos, sempre todos juntos. Tempos depois, a ex-cônjuge obteve testemunhas do convívio da “família”, e o juiz decidiu que, mediante as provas, o momento da separação seria considerado o mesmo da entrada do pedido de divórcio.

“Para evitar esse tipo de situação, o ideal é formalizar o divórcio o quanto antes. Caso contrário, sempre existirá a possibilidade de que uma das partes reivindique um patrimônio que não lhe pertence por direito”, alerta a advogada.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

LEIA MAIS:

Qual advogado cuida do divórcio?

O advogado especializado em direito de família é o profissional mais habilitado para cuidar dos processos de divórcio, como explica Marina Dinamarco.

“Às vezes, para reduzir gastos, as pessoas contratam o advogado da empresa, ou um amigo que atue em áreas que não o direito de família. Quando isso acontece, há chances de se ter um divórcio mal escrito, o que poderá gerar problemas no futuro”, observa.

Como é feita a separação de bens no divórcio?

A divisão patrimonial no divórcio dependerá do regime de bens do casamento.

No caso da separação total de bens, não existe um patrimônio comum do casal. Logo, cada um fica com o que já tinha antes do casamento e com o que adquiriu individualmente ao longo dos anos, pois os bens de ambos não se comunicam.

O contrário ocorre na comunhão universal de bens. Nesse caso, todo o patrimônio se mistura, e cada ex-cônjuge fica com metade dos bens no divórcio.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Já quando o regime é de comunhão parcial de bens, somente o patrimônio formado durante o casamento é considerado comum, ficando de fora da partilha os bens que cada cônjuge já tinha antes do casamento ou que tenham recebido por meio de herança ou doação a qualquer tempo.

A sub-rogação também não entra na divisão de bens do divórcio. Por exemplo, antes do casamento, um dos cônjuges tinha um apartamento que valia R$ 500 mil. Depois do casamento, vendeu esse imóvel e os dois compraram uma casa no valor de R$ 1 milhão. Nessa situação, R$ 500 mil serão sub-rogados ao cônjuge que vendeu o apartamento (desde que prove a venda), pois esse valor já lhe pertencia quando solteiro.

Segundo Marina Dinamarco, o ideal na partilha de bens é que o casal não fique em condomínio no patrimônio, ou seja, que evite a dupla propriedade dos bens, pois isso pode gerar problemas no futuro.

“Eu sempre aconselho que o casal faça uma equiparação patrimonial. Por exemplo, um fica com os dois imóveis, e o outro, com o carro e a empresa. Caso contrário, quando quiserem vender os bens futuramente, precisarão fazer uma avaliação, o que demanda tempo e dinheiro”, alerta a advogada.

Se não for possível evitar o condomínio, o ideal é já estabelecer algumas condições de negociação na partilha, como o valor mínimo de venda dos bens, como farão com os custos (se os dois pagam ou se um paga e abate o valor na hora da venda, etc.). 

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

“É importante já deixar pontos como esses estipulados no momento da partilha para evitar um possível litígio no futuro”, explica Marina.

O que é divórcio litigioso?

O divórcio litigioso acontece quando não há consenso entre as partes sobre um ou mais aspectos que envolvem a separação. 

Se não se chega a um acordo sobre o valor da pensão alimentícia, partilha dos bens, quem sai de casa e quem fica, regime de convivência com os filhos, tudo isso é passível de litígio, e pode ser discutido na Justiça.

Como dar entrada no divórcio?

Se não houver litígio e se o casal não tiver filhos menores ou incapazes, o divórcio pode ser feito no cartório, por escritura pública, o que torna o processo bem mais simples e rápido.

Por outro lado, quando há menores envolvidos ou alguma divergência, o processo deve seguir pela via judicial.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

“Quando há menores ou incapazes, o juiz precisa analisar a petição para verificar as regras que estão sendo estipuladas no processo. Ele só irá homologar o divórcio depois de certificar que os direitos dos envolvidos estiverem garantidos”, explica Julia Moreira.

Seja na via judicial ou extrajudicial, o processo de divórcio precisará da participação de um advogado. Embora o mesmo profissional possa representar ambas as partes no divórcio consensual, Marina Dinamarco aconselha que cada um tenha o seu advogado.

“Mesmo quando não há litígio, as partes se sentem mais seguras quando cada uma tem um advogado enxergando e representando os seus interesses”, diz a advogada.

Como funciona o divórcio quando há filhos?

Como vimos, se houver filhos menores ou incapazes, o divórcio obrigatoriamente deverá ser judicial, mesmo se houver consenso entre as partes.

No caso de litígio, o juiz determina de forma liminar (urgente) as questões de pensão alimentícia e guarda dos filhos. No Brasil, a regra é a guarda compartilhada, que prevê decisões como a escola que os filhos irão frequentar, quem será o pediatra, e assim por diante. Porém, muita gente confunde isso com a guarda alternada, como explica Marina Dinamarco.

“Guarda compartilhada significa que ambos irão dividir as responsabilidades sobre a criação dos filhos. Isso não tem nada a ver com a guarda alternada, que é quando as crianças moram um determinado período com cada um dos pais”, explica a advogada.

Normalmente, na guarda compartilhada, os filhos moram com a mãe, e o regime de convivência com o pai é previamente definido. Por exemplo, um pernoite durante a semana, fins de semana alternados, metade das férias com cada um, tudo isso é estabelecido no início do processo.

