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O dado do IPCA de maio, de inflação de 0,23% na leitura mensal, vindo abaixo até do piso das previsões do mercado, não só confirma a tendência de desinflação como aponta para um cenário de queda nas expectativas e dá ao Banco Central argumentos para preparar um início de queda de juros a partir de agosto, dizem analistas. E a inflação de 12 meses abaixo de 4% (3,94%) pode trazer uma contribuição melhor em termos de inércia nos meses à frente.
A inflação oficial do mês teve avaliação positiva dos economistas sob vários aspectos, desde a variação moderada nos preços moderados dos alimentos e bebida (0,16%), passado pelas quedas nos grupos Transportes (-0,57%) e Artigos de Residência (-0,23) até na medidas de serviços e núcleos que, embora ainda altas, voltaram ao campo da desinflação após dados ruins em abril.
Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, destacou que a inflação anualizada de 3,94% é a menor desde outubro de 2020. Na abertura dos números, ela comentou que, além de uma queda maior na inflação de alimentos, a variação dos serviços também desacelerou e ficou negativa em -0,06%, puxada pelas passagens aéreas. Mesmo excluindo esse item, a inflação de serviços foi de 0,26%, citou.
Outro ponto destacado pela economista foi a média dos núcleos – muito observada pelo BC para definir a política monetária, que recuou de 0,51% em abril para 0,36% em maio. A média móvel dos últimos 3 meses ficou em 5,4% anuais, voltando a mostrar tendência de queda, pontuou.
“Outra boa notícia foi a menor difusão em 56%. Os dados em conjunto indicam uma desaceleração nos reajustes de preços mais disseminada, mesmo com a queda mais acentuada dos preços de combustíveis, o que é uma boa notícia para a política monetária”, comentou Rafaela.
Ela não acredita que a tendência de desinflação observada nos últimos meses seja indicativo para o Copom iniciar os cortes de juros em sua reunião de junho, uma vez que o comunicado anterior da autoridade monetária não abriu espaço para essa discussão.
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“A próxima reunião deverá indicar essa mudança de rumo e abrir espaço para o início dos cortes em agosto, que podem começar em 50 pontos-base e ter um ritmo mais acelerado que espera o mercado”, afirmou a economista do Inter.
Mirella Hirakawa, economista da AZ Quest, concorda que mesmo a leitura qualitativa do indicador de maio é insuficiente para o BC mudar de posição no curto prazo. “A inflação corrente é apenas um dos fatores que o BC monitora. O mais importante para ele são as expectativas”, ponderou.
Segundo o Boletim Focus divulgado na segunda-feira (5), a mediana das projeções de IPCA para 2024 e 2025 ainda estão em 4%, ante meta de inflação de 3%, ou seja, ainda desancoradas.
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Ainda assim, Mirella argumenta que a surpresas da inflação corrente têm impactos nas expectativas e que ainda há outros fatores positivos a serem considerados, como choques de confiança benignos que devem vir da aprovação do arcabouço fiscal, do início da discussão da reforma tributária no Congresso e da confirmação da meta de inflação na reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) em junho. “Essa surpresa de inflação para baixo deve corroborar para as expectativas de inflação voltarem a ancorar”, reforçou.
Embora a economista da AZ Quest veja chances mínimas para um corte de juros já neste mês, ela disse acreditar em espaço para alguma suavização na comunicação oficial do BC após sua decisão de política monetária. “O BC ainda se encontra dependente dos dados que vão ser divulgados, dos fluxos de informação e dos choques de confiança dessas janelas até a reunião de agosto. Nossas projeções, por hora ainda são de início de corte de juros a partir de agosto.”, previu.
Sobre o dado de maio do IPCA, Mirella destacou uma “surpresa relevante” em itens administrados, especialmente concentrada em gasolina e em produtos farmacêuticos. Nos preços livres, ela comentou que a surpresa em alimentos não veio dos hortifrútis – um componente mais volátil e de ciclo curto – mas da proteína animal.
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Outro destaque apontado por ela foi a medida do núcleo de serviços subjacentes, que exclui alimentação fora do domicílio. Ele saiu de 7,3% em abril para 6,8% no número de maio, mostrando uma desinflação muito relevante.
Difusão menor
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, comentou que a inflação de 3,94% em 12 meses reduz a inércia para os próximos períodos e ajuda do BC a decidir sobre a redução de juros a partir de agosto.
Nas diversas medidas de cálculo do indicado, ele chamou a atenção para a melhora no índice de difusão, ficou em 55,97% em maio, reduzindo bastante em relação a abril, quando ficou em 66,5%.
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Ele chamou a atenção para a alta de apenas 0,10% nos preços livres, após variação de 0,66% em abril, o que reforça a questão da demanda mais moderada. Em relação aos monitorados, houve também uma redução, de 0,86% em abril para 0,71% em maio.
