Economia dos EUA continua sólida e dose do corte de juros em setembro está em aberto

Dados do payroll de agosto e revisões reforçam tese de desaceleração, mas avaliação majoritária de especialistas é que economia ainda está aquecida, tornando arriscado um corte agressivo nas taxas

Roberto de Lira

Corredor passa em frente ao prédio do Federal Reserve em Washington (Foto: Chris Wattie/Reuters)
Corredor passa em frente ao prédio do Federal Reserve em Washington (Foto: Chris Wattie/Reuters)

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Embora os dados do relatório de emprego nos Estados Unidos, o payroll, de agosto tenham novamente reforçado a tendência de desaquecimento do mercado de trabalho, a opinião majoritária dos economistas é que isso não significa necessariamente um corte agressivo de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) em setembro.

Na verdade, as opiniões estão divididas entre uma redução de 0,25 ponto percentual e 0,50 p.p. A plataforma FedWatch, do CME Group, por exemplo, estava nesta manhã com uma probabilidade maior de o corte inicial ser mais leve (51% a 49%).

Para André Valério, economista sênior do Inter, os dados de hoje, que mostraram a economia americana adicionando 142 mil novos empregos em agosto, abaixo da expectativa de 165 mil, e um recuo na taxa de desemprego de 4,3% para 4,2%, apontam que mercado de trabalho americano deu indícios de enfraquecimento, mas sem apontar para uma recessão. Além disso, os salários aceleraram no mês, crescendo 0,4% ante 0,2% em julho.

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“O cenário é de normalização. Os empregos em construção residencial, setor altamente cíclico, atingira novo máximo no atual ciclo, alcançando 951 mil empregos, mas com a queda nas unidades em construção devemos observar uma moderação nesses empregos. É um resultado com bastante nuances, mas os dados são em linha com um melhor equilíbrio entre oferta e demanda por emprego”, comenta Valério.

O economista lembra que o objetivo do Fed seria levar a economia americana para uma adição média de 200 mil empregos, vista hoje como o número que mantém a taxa de desemprego constante. “Sendo assim, esperamos que o Fed inicie o ciclo de cortes na próxima reunião do dia 18, cortando 25 pontos-base em cada uma das três reuniões restantes nesse ano.”

Essa visão de que a desaceleração não aponta para um recuo forte e acelerado da economia é compartilhada por Francisco Nobre, economista da XP. “Quando a gente olha para o filme do mercado de trabalho nos EUA, vê uma desaceleração acontecendo, que é consistente com a política monetária, que está contracionista, mas não vê uma preocupação com uma desaceleração muito grande”, explica.

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Ele lembra que os dados de atividade, como PIB, produção industrial e vendas no varejo ainda indicam que a economia continua bastante sólida, o que é consistente com projeções de um pouso suave. Ao mesmo tempo, o lucro das empresas continuam crescendo e os bancos parecem estar bem capitalizados, cita Nobre.

“A gente não vê uma preocupação grande de recessão no curto prazo. Nesse contexto, seria apropriado o Fed começar devagar, com corte gradual de 0,25 pp. e em novembro e dezembro ver se é apropriado conduzir de forma gradual ou acelerar”, comenta.

Emprego é dado mais importante hoje

Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, por sua vez, destaca que os sinais de desaceleração do mercado de trabalho vão ter mais importância na próxima decisão do Federal Reserve do que a inflação, que está sob controle, apesar de ainda acima da meta.

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“O recuo de agosto na taxa de desemprego deve levar o Fed a fazer um corte de 0,25 na taxa de juros. Se o desemprego tivesse subido mais, aumentariam as chances de uma redução maior”, analisa Claudia.

Andressa Durão, economista do ASA, também avalia que os níveis atuais do payroll não são compatíveis com uma recessão, embora a média de três meses mostre uma clara tendência de desaceleração, o que traz riscos.

“A totalidade dos dados não sugere que a economia americana esteja em recessão, mas os riscos aumentaram com os dados de mercado de trabalho divulgados ao longo da semana, já em níveis considerados ‘normais’. Apesar de uma recessão não ser cenário base, essa normalização aconteceu rapidamente, depois de um longo período de aperto, o que sugere agora rápida normalização da política monetária por parte do Fed”, pondera.

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Por enquanto, segundo a economista do ASA, com o cenário atual, o Fed pode seguir com cortes seguidos de 25 pontos-base. “Caso haja sinais de piora adicional do mercado de trabalho, o Fed aumentará o ritmo de queda dos juros.”

Para Fernando Bresciani, analista de investimentos do Andbank, um payroll um pouco mais fraco é bom e reforça que o mercado está desacelerando. Ele concorda que esses dados indicam que talvez não haja necessidade de um corte de 50 pontos em setembro, mas sim de 0,25 p.p..

Corte maior é possível?

Para Danilo Igliori, economista chefe da Nomad, os participantes do comitê de política monetária, o Fomc não terão uma escolha óbvia para fazer. “Após um ano de manutenção da taxa em patamar alto, o natural seria iniciar o ciclo com um movimento menor, mas os dados fracos de atividade e o temor de que algo mais importante esteja em formação pode motivar uma largada mais intensa. Não vai faltar emoção até o dia 18”, comenta.

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O economia lembra que, antes da divulgação do relatório de emprego as apostas indicavam um corte de 0,25 ponto percentual com 60% de probabilidade. Após o conhecimento dos números, o cenário se inverteu com o mercado atribuindo 60% de probabilidade para um corte de 0,50 p.p.

Mas Marcos Moreira, sócio da WMS Capital, vê possibilidade de um Fed mais agressivo no corte de juros na próxima reunião. Para ele, com a inflação desacelerando consideravelmente nos últimos meses, aumentando a confiança do Fed no cumprimento da meta, e também com base nos últimos discursos do Jerome Powell, a grande dúvida do mercado está na magnitude desse corte.

“Considerando que Fed tem mandato duplo [inflação e emprego], tanto o payroll de agosto quando revisões aumentaram significativamente a possibilidade de um corte de 0,50 p.p. Nosso cenário-base estava em 0,25 p.p., mas vemos probabilidade bem mais real de 0,50 p.p. por ter um Fed mais sensível aos dados de mercado de trabalho do que com a inflação”, diz Moreira.

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Para Étore Sanchez, economista chefe da Ativa Investimentos, a divulgação foi liquidamente mais suave (“dovish”), reforçando a perspectiva de que o Fed deverá iniciar o ciclo de afrouxamento de forma mais agressiva, com um corte de 50 pontos-base. “Além disso, aumenta a probabilidade de um ciclo de afrouxamento ainda mais profundo este ano.”

Mas Rodrigo Cohen, analista co-fundador da Escola de Investimentos, o ideal para o Fed seria fazer uma primeira redução em 0,25 p.p., uma vez que o mercado não está nesse momento pensando num pouso mais brusco (“hard landing”) da economia americana.

“Acho um risco muito grande reduzir 0,50 p.p. agora e eles não devem fazer isso. Pode ser que na próxima decisão isso mude, talvez com mais informações que tragam segurança para o Fed aumentar o ritmo”, pondera.