IPCA de janeiro acende alertas, mas economistas veem pressões temporárias

Serviços subjacentes, em especial os que sofrem pressão da mão de obra, passam por reajustes nessa época do ano, enquanto os efeitos climáticos influenciam os preços alimentos consumidos no domicílio

Roberto de Lira

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A divulgação nesta manhã do IPCA de janeiro veio carregada de surpresas negativas em relação às projeções, com o indicador cheio mais forte que o esperado, o índice de difusão estável em nível ainda alto e aceleração dos preços dos serviços subjacentes. Mas, embora os economistas reconheçam que os alertas amarelos sobre a inflação estão acesos, é feita a ponderação de que o início do ano tem forte atuação de pressões temporárias.

Também existe uma avaliação de que esse qualitativo menos benigno reforça o tom de cautela que o Banco Central tem adotado, mantendo a comunicação de que o atual ritmo de cortes de 0,50 ponto percentual na taxa Selic é o mais apropriado.

Andrea Damico, economista chefe da Armor Capital, destaca que a variação de 0,42% do indicador em janeiro veio acima da mediana do mercado (0,34%) e da previsão da gestora de ativos, que estimava uma alta de 0,39%. “A surpresa mais desconfortável foi nos serviços subjacentes, que tiveram uma alta bastante expressiva”, comenta.

Esses preços avançaram 0,76% no mês, acelerando ante os 0,51% observados em dezembro.

Inércia

Andrea lembrou, no entanto, que essa variação ainda tem um componente inercial, de reajustes anuais “gregorianos” de serviços que usam como base o IPCA de 12 meses de dezembro. “A gente ainda mantém uma visão mais construtiva de que, a partir do mês que vem, deve começar uma descompressão dos serviços subjacentes. Esse itens irão desacelerar, principalmente em março”, prevê.

O Itaú, por sua vez, chamou atenção também para a surpresa de alta no mês nos preços industriais subjacentes, puxados por higiene pessoal e vestuário. Nos serviços subjacentes, o banco destacou a aceleração de serviços bancários.

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“Na média móvel de três meses, com dados dessazonalizados e anualizados, os serviços subjacentes aceleraram para 5,3% (de 4,3%), enquanto o núcleo de industriais subjacentes acelerou para 1,8% (ante -1,6%)”, compara o Itaú. Na mesma métrica, a inflação de núcleos subjacentes acelerou para 1,6% nessa média móvel trimestral, de 1,3% em dezembro.

Mão de obra

A opinião de Leonardo Costa, economista da ASA Investments, é parecida. “Os serviços foram o grande destaque negativo da leitura de janeiro, mais pressionados por itens de mão de obra e recreação. A sazonalidade dos subjacentes de serviços é desfavorável no começo do ano, mas a taxa do primeiro mês de 2024 foi ainda pior”, comenta.

A XP, por sua vez comenta que a alta mensal dos serviços subjacentes superou as  expectativas internas, de 0,64%, e que a média móvel trimestral anualizada e ajustada sazonalmente disparou de 4,2% para 5,4%, a maior leitura desde junho de 2023.

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Esse movimento teve bastante influência de subitens como aluguel de carros e serviços bancários, além dos serviços intensivos em mão de obra, que aceleraram de 5,1% para 6,0% na mesma métrica, reforçando as preocupações apresentadas na última ata do Copom.

“Se nossa previsão se confirmar, os serviços deverão atingir o pico no 1º trimestre de 2024, mas acomodando-se em torno de 4% no 2º semestre, portanto, acima de 3%”, comenta a equipe de análise macro da XP.

Clima afeta alimentos

Sobre os alimentos, embora o grupo e alimentação do domicílio tenha desacelerado ante os dados recentes do IPCA-15, a alta de 1,8% em termos mensais em janeiro foi , muito superior aos valores de janeiro de 2023 (+0,60%).

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Para a XP, isso refletiu os efeitos do El Niño nos alimentos frescos, mas que a pressão será temporária. “As coletas de preços indicam que essa pressão deverá se dissipar parcialmente em fevereiro”, afirma o relatório.

Claudia Moreno, economista do C6 Bank, tem uma  visão similar. “Historicamente, os preços dos alimentos sobem nesta época do ano. Mas a alta de agora veio mais forte do que nos meses de janeiro dos anos anteriores, muito provavelmente por conta dos efeitos climáticos do El Niño sobre produtos in natura”, explica.

Ela espera que a inflação oficial continue acima do centro da meta em 2024, principalmente pela desaceleração lenta dos preços dos serviços, que sofrem a influência do mercado de trabalho aquecido.