Nesse ponto, o principal destaque foi o setor de Transportes (-0,57%), por conta da queda de combustíveis, ainda que tenha havido reajuste para cima no preços de transporte urbano. Outro destaque citado por Agostini foi a variação de -0,23% nos Artigos de Residência, muito por conta da alta moderada de 0,16% nos Alimentos e bebidas
Por outro lado, Habitação refletiu o reajuste de preços de energia elétrica e teve uma ligeira alta em maio de 0,67% em relação a abril (0,48%). “Mas são reajustes pontuais”, ponderou.
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O economista da Austin reconheceu que a inflação do setor de serviços ainda segue alta, mas destacou a perda de força em abril, puxada pela forte queda nas passagens aéreas. Os serviços subjacentes, por sua vez, recuaram de 0,56% para 0,38% entre abril e maio.
Agostini disse que a surpresa positiva da inflação de maio deve motivar revisões para baixo nas projeções de inflação do Focus, que está em 5,69% para 2023. A Austin já fez sua revisão, baixando a projeção de 5,80% para 5,50%
“Para junho, a expectativa é que o IPCA apresente uma alta ao redor de 0,15%, muito próximo de zero. Dependendo dos preços de alimentos, pode ser até que o indicador fique no terreno negativo”, alertou.
André Fernandes, head de renda variável e sócio da A7 Capital, também acredita que o IPCA de maio reforça que o Banco Central começa a ter cada vez mais espaço para iniciar o corte da Selic, algo que já vem sendo precificado na curva de juros. “O meio da curva hoje após a divulgação do IPCA cai em média -0,38%, já indicando uma taxa de juros abaixo de 11% em junho de 2025”, comentou.
Para ele, o corte de juros por parte do BC se dará entre agosto e setembro, desde que o Federal Reserve pare de subir os juros em sua reunião de junho.
Ariane Benedito, economista da Esh Capital, concorda que a melhora qualitativa do IPCA nesta medição ajuda com que as expectativas sigam no caminho da ancoragem, sentido esse que o BC precisa para anunciar uma sinalização de inícios de cortes na Selic no segundo semestre de 2023. “Nossa expectativa é que o ciclo de afrouxamento monetário se inicie em agosto, com um corte de 50 pontos-base”, previu
“Em relação à trajetória inflacionária, que atualmente segue sob efeito da defasagem, contribui com o carrego estático para o horizonte relevante. Entretanto, há algumas dúvidas em relação aos impactos das onerações de impostos em alguns setores, principalmente no caso de combustíveis, que podem diminuir as chances de registros mais expressivos de deflação ou estabilidade para as próximas medições.”
Para o mês de junho, a projeção da Esh é de uma inflação de 0,20%, com a continuidade de arrefecimento do grupo de Alimentação e bebidas, bem como uma inflação menor em Saúde e cuidados pessoais.
Variação menor em alimentos
Laura Moraes, da Neo Investimentos, foi outra economista a elogiar o comportamento da alimentação no domicílio (+0,0%), fruto do arrefecimento mais rápido da inflação de alimentos in-natura (-1,5% ante +1,7% no mês anterior). “Além de in-naturas, os fundamentos para a inflação de proteínas e demais alimentos apontam para baixo e estão contribuindo para um inflação mais bem-comportada”, comentou.
Além disso, ela afirmou que, como antecipado pelo IPCA-15, a leitura de serviços veio com o registro mais benigno em decorrência da queda forte de passagens aéreas (-17,7%) e aluguéis e taxas (+0,1%).
“A despeito do registro mais fraco em serviços, sob a ótica da condução da política monetária, essa categoria ainda está pressionada, com a média móvel de 3 meses anualizada e dessazonalizada ainda rodando em torno de 6,0%”, ponderou
Sobre os bens industriais, ela afirmou que, como esperado, esses itens seguiram o processo lento de normalização de maneira heterogênea. Os núcleos de industriais seguem pressionados em +0,5%, enquanto os industriais fora do core estão bem mais fracos (-0,14%).
Para Luca Mercadante, economista da Rio Bravo, os dados do IPCA continuam indo no caminho certo. “Apesar da surpresa grande, e da desaceleração importante que sofreram as medidas de inflação, o diagnóstico do cenário não muda muito. As medidas subjacentes, que são mais persistentes, ainda não condizem com a meta do BC nem no acumulado de 12 meses e nem na média móvel de 3 meses dessazonalizada e anualizada que é mais sensível ao curto prazo.”, alertou.
Mercadante disse ainda que os juros devem ficar onde estão por mais algum tempo, mas que o início dos cortes da Selic está cada vez mais próximo. “A divulgação de hoje aumenta a chance de que as primeiras reduções de juros comecem antes do que o esperado, possivelmente em agosto”, estimou.
