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O aparente alívio na inflação de setembro, com a alta mensal de 0,44% vindo um pouco abaixo da projeções e com a notícia de algumas boas surpresas em serviços, será insuficiente para uma mudança na política monetária do Banco Central, que deve continuar o ciclo de elevação da Selic, dizem economistas. A explicação é que permanecem as pressões sobre as expectativas para o IPCA no ano, acima até do teto da meta.
Alexandre Maluf, economista da XP, destaca que a aceleração do IPCA em comparação com agosto se deveu em grande parte ao aumento das contas de eletricidade – devido a ativação da bandeira vermelha 1 – e da alimentação no domicílio, especialmente nas carnes bovina e suína.
Maluf também cita boas surpresas em serviço subjacentes, tanto na leitura mensal como na média móvel de três meses anualizada, que desacelerou de 5,5% para 4,7%. O mesmo ocorreu em serviços intensivos em mão de obra, que recuaram de 4,2% para 3,9% na mesma comparação, o nível mais baixo desde setembro de 2021.
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Já o núcleo da inflação, acelerou de 4,5% para 4,8% nessa média móvel trimestral, ficando consideravelmente acima da meta, destaca o economista.
“Esses números são consistentes com nosso cenário, que antecipa que as medidas principais responderão à aceleração nos bens industriais e nos serviços subjacentes ao longo do último trimestre, encerrando 2024 acima de 4% ao ano”, prevê.
Além disso, a previsão de 6,1% da XP para o comportamento do grupo ‘alimentação no domicílio’ está com viés de alta, por conta da dinâmica de preços das carnes.
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Sobre o IPCA de setembro, Maluf diz que, apesar de algum alívio nas linhas de serviços, a maior parte do efeito no mês está relacionada aos descontos da semana do cinema, que devem se reverter em outubro. “Consideramos que o cenário prospectivo ainda é desafiador, devido à inflação de serviços persistente e à aceleração nos preços ao produtor e nas proteínas.”
A XP, portanto, mantém suas expectativas de que o Copom deve elevar a Selic em 0,50 ponto percentual nas duas reuniões à frente (em novembro e dezembro) e aplicar um ajuste adicional de 25 pontos base em janeiro. No momento, o risco é alta ainda maior.
A projeção para a inflação está mantida em 4,6% para 2024, desacelerando um pouco, para 4,1%, em 2025.
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Pressões permanecem
Para André Valério, economista sênior do Inter, o IPCA de setembro confirma o cenário indicado pelo IPCA-15.Ele afirma que, a despeito das pressões dos itens mais voláteis, a dinâmica inflacionária permanece benigna, com os núcleos e os serviços bem comportados, sem indicar reaceleração. E destaca que a difusão também se manteve confortavelmente no patamar de 55%.
Porém, ele também diz esperar que o Copom eleve a Selic em 50 pontos base na reunião de novembro, tendo em vista a pressão mercado, as expectativas desancoradas e a pressão nos itens monitorados que, em meio ao atual contexto, pode contaminar ainda mais as expectativas.
“Para o restante do ano devemos continuar a observar pressões desses itens mais voláteis, com um novo aumento na bandeira tarifária em outubro e a continuidade da seca”, estima.
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No entanto, ele pondera que, caso o governo consiga entregar a meta fiscal esse ano, haverá um menor impulso fiscal no último trimestre, o que poderia contribuir para o bom comportamento dos núcleos e da inflação de serviços, que não se mostram muito sensíveis, nesse momento, ao ritmo acima do esperado da atividade econômica.
Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, também alerta que os riscos inflacionários continuam altos. “Fatores como o mercado de trabalho com a menor taxa de desemprego da última década mantêm uma pressão elevada sobre os salários que podem dificultar uma convergência mais rápida da inflação para o centro da meta”, comenta.
Para ele, isso dificulta até mesmo a reancoragem das expectativas futuras, quando analisado o horizonte relevante de 18 meses.
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“O relatório de inflação do próprio Banco Central veio indicando que até 2027 a inflação não tem sinais claros de volta para o centro da meta e que, na ausência de um choque positivo de oferta, os juros tendem a permanecerem elevados para tentar conter a expansão da demanda e consequentemente frear os preços”, acrescenta.
