Produção industrial ruim, varejo ainda mais decepcionante: o que aconteceu em agosto com esses setores e o que esperar

Expectativa é de cenário desafiador nos próximos meses; após dados, XP ressalta que projeção atual do PIB para 2021 tem viés de baixa

Lara Rizério

 (Foto: Mario Tama/Getty Images)
(Foto: Mario Tama/Getty Images)

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SÃO PAULO – Depois de revelados na véspera dados de agosto de produção industrial decepcionantes, ainda que uma baixa já fosse esperada, outro dado veio ainda mais negativo nesta quarta-feira (6).

As vendas do comércio varejista caíram 3,1% em agosto na comparação com julho de 2021, a primeira queda após quatro taxas positivas consecutivas e muito abaixo da projeção Refinitiv de alta de 0,7% na base mensal. Na comparação com agosto de 2020, o comércio varejista teve queda 4,1%, ante expectativa de alta de 2%.

No comércio varejista ampliado, que inclui, além do varejo, veículos e materiais de construção, o volume de vendas caiu 2,5% em agosto na comparação com julho, ante um consenso de queda de 0,5%.

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Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs, aponta que, após uma forte contração no primeiro trimestre e uma boa recuperação no segundo trimestre, a expectativa ainda é positiva para o segmento no segundo semestre de 2021.

Contudo, o aumento da inflação e dos juros, as condições de financiamento mais restritivas, o sentimento do consumidor mais fraco e o aumento da incerteza política podem limitar o lado positivo.

Cabe ressaltar que seis das oito atividades pesquisadas tiveram taxas negativas em agosto, com destaque para outros artigos de uso pessoal e doméstico (queda de 16,0%), que teve a principal influência negativa sobre o indicador. Essa atividade é composta, por exemplo, pelas grandes lojas de departamento.

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Segundo Cristiano Santos, gerente da pesquisa, este foi um setor que sofreu bastante no início da pandemia, mas se reinventou com a reformulação das suas estratégias de vendas pela internet.

“Isso culminou com crescimentos expressivos, principalmente em julho (19,1%) com o lançamento das plataformas de marketplace. Com muitos descontos, o consumidor antecipou o consumo em julho, fazendo com que o mês de agosto registrasse uma queda grande de 16%. Esse recuo, contudo, não é suficiente para retirar os ganhos dos quatro meses anteriores”, apontou.

Mas, além desse segmento, também recuaram no período os setores de equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (-4,7%), combustíveis e lubrificantes (-2,4%), móveis e eletrodomésticos (-1,3%), livros, jornais, revistas e papelaria (-1,0%) e hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo (-0,9%).

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De acordo com Santos, houve efetivamente um gasto menor das famílias na passagem de julho para agosto. “Hiper e supermercados, assim como combustíveis e lubrificantes, vêm sendo impactados pela escalada da inflação nos últimos meses, o que diminui o ímpeto de consumo das famílias e empresas”, apontou.

As duas atividades que tiveram variação positiva no volume de vendas em agosto foram tecidos, vestuário e calçados (1,1%) e artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos (0,2%).

A XP ressalta que histórias diferentes estão marcando o varejo brasileiro no período recente.

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“Enquanto poucos segmentos colhem os frutos da reabertura econômica (roupas e calçados como o principal exemplo),  muitos outros desaceleram em meio à inflação mais alta, deterioração das condições financeiras e gastos familiares saindo de bens e indo para serviços (por exemplo, supermercados; móveis e eletrodomésticos; materiais de construção) ou recuo devido à escassez de matérias-primas (por exemplo, veículos, equipamentos de informática e comunicação).

“De forma geral, esperamos que as vendas no varejo cresçam modestamente no curto prazo, com sinais erráticos na comparação mensal.  A recuperação do mercado de trabalho deve fornecer algum suporte para a demanda doméstica no futuro, compensando as condições monetárias mais restritivas e o estímulo fiscal reduzido. O índice do varejo amplo deve crescer 6,7% em 2021 (ante baixa de 1,4% em 2020) e 1,7% em 2022. Por sua vez, o núcleo do índice do varejo deve subir 4,5% neste ano e 1,2% no próximo”, aponta a equipe da XP.

Ressaltando que o resultado bem abaixo do esperado tanto no varejo restrito quanto no ampliado por conta da inflação alta e demanda saindo de bens para serviços, João Leal, economista da Rio Bravo, aponta que essa tendência deve persistir, não antevendo uma melhora relevante para o comércio nos próximos meses.

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Em relatório, a equipe de análise de ações da XP ressalta que, após meses de forte volatilidade para o setor varejista na Bolsa, o momento ainda não acabou.

“Continuamos cautelosos com a dinâmica do varejo no curto-médio prazo, dada a perspectiva de crescimento do PIB mais baixa, ambiente de inflação mais elevada levando à redução da renda disponível da população e um perfil de consumo mais cauteloso dada a maior incerteza política. Além disso, as taxas de juros devem continuar subindo, o que é um desafio em termos de apetite de crédito do ponto de vista do consumidor, enquanto a incerteza macro/política é um ponto de atenção do lado das instituições financeiras. Por fim, esperamos que essa incerteza macro/política permaneça por algum tempo, já que 2022 é um ano de eleições, que geralmente é um período volátil devido às campanhas e aos resultados das pesquisas presidenciais”, apontam os analistas Danniela Eiger, Thiago Suedt e Gustavo Senday.

Gargalos preocupam na indústria

Com relação à produção industrial divulgada na véspera, os economistas da XP apontam que, apesar da sólida demanda final, os fabricantes relatam dificuldades para aumentar a produção devido à escassez de insumos e componentes.

“Os gargalos nas cadeias de suprimentos e a crise hídrica-energética seguem muito preocupantes, e deprimem a atividade industrial. Problemas na oferta de matérias-primas e elevação significativa dos custos vêm reduzindo os níveis de produção em diversas cadeias manufatureiras”, destacam os economistas.

Para a produção industrial, a XP espera expansão de 5,0% (após retração de 4,7% em 2020), mas ressaltando que já chegou a prever (há alguns meses) crescimento de 6,5% este ano.

O Bradesco BBI, por sua vez, aponta que, embora a continuidade do processo de reabertura signifique uma recuperação da demanda, pelo menos até certo ponto já que há algum deslocamento do consumo de bens para serviços, ainda observam-se dificuldades, principalmente devido a gargalos de abastecimento (particulares a cada setor industrial), que deve provavelmente evitar que a produção se recupere aos níveis pré-pandêmicos, pelo menos no curto prazo.

A Rio Bravo também aponta que a perspectiva para a indústria continua negativa nos próximos meses e que os problemas na cadeia de suprimentos devem continuar sendo um gargalo até, pelo menos, meados de 2022, mantendo a fraqueza da atividade econômica.

Nesse cenário, a XP destaca os potenciais impactos para o IBC-Br de agosto, considerado uma prévia do Banco Central para o Produto Interno Bruto (PIB). O indicador será revelado no próximo dia 15 pelo BC e a expectativa é de estabilidade na base mensal e alta de 5% na comparação anual.

Já a estimativa para o PIB divulgado pelo IBGE é de crescimento de 0,5% no terceiro trimestre na comparação com o segundo (ou alta de 4,8% na base anual), impulsionado pela recuperação dos serviços prestados às famílias e pela normalização parcial dos serviços com a reabertura. Contudo, avalia, seguindo os últimos resultados da produção industrial e das vendas no varejo, a XP aponta que tem um viés claramente negativo para a sua expectativa de crescimento do PIB para 2021, atualmente em 5,3% na base anual.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.