Taxação de dividendos: justiça tributária ou bitributação?

Volta da cobrança, defendida por Lula na semana passada no contexto da reforma tributária, é tema polêmico, devido à forte carga tributária que incide sobre as empresas

Roberto de Lira

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu uma polêmica declaração na semana passada, dizendo que quem vive de salário no Brasil paga imposto de renda e quem vive de lucros e dividendos não paga. A fala do presidente parte de uma leitura de forte viés político, em um momento em que as discussões sobre a reforma tributária se voltam para a renda após a votação do capítulo do consumo no ano passado.

A declaração foi classificada como simplista ao trazer o sempre debatido tema da justiça tributária e da defesa da progressividade sem um contexto mais apurado. Ainda que cresçam a cada dia os defensores da máxima de “quanto maior a renda, maior deve ser a tributação”, não é possível esquecer que as empresas já foram tributadas antes da distribuição de dividendos.

Ao mesmo tempo em que há leituras de que a volta da taxação dos dividendos poderia se configurar como uma bitributação e que a manutenção da isenção incentivaria o investimento e o empreendedorismo, há quem veja na medida atual uma das principais causas da regressividade do sistema tributário brasileiro.

No livro de 2022 “Progressividade tributária e crescimento econômico”, organizado por Manoel Pires e com a participação de outros economistas do FGV/Ibre, esse debate sobre a busca da progressividade é contextualizado com dados comparativos internacionais.

O livro lembra que a tributação de 34% do lucro corporativo no Brasil – dividida em 25% do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e 9% da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) – é a segunda maior entre 111 países, perdendo apenas para o arquipélago de Malta, segundo dados da OCDE.

Distorções

Um ponto a ser considerado é que o sistema tributário brasileiro tem várias distorções, pelas quais se criam brechas que permitem a empresas de vários portes e segmentos evitar o pagamento de impostos por meio de planejamento tributário. Com isso, a estimativa da carga efetiva estava em 18,08%, na média do período 2012-2022, segundo cálculos do FGV/Ibre.

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Segundo a obra, “as alíquotas corporativas ainda são elevadas e o sistema muito distorcido o que abre espaço para migrar a tributação para a renda das pessoas físicas ampliando a progressividade do sistema e gerando ganhos de eficiência econômica.”

O livro lembra ainda que o sistema de cobrança atual foi concebido nos anos 1990 e não acompanhou o processo de reforma tributária que reduziu as alíquotas corporativas nas maiores economias do mundo, deixando o país para trás em termos de competitividade nesse quesito.

Com isso, mesmo com alíquota maior, há um baixo nível de arrecadação governamental. Para quem acredita que uma maneira de contornar isso seria a adoção de uma alíquota nominal mais elevada, é bom lembrar que essa medida pode acabar dificultando o desempenho econômico das empresas que não se beneficiam das exceções.

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Vem daí o risco do surgimento de uma série de lobbies, “que fracionam o sistema tributário para atender grupos específicos de empresas com menor produtividade”, diz um outro estudo, assinado pelos economistas Manoel Pires, Pedro Romero Marques e José Bergamin.

Reforma

Até quem está na ponta da produção não discorda de uma taxação de dividendos, desde que seja feita em conjunto com a redução da alíquota nominal (estatutária) de IRPJ e CSLL. Isso para um patamar abaixo da média da OCDE (de 23%), conforme sugestão da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

O FGV/Ibre defende que uma reforma tributária corporativa adequada deve ter como objetivo tornar a tributação mais uniforme (o princípio da neutralidade), tornar o sistema tributário mais competitivo para atração de empresas e ampliar a base de arrecadação para reduzir exceções, que ampliam a diferença entre alíquotas nominais e reais.