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O comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) que se seguiu à decisão da quarta-feira de elevar a taxa básica de juros (Selic) em 1 ponto percentual, para 13,25% ao ano, trouxe pistas de que o BC já enxerga sinais de uma desaceleração da economia, mas as expectativas de inflação continua, fora de prumo, o que impede um projeção de até quanto a taxa pode ir. Os economistas acreditam numa Selic em torno de 15% por um período ainda longo e recomendam ações no campo fiscal para dar mais efetividade à política monetária.
Como explica Mayara Oliveira, economista na Droom Investimentos, ao adotar uma política monetária contracionista, o BC gera impactos diretos sobre a economia. O encarecimento do crédito desestimula o consumo e os investimentos, reduzindo a pressão sobre os preços, ao mesmo tempo em que há uma redução na circulação de dinheiro, tornando o crédito mais caro e desacelerando o crescimento da demanda.
“A redução da demanda agregada contribui para frear a alta dos preços, ajudando a manter a inflação dentro da meta”, explica.
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Para Mirella Hirakawa, coordenadora de pesquisa da Buysidebrazil, o tom da comunicação do BC, especialmente no trecho do balanço de riscos, veio de neutro a “dovish”, principalmente por dois pontos. Um deles é a ausência de comunicação de preocupações adicionais em relação ao atual processo de desancoragem das expectativas, acentuado na divulgação do Focus dessa semana.
O outro é quando é colocado dentro do que seriam riscos baixistas para a projeção de inflação a atividade econômica doméstica – anteriormente o BC usava um risco de atividade econômica global.
Sobre o “orçamento total”, ou o patamar de juros ao final do ciclo de alta, Mirella recomenda observar as projeções de inflação divulgadas nesta quarta-feira. “Tivemos as projeções para 2025 com uma surpresa altista em relação às estimativas”, diz, lembrando que a projeção agora é de 5,2% para 2025, ante 4,5% no último Relatório Trimestral de Inflação.
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Para o terceiro trimestre de 2026, a estimativa passou de 3,8% para 4,0%, em linha com a expectativa da Buysidebrazil. “O que o BC está falando para a gente é que a Selic terminal em 15% não é suficiente para ancorar as expectativas, colocando um risco altista para os patamares de taxa de juros”, diz.
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Ela lembra que, com o novo regime de metas de inflação, com uma prestação de contas contínua, se o BC não cumpre a meta por seis meses consecutivos, tem que escrever uma carta aberta para o Ministério da Fazenda, explicitando os motivos. “Essas projeções indicam que o BC escreveria essa carta aberta no dia da divulgação do IPCA de junho, que será divulgado no dia 10 de julho”, alerta.
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Para Ariane Benedito, economista-chefe do PicPay, a intensidade do ciclo de aperto monetário a partir de maio dependerá da evolução da inflação, com atenção especial aos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, além das projeções e expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos.
“Nosso cenário prevê a continuidade da pressão inflacionária, impulsionada pela prolongada depreciação cambial, pelos desafios da política fiscal e pela manutenção do ritmo aquecido da atividade econômica no primeiro semestre de 2025. Dessa forma, consideramos coerente que o Banco Central mantenha o ciclo de altas além dos 2,0 p.p. já previstos, garantindo o alívio inflacionário e a convergência da inflação para a meta”, recomenda.
Ajustes estruturais
Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, diz acreditar que os juros precisam ir a 15,50% para efetivamente começarem a trazer impacto na atividade econômica, no mercado de trabalho e, consequentemente, na inflação. “O único fator capaz de mudar esse cenário seria realizar ajustes estruturais que possibilitassem o reequilíbrio das contas públicas para frear o crescimento do déficit”, recomenda.
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Para ele, muito provavelmente já no 2º trimestre poderão começar a ser vistos sinais mais claros de uma atividade econômica em desaceleração e a inflação sentido os efeitos das altas de juros. Isso, segundo ele, permitirá o mercado a fazer melhores projeções de quando será o fim do ciclo de alta da Selic. “Este está sendo o grande ponto de divergência nas projeções do mercado”, diz.
Felipe Salles, economista chefe do C6 Bank, lembra que o BC está projetando uma inflação de 4% no 3º trimestre de 2026, que é o horizonte relevante de política monetária, e isso com uma Selic chegando a 15%.
“De acordo com o modelo do BC, a taxa Selic a 15 parece que não é suficiente para trazer a inflação para meta no horizonte relevante. Isso deixa implícito a possibilidade de altas de juros nas reuniões subsequentes que leve a Selic para um valor acima desse patamar”, afirma.
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Rafael Cardoso, economista-chefe do Departamento de Pesquisa Econômica do Banco Daycoval, na comunicação houve uma alteração no trecho que cita o balanço de riscos para a inflação, ainda que tenha permanecido a assimetria de alta.
“No risco baixista, ele coloca uma possibilidade de desaceleração da economia doméstica. Antes, esse risco baixista era em relação à economia global. Ele [Copom] troca um risco que era mais indireto por um risco mais direto. Traz um viés um pouco mais ‘dovish’.”
Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, concorda que houve mudança na leitura dos dois riscos de baixa que o Copom estampou em seu comunicado. O doméstico, destaca, passou a citar impactos sobre o cenário de inflação de uma eventual desaceleração da atividade econômica mais acentuada do que a projetada, o que indica uma preocupação com o impacto do nível atual de juros na economia.
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Já o externo foi descrito como um cenário menos inflacionário para economias emergentes decorrente de choques sobre o comércio internacional e sobre as condições financeiras globais. “Esse último é interessante porque mostra o BC preocupado não apenas com os riscos inflacionários da política tarifária de Donald Trump, mas também com seus possíveis efeitos deflacionários”, comenta.
Monetário e também fiscal
Para Bruno Corano, economista da Corano Capital, a questão agora é se perguntar até onde o aumento de juros vai ser capaz de conter os ânimos e “resolver algo que inevitavelmente cabe ao fiscal”.
Essa também é a defesa que faz Felipe Queiroz, economista-chefe da Associação Paulista de Supermercados (Apas). “O controle inflacionário seria mais eficiente se houvesse a adoção de um conjunto de medidas econômicas e não apenas a calibragem da taxa de juros.
Em comparação, ele lembra que a própria decisão do Fed (o banco central americano) desta quarta-feira, que optou por manter a estabilidade de sua taxa de juros, “indica que o atual cenário demanda maior parcimônia em relação ao ciclo de alta dos juros para não afetar o nível de atividade econômica norte-americana”.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que criticou com firmeza a decisão de ontem, o Banco Central mostrou que continua ponderando equivocadamente os fatos econômicos mais relevantes do cenário atual, principalmente no que diz respeito ao quadro fiscal e à desaceleração da atividade do país.
O presidente da entidade, Ricardo Alban, o BC não considera com o peso correto a desaceleração da atividade econômica, observada já no PIB do terceiro trimestre de 2024, e mantida nos dados parciais do último trimestre, até novembro.
Ele sugere um pacto nacional, que envolva todos os Poderes, empresários e trabalhadores, pela criação de um consenso em torno de metas fiscais e de políticas econômicas estruturantes, garantindo estímulos seletivos que assegurem a continuidade dos investimentos, enquanto se busca o equilíbrio das contas públicas e o combate à inflação.
“ A busca pela disciplina fiscal deve vir acompanhada de medidas de incentivo à inovação, à infraestrutura, à educação e à tecnologia, garantindo uma elevação do PIB no médio e longo prazo, gradual e sustentada”, diz a entidade em comunicado divulgado na noite de quarta-feira.