Reforma tributária é populista e compromete longo prazo, diz Bernard Appy

Para economista, medidas propostas possuem "erros clássicos de desenho tributário" e mudanças indicam viés eleitoral

Estadão Conteúdo

Bernard Appy (Foto: Filipe Scotti/FIESC)
Bernard Appy (Foto: Filipe Scotti/FIESC)

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O economista Bernard Appy, fundador do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e uma das cabeças por trás da reforma tributária vista na PEC 45, classifica as atuais mudanças anunciadas pelo Ministério da Economia como “populistas” e com viés eleitoral. Para ele, há coisas boas no anúncio da equipe do ministro Paulo Guedes, mas que possuem “erros clássicos de desenho tributário”.

Segundo Appy, a proposta nem sequer poderia ser considerada uma reforma tributária, pois não tem o potencial de ampliar o ritmo de crescimento do País.

“A minha visão é que as propostas têm um efeito eleitoral positivo, mas são ruins para o crescimento de longo prazo”, diz Appy. A seguir, os principais trechos da conversa.

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Como o sr. avalia as propostas de mudanças tributárias anunciadas pelo governo?

Existem coisas boas na proposta do governo, mas o desenho geral é bastante negativo. O que tem de bom são as mudanças nos tributos sobre aplicações financeiras, que vão na direção correta. Mas, ao mesmo tempo, faltou incluir CRI, CRA, LCI e LCA, e isso claramente foi uma decisão política. A minha visão é que as propostas têm um efeito eleitoral positivo, mas são ruins para o crescimento de longo prazo.

Há uma visão eleitoreira na proposta?

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O aspecto populista é evidente no reajuste na tabela (do IR). É uma medida eleitoral. Em contrapartida, as mudanças, principalmente para as grandes empresas, tornarão o investimento no Brasil menos atraente. E isso tanto para os brasileiros quanto para os estrangeiros. A calibragem foi pesada para as empresas, pois vão reduzir o Imposto de Renda e aumentar na distribuição de lucros, que é uma ideia positiva, mas não foi bem calibrado.

Por que a proposta do governo não vai na direção correta?

As empresas estrangeiras utilizam muito os juros sobre o capital próprio. Acredito que, com as mudanças, vai ficar mais oneroso para todos. A alíquota média sobre o lucro distribuído nos países da OCDE é de 42%. No Brasil, esse número era de 15% no caso dos juros sobre capital próprio e até 34% sobre o restante. Agora, com as mudanças propostas, vai para 43%. É mais do que a média da OCDE. A calibragem vai ser mais onerosa, e em um momento de guerra tributária internacional, ainda que parcialmente moderada pelas ações do presidente americano Joe Biden.

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O sr. enxerga distorções na proposta?

A tributação das pessoas jurídicas que prestam serviço como sócios de empresas precisaria ser corrigida. Mas, de novo, a forma como o governo escolheu vai gerar muita distorção. Eles colocaram uma alíquota muito alta, de 20%, mas o lucro distribuído aos sócios de empresas com receita até R$ 4,8 milhões por ano é isenta até R$ 20 mil por mês. Para uma pessoa que trabalha nesse sistema e tem poucos custos, se ganhar R$ 20 mil em lucro presumido, vai pagar 7,5% de imposto. Enquanto isso, um empregado comum está pagando 27,5% por esses mesmos R$ 20 mil.

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Quais os efeitos que isso pode gerar?

Como eles colocaram esse limite de R$ 4,8 milhões, todos vão se organizar para entrar nesse limite de faturamento. A empresa que chegar a uma receita próxima desse valor, vai deixar de produzir para não pagar mais imposto. É um erro clássico de desenho tributário. Ou as empresas vão deixar de produzir ou vão se fragmentar. O efeito disso é a economia se organizar de maneira menos eficiente.

Qual a sua visão sobre a permissão do governo para atualizar o valor dos imóveis na declaração do IR?

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Eu considero isso uma pedalada. Você teria uma receita de ganho de capital entre 15% e 22,5% e vai arrecadar 5%. Isso é para arrecadar receita e tem cara de pedalada. O governo fez isso para fechar as contas em 2022 e 2023. Você sacrifica o longo prazo pelo curto prazo.

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Como enxerga as discussões sobre unificação de impostos?

Vamos ver como vai andar no Congresso. A sinalização do Arthur Lira (presidente da Câmara) é de levar a unificação do PIS e da Cofins e o Imposto de Renda sem discussão. Isso realmente não é a realização de uma reforma com seriedade. Se queremos discutir uma mudança profunda e seus efeitos, não pode ser feito sem passar por uma análise.

Estamos perdendo a oportunidade de unificar mais impostos?

Obviamente, seria muito melhor do que investir na unificação somente do PIS e da Cofins. Até poderia ser da atual forma, se houvesse uma proposta de transição com todos os outros. Que fosse um imposto federal e outro subnacional e com uma transição mais rápida. Porém, essa atual proposta da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) pode gastar o capital político sem fazer uma reforma ampla e pode até prejudicar uma reforma mais ampla no futuro.

A proposta do governo pode ser considerada uma reforma?

Eu não classificaria como uma reforma. Certamente, a proposta não atende ao objetivo de melhorar o potencial do crescimento do Brasil. Ela vai em direção oposta. Não é um bom desenho.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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