André Nunes de Nunes, economista-chefe do Sicredi, afirmou que a dinâmica dos preços de alimentos nos últimos meses tem sido bastante errática, com uma surpresa altista em abril e baixista em maio.
Sobre a inflação de serviços, em especial a medida de serviços subjacentes, ele destacou que houve uma desaceleração (0,38%), mas que esse componente rodando acima de 7,0% no acumulado em 12 meses, o que ratifica a ideia de que o segmento tem segurado uma queda mais intensa da inflação. “Outro ponto de destaque foi a desaceleração na média dos núcleos acompanhados pelo Banco Central, que passou de 0,51% em abril para 0,37% em maio”, complementou.
Para junho, a expectativa do Sicredi é de um avanço de 0,18% no IPCA mensal. Para o final de 2023, foi feita uma revisão, de 5,4% para 5,2%.
João Savignon, head de pesquisa macroeconomica da Kínitro Capital, afirmou que o dado de hoje surpreendeu tanto pela magnitude do indicador cheio como por seu detalhamento, na abertura de dados. “Mostrou uma ‘cara’ melhor no mês, com desaceleração da média dos núcleos, altas de preços menos disseminadas e uma inflação de serviços subjacentes ainda resiliente, mas coerente com a nossa perspectiva de desaceleração gradual”, disse.
No mês, ele destacou a menor pressão vinda tanto dos preços livres (especialmente alimentos e serviços), como de administrados (combustíveis). “Chamamos a atenção para o movimento dos alimentos, que vieram melhores e seguem com uma dinâmica muito favorável e que deve se intensificar em junho, com importante deflação na margem”, avaliou.
Marcos Moreira, sócio da Nexgen Capital, afirmou que o IPCA divulgado hoje contribui para reforçar as expectativas de que o BC vai iniciar o processo de cortes da Selic já no terceiro trimestre, fechando o ano com a Selic de 12%.
Para ele, há riscos de obstáculos à frente, caso o CMN opte pelo alongamento do horizonte de convergência da inflação, que atualmente é de um ano. “Se considerarmos essa pauta de um possível alongamento no horizonte de convergência da inflação, somado às políticas fiscais mais expansionistas, ainda poderíamos ver uma certa pressão na inflação de 2024, mostrando certa resistência para voltar ao centro da meta”, alertou.
Desinflação lenta de serviços
Laiz Carvalho, economista sênior para Brasil no BNP Paribas, deu especial atenção em seus comentários ao viés positivo das medidas de núcleos e as de serviços. “Tanto a média dos núcleos utilizado pelo BC quanto os serviços subjacentes abaixo dos 0,40% na comparação mensal. E os dois vindo para baixo de 7% na comparação anual”, destacou.
Ela reconheceu que são níveis ainda bem acima da meta de inflação para este ano, que é de 3,25%, mas disse que trazem uma perspectiva que está havendo uma desaceleração. “Lenta, mas está acontecendo. Então, no geral um IPCA bastante positivo”, definiu.
Sobre as próximas decisões de política monetária, Laiz disse não acreditar que o BC mudará o jogo na reunião dos próximos dias 20 e 21 de junho. “Tem essa perspectiva positiva da inflação corrente, mas as expectativas de inflação, principalmente para 2024, 2025 e 2026 não se alteraram muito dentro do relatório Focus. Estão por volta de 4% ainda”, lembrou.
“A inflação corrente que está baixa, mas a expectativa ainda não mudou. E ainda tem os núcleos rodando num nível bem mais alto do que o centro da meta do BC. Para essa reunião de junho, a gente acha que não muda nada, mantendo em 13,75%. Mas claro, com a incorporação desse viés mais positivo para inflação de curto prazo”, comentou.
Claudia Moreno, economista do C6 Bank, também viu um resultado, melhor do que o esperado em maio, com expectativa de que o IPCA deva continuar caindo em junho, podendo chegar a 3,5% no acumulado de 12 meses. Porém, ela alertou que a inflação deve voltar a subir a partir do segundo semestre, quando as deflações de julho, agosto e setembro do ano passado (provocadas pela desoneração de impostos) saírem da base de cálculo do IPCA em 12 meses.
Sobre o indicador de maio, ela destacou que a redução do preço da gasolina, diesel e gás de cozinha, anunciados no dia 16 do mês passado pela Petrobras, ajudou a puxar para baixo o indicador. “Também chamou atenção o recuo na inflação de alimentos e bebidas, de 0,71% em abril para 0,16% em maio”, disse.
