Possibilidade de recessão técnica existe, mas emprego, renda e desinflação ainda seguram atividade

Economistas veem sinais fortes de desaceleração da economia no 3° e 4° trimestres, mas com resiliência em alguns setores

Roberto de Lira

(Getty Images)
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O Brasil corre o risco de uma recessão técnica neste segundo semestre de 2023? A possibilidade tem sido citada por economistas desde que a divulgação das pesquisas de indústria, varejo e serviços entre julho e setembro pelo IBGE, além do registro de queda no indicador de atividade IBC-Br pelo Banco Central em agosto. Isso somado às sondagens negativas mais recentes feitas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Embora admitam a possibilidade de dois trimestres seguidos de queda no PIB na segunda metade do ano, os especialistas consultados pelo InfoMoney ponderam que a base de comparação com o início de 2023 é forte e que o mercado de trabalho ainda aquecido, em momento de desinflação, pode trazer surpresas nas contas nacionais.

A desaceleração da economia nos últimos seis meses do ano já era esperada, tanto pelo fato de o PIB ter avançado de maneira consistente até junho como pelo início dos impactos  da política de juros restritiva pelo BC.

Na ata da última reunião do Copom, os diretores do colegiado do BC citaram a desaceleração da atividade em agosto, em particular em serviços, mas fizeram a ponderação que o mercado de trabalho seguia aquecido. “Os dados divulgados no período mais recente sugerem uma perda de dinamismo no setor de serviços após um crescimento maior do que o esperado ao longo do primeiro semestre”, disse o documento.

O Comitê também informou ter notado um cenário de estabilidade na indústria, porém com os setores mais sensíveis ao crédito tendo uma desaceleração mais marcante. “Além disso, também se observa um aumento de estoque em vários setores”, diz o texto.

Já o último Boletim Macro da FGV comentou que a elevada taxa real de juros estava afetando alguns setores da economia, bem como o investimento. Porém, foi comentado que a política fiscal expansionista ainda estava contribuindo para expandir o consumo das famílias.

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A resiliência de parte da economia também pode ser comprovada na divulgação do PMI de serviços de outubro, que se recuperou da queda de setembro e alcançou 51,0, voltando assim ao patamar que indica expansão (acima de 50,0). Com isso, o PMI composto, que agrega serviços e indústria, passou de 49,0 em setembro para 50,3 em outubro, também ficando dentro da zona de expansão pela sexta vez nos últimos oito meses.

Com isso, as projeções de queda da economia no terceiro trimestre, e talvez nos últimos três meses é marginal. A Tendências Consultoria, que ainda não incorporou às suas projeções os dados mais recentes divulgados, trabalha com um possibilidade de queda de 0,2% no Produto Interno Bruto entre julho e setembro e também com um dado negativo entre outubro e dezembro, porém muito próximo a zero.

Thiago Xavier, economista sênior da Tendências, argumenta que, embora o termo “recessão técnica” tenha como definição dois períodos seguidos negativos, é preciso cuidado ao dizer que país enfrenta um risco de recessão de fato.

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Um dos motivos é que o primeiro semestre de atividade econômica foi muito determinado pelo PIB agrícola, com a ocorrência da safra recorde  no 1º tri e com efeitos que se alongaram no trimestre seguinte. “E a gente sabe também que teve um fôlego final de serviços que ajudou no começo do ano”, comenta.

Para ele, mais que o registro das quedas, o que vai prevalecer na análise é saber qual vai ser o tamanho desses dois trimestres negativos, caso ele aconteçam. “A gente está vendo um esfriamento rápido do PIB corrente e dos condicionantes econômicos. Pode ter dois trimestres negativos, mas o mercado de trabalho ainda está com fôlego, está crescendo a renda e o mercado de crédito está se recuperando”, pondera.

Roberto Padovani, economista chefe do BV, também tem uma previsão inicial de que os último dois trimestres de 2023 podem mostrar queda no PIB, uma vez que os indicadores já divulgados apontam nessa linha, mas ele afirma que ainda há dúvidas sobre o desempenho da economia no trimestre final. E um dos motivo é o impacto que programa Desenrola, de renegociação de dívidas, pode trazer para o consumo.

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Por outro lado, o impulso fiscal do início do ano tem perdido força e o crédito continua apertado, o que gera uma natural desaceleração.

Compensação

Gustavo Sung, economista chefe da Suno Research, também tem expectativa que o PIB deve registrar uma queda no 3º trimestre, por conta dos efeitos da alta taxa de juros sobre a economia, o elevado endividamento e a alta inadimplência entre as famílias – fatores que tendem a limitar o potencial de consumo e a demanda por crédito.

Porém, ele alerta que essa queda tende a ser contrabalanceada pelo arrefecimento da inflação, o mercado de trabalho aquecido e o crescimento da massa salarial. “Em nosso cenário, o PIB do 3º trimestre deve registrar uma variação negativa, enquanto os últimos três meses do ano certa estabilidade. Não projetamos recessão técnica no momento. Para 2023, a nossa expectativa é de que o crescimento da economia brasileira projeção seja de 3,1%”, afirma

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Outra economista que afirma esperar uma desaquecimento da atividade na segunda metade do ano é Claudia Moreno, do C6 Bank. “Os últimos dados da PMC (varejo) e PMS (serviços), especialmente de agosto, vieram bem fracos. Isso corroborou o cenário de uma desaceleração forte no segundo semestre”, explica.

O C6 Bank tem hoje uma projeção de queda de 0,1% tanto para o PIB do terceiro trimestre quanto para o quarto trimestre. “Então, aumentou a chance de a gente ver uma recessão técnica. Mas é importante lembrar que esses números são marginalmente positivos e qualquer surpresa que tiver pode mudar, principalmente o dado para o 4º tri, para o qual tem pouca informação”, suaviza.

Segundo ela, mesmo que não venha uma recessão técnica, a atividade vai registrar uma boa desaceleração. “Isso vai chamar a atenção e talvez o governo foque preocupado, mas para o ano que vem a atividade volta a crescer, já a partir do 1º trimestre. Não vai crescer muito, mas será perto de 1,5% (o PIB anual).”