Para analistas, ata do Copom teve tom mais duro sobre situação fiscal do que o comunicado do BC

Especialistas citaram ainda o risco ‘parafiscal’, expressão usada para definir o crédito subsidiado por bancos públicos

Roberto de Lira

(Getty Images)
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O recado mais duro sobre os riscos fiscais que os analistas e economistas esperavam do Banco Central no comunicado divulgado após a reunião do Copom na semana passada apareceu nesta terça-feira (13), na divulgação da ata do encontro. Desta vez, os especialistas destacaram que o tom subiu, especialmente porque foram citados os efeitos que uma conduta irresponsável sobre os gastos públicos podem trazer para os preços dos ativos e as expectativas de inflação.

Há uma semana, após anunciar que manteria a Selic em 13,75% por mais tempo, o Copom passou um recado de que iria acompanhar com “especial atenção” os desenvolvimentos futuros da política fiscal e que iria se manter vigilante. Segundo avaliação da Levante Investimentos, a mensagem hoje da ata não poderia ter sido mais explícita.

“O Copom deixou de meias palavras e foi direto ao ponto: governos que plantam gastos excessivos colhem inflação, com todas as suas consequências negativas”, afirmou a corretora em seu “morning call”.

A Ata começa com a habitual avalição do cenário internacional. Poucas novidades aqui, exceto um aumento da atenção para o “cenário desafiador” para a economia chinesa e para a inflação global, que deverá manter os principais bancos centrais na defensiva, praticando políticas monetárias restritivas.

Ante destaca que o BC elevou marginalmente suas projeções de inflação para 2022 (6,0%), 2023 (5,0%) e 2024 (3,0%) após as tradicionais análises sobre a economia brasileira e a global, mas que foi nos parágrafos sobre a política fiscal que o Copom externou sua maior preocupação atual. Foram citados efeitos diretos na demanda agregada, nos preços de ativos, no grau de incerteza na economia, nas expectativas de inflação e na taxa de juros neutra. “Tradução: se gastar demais, e mal, o governo vai obrigar o Banco Central a seguir elevando os juros”, diz a Levante.

O Comitê também avaliou que mudanças em políticas parafiscais ou a reversão de reformas estruturais que levem a uma alocação menos eficiente de recursos podem reduzir a potência da política monetária.

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Esse ponto da ata foi destacado pelo economista Silvio Campos Neto, da Tendência Consultoria, em sua conta no Twitter. “Chama a atenção a volta da menção ao termo ‘parafiscal’, muito usado no passado para se referir à montanha de crédito subsidiado por bancos públicos. Mesmo que em volumes menores, este será mais um, de muitos retrocessos na gestão da economia”, afirma.

Para o Goldman Sachs, a ata foi mais “hawkish” que o comunicado. “A deterioração das projeções condicionais de inflação para 2023 e o fato de o Copom estar agora muito focado nas perspectivas de política fiscal e parafiscal altamente incertas indicam que o BC provavelmente resistirá fortemente ao afrouxamento prematuro da política monetária”, comentou o banco de investimentos.

Para o banco, o cenário mais provável é que o Copom seja estável e paciente e mantenha a taxa básica de juros na atual postura monetária significativamente restritiva por algum tempo. “Consequentemente, esperamos que o Copom espere até o final do segundo trimestre de 2023, ou possivelmente o terceiro trimestre, para começar a cortar as taxas”, disse o Goldman Sachs em relatório.

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Para o Goldman Sachs, no entanto, o risco de que a Selic tenha que subir ainda mais nos curto prazo (em até seus meses) ainda é baixo.

Alertas

Tatiana Nogueira, economista da XP Investimentos, afirma que o documento trouxe o mesmo sinal do comunicado pós-reunião: o ajuste monetário já feito parece suficiente para trazer a inflação para a trajetória de metas, mas se a convergência não ocorrer como o esperado, principalmente por conta dos riscos fiscais, o Copom não descartar mais aperto à frente.

A economista destacou a discussão do colegiado sobre a velocidade da desinflação global e que foram levantadas dúvidas sobre o ritmo do processo daqui em diante. Segundo a ata, “alguns membros notaram o movimento benigno de commodities em reais, ressaltando riscos de queda adicional à frente. Outros membros enfatizaram o caráter volátil desses preços em ambiente de estoques pressionados.”

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“Na nossa visão, a ata traz elementos ‘hawkish’ em relação ao comunicado da semana passada e reforça nossa leitura de que o aumento do risco fiscal pode comprometer a convergência da inflação no médio prazo e exigir uma postura dura do comitê”, comentou Tatiana. No entanto, “por enquanto”, a XP não vê a taxa Selic se movimentando tão cedo. “Esperamos que a taxa Selic permaneça em 13,75% até o primeiro trimestre de 2024.”

Já o Bradesco também entende que a ata reiterou que o cenário base do Comitê ainda não possibilita a reversão do patamar restritivo da política monetária dentro dos próximos meses.

Andressa Durão, economista da ASA Investments, por sua vez, esperava que o Comitê fosse engrossar ainda mais o tom em relação ao risco fiscal. “Mas o BC apenas explicou como está avaliando esse cenário e não explicitou um aumento do risco, então a ata não trouxe muita novidade nesse sentido”, avaliou.

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A economista mantém a percepção de que o BC está sendo, na verdade, até “dovish” em relação ao aumento do risco. Ela disse que não acredita mais em queda de juros no ano que vem. “O próximo movimento é de alta”, previu.

Serenidade

Para o Itaú, a ata trouxe alertas importantes sobre o potencial impacto do aumento dos estímulos fiscais sobre a economia e sobre o cenário prospectivo de inflação.

“Embora as autoridades enfatizem que vivemos um momento particularmente incerto, que exige uma postura especialmente serena, seu texto indica que o Copom monitorará o potencial impacto de gastos extrafiscais sobre a demanda agregada, os preços dos ativos (leia-se o real) e as expectativas de inflação, principalmente para 2024”, afirma relatório assinado pelo economista chefe Mario Mesquita.

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Para o Itaú, não é improvável que as expectativas de inflação para 2024, atualmente em 3,5%, aumentem nas próximas semanas, mas isso não deve levar o Copom a movimentar as taxas no curto prazo. “As autoridades ainda parecem apegadas à estratégia de ‘alta por muito tempo’ delineada nos últimos meses”, diz o relatório.

“Por ora, esperamos que o Copom inicie um ciclo de flexibilização a partir de agosto de 2023 (com a Selic encerrando o ano em 11,00% aa), após vários meses de inação. Mas o excesso fiscal pode levar o Copom e os participantes do mercado, como nós, a rever esses planos.”