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SÃO PAULO – Faltando uma semana para a eleição nos Estados Unidos, o mundo está de olho em quem será o próximo presidente da maior economia do mundo. Além do impacto natural das políticas americanas em todo o planeta dado a potência que o país é, no caso do Brasil, alguns fatores trazem um interesse ainda maior para quem será o vitorioso.
Desde antes mesmo de assumir a presidência, Jair Bolsonaro (sem partido) já deixava claro seu alinhamento de ideias com Donald Trump (ambos são de direita, conservadores nos costumes e com estilo populista, voltado para uso das redes sociais). Mas, mais do que simpatia, o presidente brasileiro entendia que o País desperdiçou oportunidades nos últimos anos de ter uma relação comercial e em outros campos com os americanos.
Portanto, caso o republicano se mantenha na Casa Branca por mais quatro anos, a tendência é que a relação com o Brasil não passe por grande mudanças, o que, por sua vez, também não deve se refletir no mercado financeiro e nos negócios por aqui.
Como destaca a equipe de analistas do BB Investimentos, “a atual relação existente entre Brasil e EUA, com alinhamento ideológico e posição junto a órgãos multilaterais, deverá ser mantida” em caso de vitória de Trump.
A grande questão, porém, está na transição de poder com uma vitória de Joe Biden. Inicialmente, mercados no mundo todo devem refletir o que se ver nas bolsas dos EUA, que inicialmente pode ser de grande volatilidade caso ocorra uma judicialização da eleição com a contestação da apuração por um dos candidatos.
Mas o que tem preocupado muitos investidores é o fato do democrata ter uma linha ideológica bem diferente de Bolsonaro – por ser de esquerda e defender pautas de meio ambiente e direitos humanos, por exemplo -, temendo que isso possa prejudicar a relação entre os dois países. Segundo especialistas ouvidos pelo InfoMoney, porém, não devemos ver um impacto tão grande assim.
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Isso porque Biden é considerado de uma ala mais centrista dos democratas, o que já reduz riscos de uma postura – ou propostas – mais dura, e isso vale tanto para o Brasil quanto para outros países, incluindo a China, em que as relações estão mais estremecidas.
Durante evento recente realizado pela gestora BlackRock, Roberta Jacobson, ex-embaixadora dos Estados Unidos no México (2016-2018) avaliou que caso o democrata saia vitorioso, a relação entre EUA e Brasil não deve ser prejudicada, uma vez que Biden tende a se relacionar bem com diferentes líderes e costuma “se colocar no lugar do outro”.
“Uma das maiores habilidades dele é a comunicação interpessoal. Mas isso não significa um passe livre, ou seja, que ele vá ignorar questões como meio ambiente e direitos trabalhistas. Ele vai ser duro quando precisar”, disse ela.
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Sobre estas questões que devem pesar mais, Sol Azcune, analista política da XP Investimentos, destaca que Biden citou o Brasil no primeiro debate contra Trump, citando os problemas de desmatamento na Amazônia.
Durante o debate Biden propôs que países de todo mundo se reúnam para fornecer US$ 20 bilhões para a preservação da Amazônia e disse que o Brasil enfrentará “consequências econômicas significativas”, caso o país não pare a destruição da floresta e se ele for eleito.
“Dado que o Brasil já está enfrentando uma pressão nesta questão ambiental, em especial da Europa, provavelmente acabaríamos vendo uma ampliação dessa pressão com Biden se unindo nessa pauta contra o Brasil”, avalia Sol.
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Apesar desta questão ambiental e alguns outros pontos específicos que possam gerar maiores discussões entre os dois governos, a relação diplomática e os acordos já realizados devem se manter.
“O democrata é visto como pessoa de estilo construtivo, que valoriza parcerias, determinado e disposto a dialogar. No entanto, há potencial de tensão entre um possível governo Democrata e o atual governo brasileiro. Mas, mesmo que o Brasil perca o alinhamento com os EUA no campo ideológico e em posicionamentos nos órgãos multilaterais, a avaliação é de que as conquistas na agenda bilateral com o Brasil continuarão sendo do interesse do governo americano”, afirma a equipe do BB Investimentos.
