Economistas divergem sobre patamar final da Selic em 2025 após sinalização do Copom

Diretoria do BC antecipou que deve ser necessário uma nova alta de juros em maio, porém num ritmo menor que o 1 ponto percentual decidido nesta quarta-feira; especialistas debatem se ciclo acaba em maio ou em junho

Roberto de Lira

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Após a já antecipada alta de 1 ponto percentual na Selic anunciada nesta quarta-feira (19), persistem dúvidas entre os economistas sobre até onde o Banco Central está disposto a ir nesse atual ciclo de alta de juros. Normalmente, ao dar uma orientação de novo ajuste para cima, a leitura é de um comunicado mais duro (“hawkish”), mas a opção por deixar a expressão no singular “próxima reunião”, deixa aberta a possibilidade de uma interrupção em junho, embora isso não seja consenso.

O chamado “forward guidance” dessa noite foi: “diante da continuidade do cenário adverso para a convergência da inflação, da elevada incerteza e das defasagens inerentes ao ciclo de aperto monetário em curso, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de menor magnitude na próxima reunião”. 

Durante a live do InfoMoney no Youtube, Rodolfo Margato, economista da XP, lembrou que havia um debate grande entre os analistas de mercado e os economistas a respeito da sinalização do Comitê para os próximos encontros. Alguns projetavam que não haveria nenhuma orientação e outros, como o caso do time econômico da XP, antevendo alguma sinalização sobre a necessidade de um ajuste monetário adicional.

“E aqui também tem um debate: será que vem 0,75 p.p. 0,50 p.p., 0,25p.p.. Acho que vai depender em grande medida da dinâmica da taxa de câmbio, que vem mostrando uma descompressão. Também a dinâmica da atividade doméstica, há alguns sinais de desaceleração na economia brasileira, no PIB, na produção industrial, nas vendas varejistas. Mas o Comitê trouxe que são sinais incipientes de moderação”, explicou.

Mas ele destacou que inflação corrente ainda está pressionada e que as expectativas de inflação estão desancoradas. “Então, a magnitude da próxima elevação de juros ainda tem bastante incerteza”, comentou, citando que o cenário base da XP é de uma alta de 0,75 p.p. em maio e uma última alta de 0,5 p.p. em junho.

Para Luis Cezario, economista-chefe da Asset 1, o comunicado trouxe duas mensagens importantes. “A primeira é que o plano do vôo do Comitê é reduzir o ritmo de alta de juros na próxima reunião. A segunda é que o balanço de riscos do cenário base do Copom permaneceu assimétrico para cima, a despeito dos sinais de desaceleração na atividade e da apreciação da taxa de câmbio ocorrida desde o início do ano.”

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Assim Cezário avaliou a comunicação do Copom como ponderada. Segundo sua análise, é compreensível que com a taxa de juros real no nível atual, com sinais já evidentes de desaceleração da atividade e considerando que há as defasagens na transmissão da política monetária, o Copom indique que será mais cauteloso com a condução da política monetária daqui por diante.

“Por outro lado, com as projeções de inflação bem acima do centro da meta, a inflação corrente bastante pressionada e as expectativas de inflação mais desancoradas, era importante que deixasse claro que o ciclo de aperto monetário não está concluído”, disse, acrescentando que há uma incerteza enorme em relação aos efeitos das políticas do governo Trump sobre a atividade e inflação global, e isso também exige maior prudência por parte do Banco Central.

Atividade mais fraca

Rafaela Vitoria, economista-chefe do Inter, disse ter observado a manutenção do tom mais duro e do viés altista na análise dos riscos para a inflação, apesar da melhora marginal no cenário, principalmente a valorização do real.

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“Os sinais de desaceleração da atividade também tiveram menção secundária, e o Comitê continua focado nas expectativas de inflação, que, de fato, continuaram a trajetória de alta desde a última reunião.”

Dito isso, como ficam as projeções para a próxima reunião? Rafaela Vitória disse estar mantendo a expectativa de uma alta de 0,50 p.p., para 14,75%, encerrando o ciclo de aperto monetário. Para ela, a continuidade da desaceleração da atividade e o atual patamar de câmbio mais favorável devem contribuir para reverter, em parte, a elevação nas expectativas de inflação.

“A magnitude do aperto e o atual patamar de juro real já é bastante restritivo e suficiente para a convergência da inflação para a meta até 2026, que, na projeção do BC, está em 3,9%”, afirmou, ponderando que o risco de nova expansão fiscal e parafiscal deve continuar no radar, podendo impactar o processo de desinflação, tirando força da política monetária.

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Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV, também acredita que a alta adicional, porém em ritmo menor, citada pelo BC, deve significar um ajuste de 0,50 ponto para cima em maio.

“A justificativa para essa postura é a preocupação com a não convergência das expectativas de inflação. No nosso cenário, há espaço para altas além das sinalizadas, alcançando juma taxa básica de 15% e ficando com essa taxa até o final do ano. A decisão de hoje não altera esse cenário, mas claramente o viés é para juros mais elevados”, destacou.

