Para economistas, Copom poderia ter sido mais incisivo sobre possível alta da Selic

Especialistas argumentam que balanço de riscos mostrado pelo BC ficou mais assimétrico, com mais fatores de alta para a inflação; mas comunicado evitou deixar explícito que Selic mais alta é uma possibilidade

Roberto de Lira

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O Comitê de Política Monetária (Copom) tomou a decisão esperada, de manutenção da Selic em 10,50% ao ano. E também conservou o tom mais duro (“hawk”) de última reunião. Mas economistas alertaram que pode ter faltado uma sinalização mais firme por parte da autoridade monetária de que ela poderá agir do lado mais contracionista, subindo os juros, caso as expectativas de inflação piorem ainda mais.

Sobre se tom do Copom foi mais duro ou não, Rachel de Sá, estrategista de investimentos da XP, afirmou em live do InfoMoney no Youtube que essa avaliação é bem relativa.

“Se colocar em relação ao último [comunicado], ele foi mais ‘hawk’. O balanço de riscos não tinha indícios de ser assimétrico. O de hoje, apesar de não estar explícito, adiciona dois  novos riscos”, disse Rachel, destacando os impactos da variação da taxa de câmbio e citações mais firmes da política fiscal expansiva.

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Ela lembrou que a curva de juros já está precificando uma alta de 90 pontos-base este ano. Ela afirmou que, talvez, o BC devesse ter deixado uma porta mais claramente aberta sobre a possibilidade de a política ficar mais restritiva.

Luis Cezário, economista chefe da Asset 1, argumentou nessa mesma linha. Ele avaliou que o Copom preferiu reagir à piora do cenário alongando o período de manutenção da Selic, mas ele considerou essa estratégia arriscada.

“Com as projeções do modelo do BC permanecendo acima do centro da meta em um horizonte superior a 18 meses, a sinalização de juros parados por mais tempo pode agravar a atual dinâmica de desancoragem das expectativas e depreciação da taxa de câmbio caso seja entendida como uma estratégia insuficiente para mitigar os crescentes riscos inflacionários”, advertiu.

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Na sua avaliação, a piora das perspectivas futuras da inflação recomenda que o Banco Central se prepare para voltar a subir a taxa de juros nos próximos meses.

Cezário frisou que a política fiscal expansionista praticada pelo governo tem elevado o risco de inflação por dois canais. Em primeiro lugar, o aumento dos gastos do governo e das transferências de renda têm impulsionado a demanda doméstica, atuando contra o aperto monetário implementado pelo BC.

O outro canal é que o aumento do prêmio de risco gerado pelas crescentes preocupações com a sustentabilidade da dívida pública tem contribuído para aumentar as expectativas de inflação e depreciar a taxa de câmbio.

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“Além disso, notamos que a economia já opera acima do seu potencial. Desta forma, entendemos que o Copom precisará aumentar o grau de aperto da política monetária se quiser concluir com êxito o seu objetivo de reduzir a inflação para 3.0%, que é o centro da meta definida pelo CMN”, argumentou.

Para o economista, protelar o ajuste, “que se revela necessário”, provavelmente levará a um cenário com inflação mais elevada e um aperto monetário maior no futuro.

Para Rafaela Vitória, economista chefe do Inter, que ainda acredita na manutenção da Selic no atual patamar por um período prolongado, uma eventual alta de juros poderia ser considerada caso ocorra uma reaceleração da inflação e piora nas expectativas, o que poderia ser resultado de nova deterioração fiscal, como revisão das metas e impacto no câmbio.

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“Por outro lado, uma retomada dos cortes em 2025 continua no radar, caso o governo volte a apresentar controle do crescimento de gastos públicos, em linha com o cumprimento da meta fiscal, o que iria beneficiar a trajetória de desinflação, bem como aliviar o prêmio de risco nos ativos, incluindo o câmbio.”

Rafael Yamano, economista da SulAmérica Investimentos, também citou que, no comunicado, o balanço de riscos ficou assimétrico, com mais riscos de a inflação ficar mais alta do que mais baixa. “Dentre os riscos destaca-se a adição do risco de a taxa de câmbio ficar mais depreciada, que foi adicionado nessa reunião”, destacou.

“ Apesar do balanço de riscos ter ficado assimétrico, acreditamos que o comitê deve seguir mantendo a taxa de juros estável em 10,50% na próxima reunião, com uma decisão pela alta ocorrendo apenas se as expectativas de inflação no Relatório Focus ultrapassarem 4,0% para 2025 e se a taxa de câmbio depreciar além de R$ 5,80. Mas essa probabilidade de alta aumentou em relação à comunicação que estava sendo feita pelo Copom”, comentou.

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Para Leonardo Costa, economista do ASA, o comunicado do Copom pode ser até considerado mais brando do que o esperado por alguns agentes de mercado, que acreditavam que o Banco Central poderia sinalizar um aumento da taxa básica para as próximas reuniões.

Após a linguagem mais neutra na comunicação, o ASA mantém sua projeção de manutenção da taxa em 10,50% até o final de 2024, mas coloca um viés de alta para a estimativa de 9,50% para o final do ano que vem. O motivo é a resistência dos núcleos de inflação em nível elevado e a piora do cenário para emergentes, especialmente para o Brasil.

“O comunicado também sinaliza a necessidade de maior vigilância caso haja persistência das expectativas de inflação acima da meta”, destaca Costa.

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Igor Campos, gerente de portfólio de renda fixa da Gauss Capital também lembrou que havia uma parcela que acreditava que o Copom sinalizaria uma assimetria altista em seu balanço de risco.

“O que não ocorreu e pode trazer um viés um pouco mais ‘dovish’ em relação à expectativa. Mas vejo isso de forma mais marginal. O Copom seguiu uma postura ‘hawk’, que condiz com a manutenção da Selic em patamar restritivo por um longo período de tempo.”