Quanto à guarda alternada, existe resistência por parte do Ministério Público e do Judiciário brasileiro, sob a justificativa de que as crianças ficam sem uma referência de lar. 

“Mesmo quando o casal está de acordo com a guarda alternada, às vezes é preciso recorrer ao Tribunal de Justiça do estado para homologar o divórcio, pois o Judiciário nega a solicitação. No Brasil existe essa resistência, enquanto na Europa a regra é o regime alternado de convivência”, observa Marina.

Quanto custa um divórcio?

Além dos honorários advocatícios, que dependerão de cada profissional e da complexidade do caso, existem as custas processuais do divórcio.

Cada estado tem a sua própria tabela de custas, que pode ser consultada no site do Tribunal de Justiça em que tramitar a ação de divórcio. E o valor de cada processo também dependerá do que está sendo discutido e de situações que possam surgir ao longo do tempo e que demandem gastos extras.

Como explica Julia Moreira, se o casal vem com o pacote completo – partilha de bens, pensão alimentícia, guarda e visitas – o processo pode sair bem caro.

Em São Paulo, as custas processuais para uma partilha de patrimônio acima de R$ 500 mil e até R$ 2 milhões são de 300 UFESP, o equivalente a R$ 10.608 (o valor da UFESPs em 2024 é de R$ 35,36). 

“Já se o valor dos bens ultrapassam R$ 5 milhões, o custo passa para 3 mil UFESPs – ou R$ 106.080, ao passo que uma partilha extrajudicial custa pouco mais de R$ 37 mil”, diz Marina Dinamarco.

Quando a discussão for somente sobre pensão alimentícia, as custas processuais serão de 12 vezes o valor determinado pela Justiça. Por exemplo, para uma pensão de alimentos de R$ 5 mil, o valor cobrado para a ação será R$ 60 mil.

Há também situações em que não há consenso sobre qual cônjuge deve ficar com os filhos. Nesse caso, pode ser preciso fazer uma perícia para atestar quem tem mais condições de ter a guarda, e isso pode custar de R$ 10 a R$ 20 mil, segundo Marina Dinamarco. 

Ou seja, se o casal vem com o pacote completo – partilha de bens, pensão alimentícia, guarda e visitas – o processo pode sair bem caro, como observa Julia Moreira.

“Hoje em dia, as partes têm a opção de realizar o divórcio judicial somente em relação ao que a lei obriga, como guarda dos filhos e regras de visita. Para reduzir os custos, a partilha pode ser feita extrajudicialmente, mesmo quando há menores envolvidos, pois a divisão do patrimônio em si não está sujeita à homologação do juiz”, observa.

Segundo a advogada, se essa for a decisão, basta que as partes informem na petição que será submetida ao juiz que ainda não estão prontos para realizar a partilha, e que farão isso em um momento seguinte. “Depois, ambos podem tentar chegar a um acordo diretamente em um cartório de notas”, explica.

E ainda há casos em que a partilha dos bens não é totalmente equilibrada, ou seja, quando um dos cônjuges fica com mais patrimônio do que o outro. Por exemplo, se uma das partes ficar com o equivalente a 60% dos bens e a outra com 40%, sobre a diferença de 10% incidirá o ITCMD, o imposto sobre doações, cuja alíquota vai depender de cada estado.

Quanto tempo leva para sair um divórcio?

Quando o divórcio é consensual, o processo costuma ser rápido e homologado em cerca de 15 dias, segundo Dinamarco. Porém, no caso de divórcios litigiosos, não há como prever a sua conclusão, pois tudo dependerá do tempo que levar para que se resolvam as pendências entre o casal e as questões que possam ter surgido ao longo do processo.

“Na maioria das vezes, o divórcio litigioso termina com um acordo. Mas pode demorar muitos anos até que as partes cheguem a um consenso, e não existe um tempo máximo para isso”, afirma a advogada.

Embora o prazo dependa de vários fatores, Julia Moreira diz que, tranquilamente, um divórcio litigioso leva, ao menos, três anos para se resolver em primeira instância.

“Aqui no escritório, nós já vimos processos que levaram 10 anos para serem concluídos”, diz a sócia do PLKC Advogados.

Alguns alertas para os processos de divórcio

Segundo Julia, nos processos de divórcio, um dos pontos que mais causam surpresa em uma das partes é a forma de gestão do patrimônio familiar. 

Em um casamento, é muito comum que os cônjuges se dividam em frentes, pois enquanto um se ocupa da família, o outro cuida sozinho das finanças. E quando ambos decidem se divorciar, uma das partes não tinha a menor noção do que acontecia com os bens. “Dependendo do regime de bens, é muito importante estar ciente da gestão patrimonial e, se possível, fazer um pacto antenupcial, no qual se discutam todas as questões que possam envolver os bens comuns”, aconselha a advogada.

Já Marina Dinamarco alerta para o perigo de se ter pressa na conclusão do processo.

“Na ânsia de formalizar o divórcio, algumas pessoas acabam assinando um acordo desvantajoso, e se arrependem pouco tempo depois. Não que seja impossível rever a partilha, mas é um processo bastante caro e difícil de reverter. Por isso, é muito importante não atropelar o processo, e sempre contar com um bom advogado de família”, orienta.

Como consultar o processo de divórcio?

As partes podem consultar o andamento do processo no próprio site do Tribunal de Justiça onde tramita a ação. Como os processos de família correm em segredo de justiça, será preciso uma senha de acesso, que o próprio advogado do caso fornece ao cliente.