Flávio Serrano, economista-chefe do Banco BMG, por sua vez, projetou um aumento de 50 pontos-base na Selic, para 14,75% a.a. no encontro de maio. “Para além dessa reunião, o BC reforçou que qualquer ação será tomada levando em consideração o firme compromisso de trazer a inflação para a meta. Acreditamos que o aumento de 50bps de maio será o último movimento deste ciclo de alta de juros”, estimou.

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Já na projeção de Danilo Passos, economista da WHG, o Copom anunciará uma alta de 50 bps na reunião de maio e uma alta final de +25 bps no Copom de junho, com a Selic alcançando 15,0% no final do ciclos.

Ao analisar o comunicado, Leonardo Costa, economista do ASA, destacou que o balanço de riscos do BC segue assimétrico e que entre os riscos altistas, destacam-se a desancoragem prolongada das expectativas, a resiliência da inflação de serviços devido a um hiato do produto positivo e políticas econômicas que pressionem a inflação, como uma taxa de câmbio mais depreciada.

“Já os riscos baixistas incluem uma desaceleração econômica doméstica mais intensa e um ambiente global menos inflacionário devido a choques no comércio e nas condições financeiras.”

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Na opinião de Gesner Oliveira, economista e sócio da GO Associados e professor da FGV, o Copom mostrou hoje uma preocupação de um crescimento menor e uma taxa de inflação maior, com um risco à estagflação.

“É razoável supor que a próxima elevação possa ser da ordem de 0,50 p.p., passando a taxa de juros dos atuais 14,25% para 14,75%. Tanto no cenário externo quanto no cenário doméstico, persistem várias incertezas. Chama atenção também o destaque que se dá à nova política dos Estados Unidos em relação à guerra comercial, às tarifas de importação e à preocupação com seus impactos inflacionários e sobre a produção.”

Ariane Benedito é economista-chefe do PicPay, por sua vez, destacou que a pressão inflacionária deve continuar, com o IPCA de março consolidando-se acima de 5,4% no acumulado de 12 meses. “Para o mês, esperamos uma inflação de 0,52%. Diante desse contexto, consideramos coerente que o Banco Central mantenha o ciclo de alta, com um aumento adicional de 0,75 ponto percentual na reunião de maio, garantindo o alívio inflacionário e a convergência da inflação para a meta.”

Para ela, se as condições econômicas e o balanço de riscos se mantiverem inalterados ou se deteriorarem, nossa projeção para a taxa de juros ao final do ciclo de alta seguirá em 15%, sem expectativa de cortes ainda este ano. “Para a ata da reunião, esperamos uma análise mais detalhada sobre o recente alívio do câmbio, a leitura do Banco Central sobre os dados de alta frequência que indicaram desaceleração da atividade econômica em janeiro e os efeitos da política fiscal no horizonte relevante, disse.

Críticas da indústria e do comércio

Se os economistas ainda debatem o quanto os juros ainda precisam subir para que aconteça uma convergência da inflação e das expectativas rumo à meta, o setor produtivo não poupou críticas ao Banco Central.

Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a alta de 1 ponto anunciada hoje “não é necessária para controlar a inflação e prejudicará o ritmo de crescimento da economia”. A Selic

“O nível atual da Selic, que implica taxa de juros real de 8,5% a.a. (3,5 p.p. acima da taxa neutra estimada pelo Banco Central), já tem impactado fortemente a economia, que apresenta desaceleração mais aguda do que a prevista, tanto pela CNI, como por diversos analistas econômicos. Essa desaceleração intensa da economia já seria suficiente para controlar a inflação”, avaliou em nota Ricardo Alban, presidente da CNI.

Além de lembrar que o PIB do 4º trimestre de 2024  já havia crescido abaixo do esperado, ele citou que o disso, o aperto monetário em curso já se traduz em aumento efetivo da taxa de juros dos tomadores de crédito.

“Em setembro de 2024, quando o Copom começou a aumentar a Selic, a taxa de juros média era de 27,54% a.a. Em janeiro de 2025, passou para 29,82% a.a, diz o comunicado da confederação, destacando que os efeitos das quatro altas da Selic sequer se materializaram plenamente, uma vez que há uma defasagem temporal entre a alteração nos juros básicos e o impacto na economia.

Já Felipe Queiroz, economista-chefe da APAS (Associação Paulista de Supermercados), disse em comunicado entender que o Copom deveria adotar uma ação mais parcimoniosa em relação ao ciclo de alta da taxa de juros, para não prejudicar a produção, o consumo e os investimentos domésticos.

“O Brasil já possui uma das maiores taxas reais de juros do mundo, e com a recente calibragem da Selic, torna ainda mais difícil fomentar o nível de investimento necessário para o país se manter competitivo internacionalmente neste cenário de neoprotecionismo. Além disso, os efeitos sobre os empregos e sobre o consumo das famílias são deletérios”, afirmou.

A nota da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), assinada pelo presidente Flávio Roscoe, disse reconhecer a importância do controle da inflação para a estabilidade econômica, mas também alertou para os impactos negativos dos juros elevados. “A elevação da Selic a níveis tão altos tende a restringir os investimentos produtivos, aumentar os custos de produção e reduzir a competitividade da indústria brasileira e mineira”, disse Roscoe.