Sobre os núcleos de inflação do BC, que excluem elementos voláteis e não recorrentes, Claudia afirmou que eles vieram em linha com o esperado, acumulando uma alta de 6,7% em 12 meses. “Esse patamar elevado indica que a inflação mais estrutural está resiliente e caindo em ritmo lento”, comentou.
A inflação de serviços, que sofre os efeitos da inércia inflacionária e do mercado de trabalho aquecido, também vem caindo em ritmo menor, afirmou a economista do C6 Bank. Em 12 meses, a alta acumulada é de 6,5%.
“Na nossa visão, a resiliência da inflação de serviços, a pressão nos núcleos e a expectativa de inflação acima da meta não são compatíveis com a convergência da inflação à atual meta de 3% no horizonte relevante de política monetária.”
Por conta dessa leitura, a projeção do C6 Bank, por ora, ainda é de uma alta de 6% para o IPCA de 2023, com leve viés de queda. “Para 2024, esperamos que a inflação desacelere para 5,5%. Nossa previsão incorpora no cenário uma elevação da meta de inflação, o que abriria espaço para a redução taxa básica de juros a partir de setembro, chegando a 12,5% ao final de 2023. Para 2024, a previsão é que a Selic recue para 11%”, disse.
Possível deflação
Luis Menon, economista da Garde Asset Management, afirmou que há chances de deflação em junho. “Há expectativa de um número próximo a zero com chances de deflação, considerando o impacto dos cortes nos combustíveis e do programa de subsídios às montadoras. Não sabemos ao certo qual será a velocidade de implementação do programa do governo, mas tudo indica que será relativamente rápido”, afirmou.
Para o ano como um todo, a projeção da Garde para o IPCA foi revisada para baixo, de 5,1% para 4,9%. “Nesse ritmo não descarto que a inflação acabe ficando dentro do intervalo superior da meta (4.75%) e o BC não tenha que escrever a carta por mais um ano”, disse.
Menos comentou que é impressionante observar a rapidez da queda do indicador, especialmente impulsionada pelos preços dos alimentos. “Mês após mês, temos visto os preços no atacado surpreendendo para baixo, influenciados pelo cenário internacional e pela supersafra nacional”, disse.
Na análise da XP Investimentos, a composição do IPCA e suas medidas agregadas em maio reforçam os sinais recentes de desinflação no Brasil, mas com inflação de preços de serviços pegajosa, em linha com a projeção para o ano. “As principais surpresas se concentraram em serviços intensivos em mão de obra, o que reforça nossa visão de rigidez de preços na inflação de serviços ao longo do ano”, diz relatório.
A XP também alertou que, se observados os preços industriais no atacado, há mais desinflação contratada para os próximos meses. Por sua vez, os componentes ‘alimentação em casa’ trouxeram a principal surpresa de queda para nossa leitura, principalmente nos componentes ‘frutas e hortaliças’, sem destaques.
Com as surpresas de alta dos combustíveis, a projeção para o IPCA de junho (atualmente em 0,18%) está inclinada para baixo. “Não ficaríamos surpresos se tivéssemos uma deflação no próximo mês. Vale ressaltar que não estamos cogitando redução de preço da gasolina nos próximos meses. Por enquanto, mantemos nossa projeção de 5,4% para 2023”, diz o texto.
Andrea Damico, sócia e economista-chefe da Armor Capital, disse que, felizmente o cenário benigno para a inflação está se materializando, o que é fundamental para aa expectativa de início de cortes de juros em agosto. “Outro elemento é que muito provavelmente vai gerar novas quedas expetativas em 2023 e via, canal de inércia, para 2024”, previu
A Armor reviu sua projeção de IPCA para 2023 de 5,50% para 5,10%. Para 2024, a revisão foi de uma inflação de 3,9% para 3,8%.
Para os economistas Marco Caruso e Igor Cadilhac, do Banco Original, foram várias as sinalizações do ponto de vista qualitativo de que que a inflação apresentou uma composição melhor em maio.
Eles citaram o alívio sobre os preços de serviços, de 0,52% em abril para -0,06% em maio, a baixa na média dos núcleos (de 0,51% para 0,4%), a redução do índice de dispersão (de 66,05% para 55,97% e a menor pressão dos itens livres (de 0,53% para 0,07%).
“O cenário de deflação no atacado ao redor do mundo, somada com a apreciação do real por aqui, tem contribuído para uma leitura mais otimista sobre a inflação no ano e levado o mercado a antecipar um possível corte de juros”, comentaram.
Por outro lado, eles disseram que o comportamento dos serviços e dos núcleos continua a demandar cautela, especialmente em um contexto de pleno emprego. No fundo, o que se vê é uma melhora de itens mais voláteis até agora. Dito isso, revisamos a nossa projeção deste ano de 5,7% para 5,2%”, disseram.