Inflação do consumo mais alta nos EUA torna improvável um corte de juros este ano, dizem analistas

Maioria dos economistas acredita que taxa de juros ainda subirá ao menos mais 25 pontos-base antes do fim do atual ciclo restritivo

Roberto de Lira

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O dado da inflação do consumo (PCE) nos Estados Unidos referente a abril acima das estimativas do mercado, somado a outros indicadores recentes de atividade econômica e do mercado de trabalho, local reduziram consideravelmente as chances de o Federal Reserve iniciar um período de corte na taxa de juros no curto prazo, segundo analistas. Na verdade, apontam os especialistas, cresceram as chances de pelo menos mais uma alta de 25 pontos-base no juros, antes da interrupção do atual ciclo de alta.

O PCE voltou a acelerar, de 0,1% em março para 0,4% em abril, acima do consenso do mercado (0,3%). Já o núcleo da inflação, que desconsidera grupos de itens mais voláteis, como energia e alimentos, subiu 0,4% ante o mês anterior e agora acumula alta de 4,7% em 12 meses. Esse é o indicador mais observado pela autoridade monetária para a tomada de decisão.

Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, chama a atenção que a composição do PCE mostrou que a inflação de serviços segue sendo a principal responsável pelo aumento do índice. O setor, lembra ela, sofre impacto do mercado de trabalho aquecido, que tem aumentado os salários acima da produtividade. Ao mesmo tempo, a inflação de bens não parece ser mais um problema.

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“Na nossa visão, o Fed irá optar por uma pausa na próxima reunião de junho (dias 15 e 16), mas isso não significaria o fim do ciclo de alta de juros, pois aumentos podem ser retomados em seguida caso seja necessário. Mantemos nossa visão que a inflação deve demorar a ceder em meio a um mercado de trabalho aquecido que deve desacelerar lentamente”, prevê Claudia.

Assim, a projeção do C6 Bank é que a taxa de juros americana deve permanecer no nível atual, ou um pouco acima, por um longo tempo. “Nossa previsão é que os juros não comecem a cair antes de meados de 2024”, estima.

A economista afirma que perderam força nas últimas semanas dois fatores que poderiam antecipar cortes de juros: a possibilidade de um forte aperto de crédito decorrente do colapso de alguns bancos regionais nos EUA e uma crise econômica desencadeada pela falta de acordo sobre elevação do limite da dívida pública americana.

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Dúvida para junho

Lucas Serra, analista da Toro Investimentos, afirma que o índice de inflação do consumo mais alto que o esperado em abril corrobora com a tese que o Fed deve aumentar em mais 25 pontos-base as taxas dos Fed Funds, mas que há dúvida sobre quando isso deve ocorrer. “Pode acontecer em junho, com manutenção em julho. Ou uma possibilidade defendida por alguns membros do Fed, que seria a manutenção no atual patamar em junho para uma retomada de 25 bps em julho”, detalhou.

Para a Levante Investimentos, o PCE de abril e a divulgação, na quinta-feira (25), de um crescimento de 1,3% no Produto Interno Bruto (PIB) americano no 1° trimestre, mostram que a economia dos Estados Unidos segue aquecida. Além disso o relatório da casa de investimentos lembra que, nos últimos dias, diversos indicadores do mercado de trabalho mostram que a demanda por mão de obra segue robusta.

“Com isso, a hipótese do fim da trajetória de alta dos juros nos Estados Unidos perdeu força. Há duas semanas, era praticamente consenso de que, na reunião de 15 e 16 de junho, o Fed manteria as taxas de juros estáveis na faixa atual. No entanto, agora a probabilidade de alta dos juros voltou a ganhar força”, comenta a Levante.

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Em apenas uma semana, a probabilidade de manutenção dos juros na atual faixa de 5,0% a 5,25% saiu de 82,6% para 40,4%, de acordo com o Fed Watch, ferramenta do CME Group.  Já a chance de uma alta de 25 bps na reunião de junho saiu de 17,4% no dia 19 de maio para um posição majoritária de 59,6% nessa sexta-feira (26).

Francisco Nobre, economista da XP investimentos, reconhece em relatório que o mercado voltou a precificar esse aumento de 0,25% em junho ou julho, mas ele diz discordar dessa leitura. “Acreditamos que esse evento não se concretize e que os dados a serem divulgados até a reunião de julho ainda podem amenizar as preocupações do mercado”, comenta.

Para ele, apesar da resiliência de curto prazo, ainda é esperado que a atividade enfraqueça à medida que os efeitos de condições financeiras mais apertadas se tornem mais evidentes no comportamento de empresas e consumidores. “Acreditamos que os EUA entrarão em um período de contração moderada no segundo semestre de 2023”, prevê.

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Segundo Nobre, os valores de inflação divulgados hoje, acima do esperado, foram explicados principalmente por aumentos mais elevados nos preços dos carros usados ​​e ainda muito fortes nas rendas (0,55% na comparação mensal).

Mas, com a expectativa de que processo desinflacionário se acelere no segundo semestre do ano, a projeção da XP é que o núcleo da inflação do PCE terminará o ano em 3,1%.

Na leitura feita por Nobre, para o Fed mudar seu plano de voo e iniciar um ciclo de flexibilização ainda este ano, a dinâmica do núcleo da inflação do PCE teria que diminuir consideravelmente daqui para frente – notavelmente abaixo da estimativa do Fed de 3,6% de inflação no final do ano. Isso exigiria variações de cerca de 0,2% mensais ao longo do resto do ano, calcula.