Emprego ainda forte nos EUA permite ao Fed reduzir ritmo de cortes, dizem economistas

Temores de desaceleração mais brusca no mercado de trabalho e na atividade econômica diminuíram e expectativa agora é que o Fed faça dois cortes de 0,25 p.p. na reuniões de novembro e dezembro

Roberto de Lira

O prédio do Federal Reserve em Washington, EUA (Foto: Leah Millis/Reuters)
O prédio do Federal Reserve em Washington, EUA (Foto: Leah Millis/Reuters)

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Os fortes dados do payroll de setembro divulgados nesta sexta-feira (4) contribuíram para reduzir os temores de uma desaceleração mais brusca do mercado de trabalho e da atividade econômica nos Estados Unidos e isso deve dar segurança para que o Fed reduza o ritmo de cortes em sua taxa de juros, opinam os economistas.

Os EUA criaram 254 mil vagas de trabalho fora do setor agrícola no mês passado, bem mais que as estimativas do mercado, que flutuavam entre 140 mil e 150 mil. Além disso, a taxa de desemprego recuou para 4,1%, ante projeções de estabilidade em 4,2%.

Francisco Nobre, economista da XP, destaca em análise a relevância dos dados de hoje, uma vez que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) tem dedicado mais atenção ultimamente ao seu mandato de emprego do que ao da meta de inflação.

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Para ele, os números reiteram que os próximos cortes de juros devem vir numa magnitude mais moderada do que a anunciada na última reunião do Fomc, quando as taxas foram reduzidas em 0,50 ponto percentual. Nobre diz que a flexibilização nos encontros de novembro e dezembro deve ser de 0,25 p.p. em cada uma.

Essa projeção espelha bem a observada na ferramenta FedWatch, do CME Group. A probabilidade de o Fed fazer o corte de 25 pontos-base em novembro subiu de 67,9% ontem para 92,5% hoje. Há uma semana, essa chance estava em apenas 46,7%.

Para Nobre a taxa de desemprego talvez tenha sido o maior destaque nos números de hoje. Ele observa que o recuo foi de 0,17 ponto, considerando a segunda casa decimal, de 4,22% em agosto para 4,05% em setembro, a maior redução desde março de 2022.

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Ele pondera, no entanto, que o mercado de trabalho parece estar um pouco mais aquecido do que é considerado um nível de equilíbrio pelo Fed quando analisados apenas os resultados do mês. Mas ele lembra que a tendência dos últimos 3 e 6 meses aponta para índices coerentes com um equilíbrio do mercado de trabalho e não com uma deterioração.

“Uma grande preocupação do mercado nos últimos meses foi que o arrefecimento estava acontecendo de forma muito acelerada e que esse equilíbrio poderia se tornar uma deterioração. Mas quando a gente olha para o número de hoje e para os fundamentos da economia, não vê uma vulnerabilidade muito grande”, comenta.

O economista da XP diz ver o Fed fazendo os dois cortes citados antes e depois mantendo a flexibilização “saltando” os cortes de 25 pontos a cada duas reuniões em 2025, até chegar num juro terminal de 3,5% no final do ano que vem.

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Uma mudança nesse perspectiva, segundo ele, só aconteceria de a taxa de desemprego subisse para 4,4% até a reunião de novembro, o que forçaria o Fed a fazer mais um corte mais agressivo de 0,50 p.p.. Mas Nobre diz que esse cenário ficou bastante improvável.

Chance de recessão menor

André Valério, economista sênior do Inter, concorda com a análise que o Fed tem mostrado grande preocupação com o mercado de trabalho, cuja taxa de desemprego chegou a atingir 4,3%, dando gatilho à “Regra de Sahm”, que antecipa recessões na economia americana.

“Mas essa regra nunca foi ativada com pedidos de seguro-desemprego tão baixos quanto estamos vendo nesse momento. Ontem os dados de seguro-desemprego indicam que foram requeridos 225 mil novos seguros, patamar historicamente consistente com uma economia saudável”, explica.