Michael López Stewart, diretor da Arko Advice, consultoria especializada em política, destaca que existem “dois níveis da diplomacia”. “Temos a diplomacia em nível de narrativa, aquela de Twitter, da amizade pessoal, e temos a diplomacia técnica, que funciona dentro do Itamaraty com talvez um dos grupos mais preparados de diplomatas do mundo que o Brasil dispõe hoje”, afirmou ele em live no InfoMoney.
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Segundo ele, o impacto de uma vitória de Biden seria no nível da macronarrativa, com mudança na aliança pessoal dos governantes, enquanto a cooperação técnica entre as duas nações, por ser mais profunda, deve se manter. “Nas reais relações entre os dois países, a mudança não seria tão brusca assim”.
Já Sol, destaca ainda que mesmo durante o governo Trump até o momento, o Brasil não conseguiu tantos benefícios como aliado. “Então a tendência é que não seja um impacto muito significativo ou muito duradouro, e que a comunicação entre os países continue”, afirma a analista, lembrando que integrantes do governo, como o vice-presidente Hamilton Mourão, já falaram que não teriam problemas em trabalharem ao lado de um governo Biden.
Pautas importantes
Mesmo que analistas acreditem que as relações entre Brasil e EUA se mantenham próximas do que já são hoje, alguns assuntos específicos deverão ser acompanhados de perto caso Biden assuma a Casa Branca, já que as conversas podem não ser tão fáceis a partir de então.
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Um deles é um amplo acordo de livre comércio, algo que Bolsonaro tem dito buscar desde que assumiu o poder, em 2019. Apesar dos dois países não terem conseguido uma parceria como essa, na semana passada foi fechado um Acordo de Comércio e Cooperação Econômica (ATEC, na sigla em inglês) que prevê, entre outras medidas, a facilitação do comércio e o combate à corrupção.
Com uma reeleição de Trump, é bem provável que este tipo de relação se mantenha, com possíveis novos acordos, ainda que o presidente americano tenha uma postura mais protecionista em alguns pontos.
Com Biden, também não há expectativa de uma mudança, mas é aí que temas como meio ambiente, direitos humanos e direitos trabalhistas podem pesar, com maiores dificuldades para o Brasil caso o democrata queira colocar pautas do tipo nas conversas.
Na mesma linha, a tão sonhada entrada Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) também é um assunto que seria mais favorecido com Trump no poder, já que ele mantém a postura de apoiar o Brasil a entrar no grupo dos países desenvolvidos. Com Biden, não há garantia de que isso se mantenha (ele nunca se manifestou sobre o assunto).
Tecnologia é outro tema que deverá ser bastante observado com um novo governo americano, principalmente por conta do crescimento chinês nesta área. Recentemente, por exemplo, os EUA têm lutado para que a Huawei não consiga participar do leilão de 5G no Brasil.
Neste sentido, Biden tem um pensamento mais parecido com Trump, criticando a China, apesar de uma postura um pouco diferente quanto ao enfrentamento da situação. Mesmo assim, com o democrata no poder a expectativa é que se mantenham as pressões para limitar o crescimento tecnológico chinês.
Impacto no mercado
No mercado financeiro, o primeiro impacto da eleição americana será um reflexo do que as bolsas dos EUA fizerem em meio à expectativa pelo resultado, avaliam analistas. Contudo, olhando para um horizonte após as tensões iniciais e riscos de judicialização, as projeções são positivas.
Segundo apontou James Gulbrandsen, fundador e gestor da NCH Capital, durante uma live com o Stock Pickers, a principal questão para o mercado brasileiro será o câmbio.
Ele aponta que o movimento do dólar tem grande impacto e pelo real, entre outras características, ser uma moeda operada mais no mercado futuro, faz com que o estrangeiro a opere olhando sempre para oportunidades na Bolsa, e não com ganhos em moeda física.
“E se os democratas levarem Câmara, Senado e presidência, a tendência é de queda do dólar, porque vai haver muito gasto do governo e aumento de impostos”, afirma o gestor destacando que, historicamente, o partido de Biden tende a gastar mais.
E, por isso, a moeda americana deverá recuar nos meses seguintes à eleição, o que, para ele, é algo muito bom para o Brasil. Por outro lado, ele lembra que, mesmo assim, o País tem seus próprios problema, ou seja, essa queda do dólar não seria a solução de todos os problemas. Mas, em geral, sua visão para mercados emergentes em 2021 é positiva.
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