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Nem Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nem Jair Bolsonaro (PL) devem fazer alguma “loucura” fiscal a partir do ano que vem – como uma explosão de despesas – quando começar o próximo mandato do presidencial. Segundo analistas de mercado e economistas ouvidos pelo InfoMoney, isso não vai acontecer porque os adversários terão alguma espécie de “surto” de responsabilidade com os gastos federais. O que vai imperar, dizem, é a dura realidade dos números.
O próprio Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para 2023 enviado em agosto pelo governo ao Congresso já prevê um déficit primário para o ano que vem estimado em R$ 63,7 bilhões, o equivalente a 0,62% do PIB.
Já seria ruim, mas pode piorar. Afinal, a proposta tem como premissa uma elevação do Produto Interno Bruto em 2,5% ante 2022, quando o mercado financeiro projeta um crescimento de cerca de 0,5%. Isso aponta para uma previsão de arrecadação que pode estar inflada. A projeção oficial é de R$ 1,805 trilhão de receita líquida no ano que vem.
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Mais despesa
No campo dos gastos, o quadro é mais desafiador. O PLOA cita uma projeção de R$ 1,868 trilhão de despesa total, conta que desconsidera itens cuja discussão foi colocada para a frente e que podem totalizar R$ 434 bilhões, num cálculo recente feito pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas.
Uma dessas contas não contempladas é a provável manutenção do valor reajustado do Auxílio Brasil, que foi a R$ 600 em 2022. Na proposta, considera-se o valor total do programa em R$ 106 bilhões, o que inclui um benefício médio de R$ 405 reais para 21,6 milhões de famílias. Contudo, há a promessa, por parte dos principais candidatos à Presidência, de manutenção do valor de R$ 600 em 2023, o que aumentaria o gasto do ano que vem em cerca de R$ 52 bilhões.
Bráulio Borges, economista sênior da LCA Consultores e pesquisador associado do Ibre/FGV, destaca que, independentemente de quem vença a disputa presidencial, o valor maior deverá ser mantido, talvez até com ampliação do número de famílias contempladas. Só a mais nova promessa de Bolsonaro, de conceder uma espécie de 13° salário para mulheres dentro do programa de auxílio, pode levar a conta para algo entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões adicionais por ano, calcula.
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A isso vão se somar ainda o reajuste para servidores públicos, os precatórios já previstos para 2023, o remanejamento de verbas para viabilizar o pagamento do piso salarial de enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteira, a Lei Aldir Blanc 2 (de incentivos culturais) e a prometida promessa de correção da tabela do IRPF. Só com esses itens, a conta não prevista no texto passa dos R$ 150 bilhões.
Menos receita
Na ponta da receita, também há problemas. Um exemplo é a manutenção da desoneração de PIS, Cofins e Cide sobre gasolina, etanol, gás veicular, diesel, gás de cozinha e querosene de aviação, que deve representar uma renúncia de arrecadação estimada em R$ 50 bilhões por ano.
E as novidades não param. Na semana passada, Bolsonaro prometeu que a Caixa Econômica Federal vai anunciar um programa de perdão de até 90% das dívidas para 4 milhões de pessoas. Lula, por sua vez, acena com o reajuste da tabela do Imposto de Renda.
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Mesmo com os alertas de economistas, os candidatos à Presidência da República adotam a estratégia de manter uma atitude eleitoral mais pragmática, sem marcar compromissos formais com a responsabilidade fiscal, comenta Simão Silber, economista e professor da FEA-USP. “Os dois estão escondendo o jogo porque podem perder votos”, diz, lembrando que um parcela considerável do eleitorado deseja ampliação de auxílios e corte de impostos.
As dúvidas e desarranjos mexem nos cálculos de quem tem como função se debruçar sobre a sustentabilidade fiscal. Segundo o último relatório de acompanhamento da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, o resultado primário brasileiro sairia de certa neutralidade (superávit de 0,1% do PIB em 2022) para um déficit de 0,9% do PIB no ano que vem. “O PIB pode melhorar pelo impacto sobre a demanda, isto é, sairia de 0,6% para um crescimento de 1,0% no cenário com as medidas previstas no PLOA”, pondera Vilma Pinto, diretora da IFI.
‘Ataque especulativo’
O reflexo do “ataque especulativo” ao Orçamento será inevitavelmente uma tendência de alta na dívida pública. Bráulio Borges estima que o Brasil vai fechar 2022 com uma relação dívida/PIB de 78%, mas que a conta vai dar uma salto de quatro porcentuais no ano que vem, para 82%. Muito em função desses gastos e perdas de receitas que são anunciados como temporários e que acabam se tornando permanentes.
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Nem mesmo o cenário externo pode trazer algum alento, no sentido que as contas externas possam dar uma contribuição. A economia global tem desacelerado, os sinais de uma recessão nos Estados Unidos e na Europa são cada vez mais claros e a política de juros altos praticada pelo Fed para deter a inflação local tende a levar o fluxo financeiro para lá.
Ao mesmo tempo, discute-se como reformar as regras de ancoragem fiscal do País, para permitir que o governo federal tenha alguma flexibilidade para gastar em momentos críticos, como ocorreu durante a pandemia de covid-19. Mais uma vez, o risco é permitir que soluções temporárias se tornem problemas permanentes.
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