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Para ele, o resultado de hoje não apresenta nenhum dado que faça aumentar o receio de uma desaceleração aguda do mercado de trabalho. Mas aumenta, na margem, o risco de uma reaceleração inflacionária, com os salários em tendência de alta.

Na opinião de Danilo Igliori, economista chefe da Nomad, “os números do relatório de emprego de setembro, com queda marginal no desemprego e fluxo de contratações líquidas muito acima do esperado, devem afastar de vez a hipótese de um enfraquecimento mais relevante no mercado de trabalho dos EUA. 

“Vale lembrar no entanto que os números não refletem os potenciais impactos dos furacões que atingiram o sul do país e as recentes greves”, pondera.

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Com relação à política monetária, ele destaca que os contratos de juros agora mostram que ampla maioria “comprou” as declarações do presidente do Fed, Jerome Powell, sugerindo que ocorrerão mais dois cortes de 0,25 ponto percentual até o final do ano. “O cenário do pouso suave está cada vez mais consolidado”, avalia.

Gustavo Cruz, estrategista chefe da RB Investimentos, também afirma que os dados do payroll superaram as expectativas do mercado. “Isso diminui a chance de um corte de 0,50% na taxa de juros pelo Fed em novembro, indicando uma provável desaceleração para 0,25% tanto em novembro quanto em dezembro.”

“No geral, o payroll não sinaliza um enfraquecimento significativo da economia americana, o que pode levar muitos analistas a reverem suas previsões negativas sobre o país”, afirma Cruz.

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Para o Morgan Stanley, o mercado de trabalho reacelerou da fraqueza do verão. A força da folhas de pagamento, diz análise do banco de investimentos, ocorreu apesar da retração contínua no setor de manufatura. “Os serviços reaceleraram, os serviços de varejo e profissionais e empresariais se recuperaram dos meses fracos anteriores. Os serviços de saúde e sociais continuaram a crescer”, lista o banco.

“Continuamos a esperar cortes de 25 pontos base nas reuniões do Fomc de novembro e dezembro. A linha de base do presidente Powell é de cortes de 25 pontos-base, assumindo que não haja mais resfriamento, e este relatório indicou uma recuperação da fraqueza do verão no mercado de trabalho.”

O banco alerta que o relatório da folha de pagamento daqui a um mês, em outubro, será mais difícil de ler por causa das greves e do furacão Helene. “Mas se eles realmente deprimirem as folhas de pagamento, eles representam interrupções temporárias na atividade em vez de um resfriamento subjacente no mercado de trabalho. Com a greve dos estivadores agora encerrada, ela não afetará as folhas de pagamento de outubro”, diz a análise.

É previsto que os efeitos do furacão provavelmente começarão a aparecer nos dados de pedidos de seguro-desemprego da próxima semana, embora alguns registros de pedidos provavelmente sejam atrasados ​​pela destruição.

Para Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, os dados de hoje mostram que o mercado de trabalho americano, que vinha esfriando nos últimos meses, volta a apresentar força, superando as expectativas do mercado. “As vagas em aberto, exibidas em outro relatório publicado nesta semana (Jolts), também subiram, de 7,7 milhões para 8 milhões. Esse número veio acima das estimativas, que previam a estabilidade”, lembra.

A economista também diz acreditar que o Federal Reserve vai manter o ciclo de corte de juros, já que a inflação no país está em desaceleração. “Mas os dados de hoje do mercado de trabalho podem levar a autoridade monetária a realizar cortes de menor magnitude, de 0,25 ponto percentual, nas próximas reuniões”, concorda.

Claudia destaca, no entanto, que, embora a probabilidade de corte de 0,50 ponto percentual diminua agora, essa carta continua na mesa. “Vale lembrar que antes da próxima decisão de política monetária, marcada para novembro, haverá mais uma rodada de divulgação da pesquisa de desemprego. Caso os números de outubro mostrem aumento na taxa de desocupação, a chance de haver corte de 0,50 p.p. cresce.”