O Novo PAC e o risco do gargalo do licenciamento ambiental

Só em projetos de infraestrutura, Ibama tem mais de 2,2 mil projetos em fase de estudos para obtenção de licenças ambientais

Roberto de Lira

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O chamado Novo Programa de aceleração do Crescimento (PAC), lançado em agosto pelo governo federal e que prevê R$ 1,4 trilhão de investimentos públicos e privado no País até 2026 (com acrescimento de outros R$ 320,5 bilhões após essa data) e com cerca de 12,5 mil obras estimadas em mais de 4 mil municípios, pode esbarrar no conhecido gargalo do licenciamento ambiental.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (Ibama), o principal órgão de fiscalização ambiental do país tem enfrentado anos de um quase sucateamento, com um número cada vez menor de servidores, especialmente os técnicos, que mal dão conta dos cerca de 3 mil processos de avaliação de todo os portes que entram todos os anos na fila para aprovação.

Em audiências recentes no Congresso Nacional, o presidente do órgão, o ex-deputado federal Rodrigo Agostinho, lembrou que o Ibama, que já teve 6 mil servidores, hoje trabalha com um contingente próximo de 2,7 mil. O número de fiscais, por exemplo, recuou de quase 2 mil para menos de 400. No final de agosto, foi iniciada uma expansão, com a convocação de 257 candidatos aprovados num concurso de 2021, sendo 100 analistas ambientais.

Isso pode ser insuficiente até para resolver o atual problema da fila de pedidos de licenças ambientais. Um levantamento feito pela diretoria de Licenciamento Ambiental (Dilic) do Ibama a pedido do InfoMoney contabilizou 2.225 empreendimentos à espera de licenciamento ambiental apenas em grande áreas de infraestrutura como rodovia, ferrovias, energia elétrica e petróleo (veja abaixo).

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse numa audiência sobre o polêmico projeto de exploração pela Petrobras da Margem Equatorial da Amazônia que, em 2010, havia uma média de 2,5 projetos de licenciamento para cada funcionário do Ibama e que, hoje, esse número está 14 por servidor. Fruto de uma vacância de 43% dos cargos no órgão.

Claro que isso gera um tempo maior para a obtenção das licenças, uma das críticas mais antigas dos empreendedores. Associações e confederações industriais têm estudos apontando um prazo entre um e dois anos para a conclusão de um licenciamento, mas o Ibama aponta ser difícil estimar esses prazos, que dependem de muitas variáveis e dos atores envolvidos.

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O órgão destaca, por exemplo, que um empreendimento que atravessa território indígena, necessita de uma manifestação da Funai. E se alguma Unidade de Conservação Federal for sofrer qualquer impacto, será preciso trabalhar com o gestor da Unidade, sempre consultando o IPHAN. O mesmo vale para o Incra, no caso de comunidades quilombolas serem impactadas. Isso sem contar com alguma judicialização envolvida no processo de licenciamento.

No entanto, em empreendimentos em que o setor tem uma regulamentação efetiva e que os estudos ambientais cumprem com as determinações do Termo de Referência emitido pelo Ibama, o licenciamento ocorre de modo mais célere e com menos judicialização.

Um exemplo citado pelo órgão é no setor de transmissão de energia elétrica. Uma auditoria feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) comprovado que, em 75% dos processos nessa área, o Ibama cumpriu com os prazos legais de licenciamento ambiental.

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A simplificação do processo de licenciamento é uma das soluções apresentadas e ela está inclusive citada entre os objetivos do Novo PAC. Mas há uma forte divergência entre governo e oposição e entre setores indústrias e ambientalistas sobre como tornar o processo mais ágil sem causar riscos de uma acelerada degradação ambiental.

Projeto de Lei

Tramita no Senado o Projeto de Lei 2159/2021 (conhecido como “Lei Geral do Licenciamento Ambiental”), que tenta atenuar as regras existentes. O texto foi aprovado pela Câmara há dois anos, ou seja durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) e num contexto de fortes críticas até internacionais sobre a leniência na fiscalização de crimes ambientais.

O texto que passou pelo deputados trouxe mudanças polêmicas como a retirada de exigência de licença ambiental obras de saneamento básico, de manutenção em estradas e portos, de distribuição de energia elétrica com baixa tensão, e outras que seriam de porte insignificante pela autoridade licenciadora.

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Também é permitida a renovação automática da licença ambiental a partir de declaração on-line do empreendedor e há possibilidades de prorrogação automática da licença origina, além de redução de consultas a órgão como o ICMBio.

Ambientalistas, como o coordenador de Política Pública do WWF Brasil, Raul Valle, elogiou a tentativa de redução de burocracias no projeto, mas ele alertou para vários problemas do Projeto durante uma audiência conjunta das Comissões de Agricultura e de Meio Ambiente do Senado.

Uma delas é a maior autonomia aos Estados para definir o que deve ou não deve ser licenciado e qual o formato de licenciamento. “Nós poderemos ter tranquilamente 27 regras diferentes no Brasil. Não faz sentido que uma indústria siderúrgica seja licenciada em um estado, e não seja em outro. Isso fere o princípio federativo e vai levar a uma guerra ambiental: estados vão começar a competir para dispensar licenciamento, e você passará a ter a alocação de empreendimentos da pior forma possível”, explicou à Agência Senado.

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Já o Instituto Socioambiental e o Observatório do Clima divulgaram recentemente uma nota técnica com uma série de críticas ao projeto, entre elas a existência no texto de um impreciso critério de baixo potencial de impacto ambiental. “Quem define o que é ‘baixo impacto’?”, pergunta a nota.

As entidades dizem que o artigo 4° do PL, aponta que cada “ente federado”, ou seja, cada estado e município pode simplesmente decretar que, aterros sanitários, barragens de rejeitos ou uma indústria qualquer são de baixo impacto. Assim elas defendem que haja uma lista mínima federal com os empreendimentos que estarão sujeitos ao licenciamento.

Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), por outro lado, é exatamente o excesso de regulação sobre empreendimentos e atividades de baixo impacto ambiental que acarreta o aumento de fluxo de trabalho e, consequentemente, a morosidade na atuação das agências licenciadoras.

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Outro motivo de atraso para a liberação das licenças ambientais que a legislação tende a eliminar é a insegurança jurídica para os servidores públicos, em virtude possibilidade de responsabilização penal pelo Ministério Público, com base na Lei dos Crimes Ambientais.

A CNI defende a simplificação do processo como está definida no projeto que veio da Câmara. O chamado procedimento trifásico, que inclui a Licença prévia (LP), a Licença de Instalação (LI) e a Licença de Operação (LO) continuaria a ser válido para os empreendimentos mais complexos e com risco ambiental mais elevado.

Já os projetos mais simples poderão ser avaliados de forma simplificada, nas modalidades bifásica (LP/LI) (LI/LO) ou na Licença de Fase Única (LAU).