Alta dos serviços em julho sugere PIB e inflação maiores – e dúvidas sobre a Selic

Projeções de economistas de crescimento do PIB no terceiro trimestre podem ser revistas para cima; não há consenso se atividade aquecida pode acelerar inflação até o final do ano

Roberto de Lira

Mulher usa celular e computador em um café em São Paulo (Foto: Nacho Doce/Reuters)
Mulher usa celular e computador em um café em São Paulo (Foto: Nacho Doce/Reuters)

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O início forte do setor de serviços no terceiro trimestre do ano – o IBGE divulgou hoje que o segmento teve crescimento mensal em julho de 1,2% e de 4,3% na comparação anual – já começa a sinalizar para economistas que a atividade econômica pode desacelerar menos que o previsto. Além disso, eleva as dúvidas se haverá pressão inflacionária até o final do ano, elevando as preocupações do Banco Central em suas decisões de juros.  

Para Claudia Moreno, economista do C6 Bank, boa parte da surpresa de julho na Pesquisa Mensal de Serviços – analistas estimavam uma variação nula ou ligeiramente negativa no indicador – pode ser atribuída, principalmente, ao desempenho dos serviços prestados às famílias (-0,2%) e dos serviços profissionais, administrativos e complementares (4,2%), que tiveram um resultado acima da expectativa. 

Para ela, depois do resultado robusto de hoje, é possível que a desaceleração econômica prevista para o terceiro trimestre seja mais branda do que o esperado. “Os próximos dados de atividade darão mais clareza sobre o ritmo de esfriamento da economia. Por ora, os dados mostram que o setor continua se beneficiando do mercado de trabalho aquecido, devendo fechar o ano com uma expansão próxima de 3%”, estima. 

Na avaliação de André Valério, economista sênior do Inter, a demanda por parte das famílias enfraqueceu no mês, já sendo o terceiro mês consecutivo de desaceleração nesses serviços, que estão em clara tendência de queda. No acumulado em 12 meses, por exemplo,  desaceleraram para 3,9%, menor valor desde setembro de 2021.

“Portanto, mesmo com o bom desempenho no mês, o resultado provavelmente não se traduzirá em pressões inflacionárias de serviços, tendo em vista a demanda enfraquecida, o que já se pode observar no IPCA de agosto”, comentou.

Em sua análise, a XP afirma que é preciso ponderar que as atividades de publicidade e propaganda contribuíram significativamente para o desempenho em julho, por conta de uma grande empresa de espaços publicitários rever seus números após relatar receitas subestimadas. “Se não fosse pelo salto nessa categoria, o índice de serviços teria crescido perto das projeções”, diz o relatório.

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Também foi destacado que os Serviços de Transporte caíram em julho, tanto o rodoviário como o aéreo. “Ao todo, os números de julho não alteram nossa visão de que a atividade doméstica continuará crescendo no curto prazo, embora de forma mais moderada em relação ao primeiro semestre do ano”, diz a XM.

O XP Tracker para o crescimento do PIB do 3º trimestre está agora em 0,6% na comparação com o trimestre anterior e em 3,8% na anual. A estimativa é que o PIB brasileiro cresça 3,1% em 2024.   

Serviços às famílias perdem força

Matheus Pizzani, da CM Capital, por sua vez, afirma que a análise da composição do indicador mostra que houve surpresas pontuais em relação ao que o mercado projetava para o período, uma vez que alguns dos principais grupos que compõem o indicador sofreram queda, como nos casos dos serviços prestados às famílias.

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Para ele, em termos de atividade econômica, o resultado de julho estende para o terceiro trimestre a perspectiva positiva que já havia sido desenhada no período imediatamente anterior, reforçando a importante participação do setor de serviços para o PIB de 2024.

“No caso específico do setor de serviços, a dinâmica do terceiro trimestre dependerá essencialmente da manutenção ou não da composição do resultado de julho, uma vez que fatores sazonais positivos só devem voltar a atuar no resultado do setor durante o último trimestre do ano, quando a demanda pelos serviços dos grupos de alojamento e alimentação e transportes volta a ganhar força.”

Leonardo Costa, economista do ASA, também diz ver um crescimento forte nos serviços no começo do 3º trimestre, porém com menos intensidade no consumo das famílias. “A expectativa para o período segue sendo de desaceleração gradual, vindo de crescimento forte na 1ª metade do ano”, lembra.

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Na opinião de Igor Cadilhac, economista do PicPay, a atividade econômica brasileira continua apresentando um bom desempenho, sustentada por um mercado de trabalho em pleno emprego, crescimento da massa salarial e um ciclo de crédito benigno.

“Para o futuro, esperamos que esse cenário se mantenha ao longo do ano, apesar da recente deterioração do quadro inflacionário e da consequente necessidade das taxas de juros elevadas por mais tempo.”

A análise de Étore Sanchez, economista dada Ativa Investimentos, vai na mesma linha. Ele destaca, no entanto que, como se trata apenas do primeiro dado do trimestre, ainda é precoce revisar a projeção de crescimento do PIB de 2024, que está em 2,7%.

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“No entanto, nossa projeção já ganha perspectiva de alta. Para a política monetária, os fortes dados de atividade devem se refletir nas expectativas de inflação, o que pode levar a uma reação mais aguda do BC. Sem sombra de dúvidas, o dado contribui para as perspectivas  de um ciclo de alta.”

O Bradesco, por sua vez, considera que o aumento dos serviços em julho foi muito superior à  projeção do mercado e que o resultado deixa um carrego estatístico de 2,1% para o terceiro trimestre, após uma alta de 0,6% no trimestre encerrado em junho.

“O crescimento dos serviços foi significativo em julho e sugere que o PIB do terceiro trimestre desacelere menos do que o antecipado. Com esse dado, nossa projeção para o PIB de 2024 segue com viés de alta”, diz a análise.