Moreira, portanto, também projetamos duas altas de 0,50% na Selic este ano e outra de 0,25% no início do próximo ano, chegando assim em uma Selic terminal de 12%, embora alerte que essa projeção tem viés de alta.
“Além da expansão da renda, vemos a demanda por crédito se manter aquecida e acreditamos que o saldo total de crédito terá um crescimento real de 6,5% este ano. Projetamos crescimento de 3,1% para o PIB de 2024 e de 1,8% em 2025, em linha com o aperto das condições monetárias e o fim da ociosidade nos fatores de produção.”
Na opinião de Igor Cadilhac, economista do PicPay, embora algumas métricas do IPCA tenham mostrado desaceleração no curto prazo, há sinais claros de piora nas leituras mais recentes.
“Além disso, as expectativas futuras continuam sendo um dos principais desafios. Diante disso, do ponto de vista da política monetária, o Copom deverá acelerar o ritmo e optar por uma alta de 0,50 ponto percentual na Selic na reunião de novembro”, comenta.
Ele mantém a projeção de uma inflação de 4,4% para 2024 e coloca entre os riscos de alta uma maior resiliência na inflação de serviços em função de um hiato do produto mais apertado, a desvalorização da moeda, a desancoragem das expectativas em um contexto de percepção de risco fiscal e impactos das condições climáticas adversas nos preços.
Mercado de trabalho aquecido
Já Claudia Moreno, economista do C6 Bank, cita que, depois de dois meses de deflação, os preços da alimentação no domicílio voltaram a subir no mês passado.
“Esse movimento tem um componente sazonal e também uma relação com a seca e as queimadas que têm prejudicado a produção de diversas culturas agrícolas. A alta dos preços dos alimentos, que já havia sido captada pelos indicadores de inflação no atacado, está sendo agora repassada ao consumidor”, afirma.
Ela destaca ainda que a pressão sobre a inflação de setembro exercida pelos preços da energia elétrica deve permanecer em outubro, com o acionamento da bandeira vermelha 2.
Sobre os serviços, apesar do comportamento mais benigno no mês passado, Claudia diz, não ver alívio à frente, uma vez que esses preços devem continuar sendo pressionados pelo mercado de trabalho aquecido.
“Além disso, a inflação de bens industriais voltou a acelerar – a alta acumulada em 12 meses passou de 1,2% em agosto para 1,5% em setembro. Com o fim da queda das cotações das commodities, os preços bens industriais devem voltar a contribuir para a elevação do IPCA.”
A projeção do C6 Bank é que o IPCA feche o ano em 4,7%, acima do teto da meta. Para 2025, a previsão é que a inflação fique em 4,8%.
“Na nossa visão, o Copom deve seguir com o ciclo de alta da Selic nas próximas decisões, com ajustes de 0,50 ponto percentual nas reuniões de novembro e dezembro. Projetamos Selic em 11,75% ao final de 2024 e de 10% ao final de 2025.”
Gustavo Sung, economista chefe da Suno Research, também alerta para a elevação mensal dos serviços intensivos em trabalho, além da elevação da média móvel dos núcleos.
“Até o final do ano, alguns pontos de atenção seriam os preços dos bens industriais, que podem enfrentar uma leve pressão devido à recente desvalorização cambial, e a elevação dos preços de energia após o anúncio da vigência da bandeira vermelha 2 em outubro, em meio ao clima seco e a piora no quadro hidrológico dos reservatórios”, comenta
Outro ponto importante citado por Sung é o crescimento robusto da economia. “Embora esse crescimento seja positivo para a atividade doméstica, pode gerar pressões inflacionárias ou retardar o ritmo de desaceleração”, adverte.
Assim, diante de uma atividade econômica mais forte do que esperado, de uma inflação que deve terminar o ano próximo da banda superior da meta, de expectativas de inflação desancoradas e uma taxa de câmbio acima de R$ 5,50, o economista também acha que o BC deve continuar o ciclo de ajuste da taxa de juros.