Crescimento moderado do PIB no 3° tri é indício de perda de força da atividade, dizem analistas

Consumo das famílias ainda veio forte, mas PIB da indústria desacelerou, assim como a agricultura; projeção para 2023 está entre 1% e 1,2%

Roberto de Lira

Produção em fábrica de Jundiaí, no interior de São Paulo (Foto: Divulgação/Dexco)
Produção em fábrica de Jundiaí, no interior de São Paulo (Foto: Divulgação/Dexco)

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Embora a alta de 0,4% do PIB do terceiro trimestre ante o trimestre anterior tenha representado a quinta variação positiva seguida e possa levar a um crescimento mais forte em 2022, os principais indicadores divulgado hoje pelo apontam para uma desaceleração daqui para a frente. Segundo analistas, já há indícios de que a atividade econômica está perdendo força.

Para Gustavo Cruz, estrategista da RB investimentos, é bom destacar que uma análise só do terceiro trimestre é como olhar para o retrovisor. “Esse ímpeto do 3° tri enfraqueceu no quarto trimestre”, afirmou.

Entre os todos os indicadores antecedentes que mostram isso, ele listou o fluxo nas rodovias pedagiada, que começou a cair no final de agosto, os último dados de produção Anfavea, assim como os licenciamento da Fenabrave e a expedição de papel ondulado. “E a gente viu a Black Friday mais fraca, a Serasa mostrou consulta por proteção ao crédito bem menor e dados de confiança da FGV numa queda rápida”, completou

Para ele, o quarto trimestre deve rondar a estagnação, uma estabilidade com tendência até mais fraca do que a projetada há alguma tempo.

Sobre o resultado divulgado hoje, Cruz citou que o setor de serviços veio mais forte que o projetado, assim como o consumo das famílias, que acabou recebendo uma ajuda extra dos auxílios do governo federal no terceiro trimestre.

O Itaú também comenta em relatório assinado por Natalia Cotarelli e Matheus Fuck a economia está desacelerando no segundo semestre de 2022 devido à redução da renda disponível e ao efeito defasado da política monetária contracionista. “Mantemos nossa perspectiva de que o ritmo continuará desacelerando à frente. No entanto, a divulgação e as revisões de hoje trazem um viés de alta para nossa projeção de crescimento do PIB para 2022 devido ao carrego estatístico mais forte.”

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Redução de marcha

A análise do relatório XP Macro Watch vai na mesma linha e pergunta se essa não pode se uma redução de marcha antes da curva. “A atividade econômica brasileira cresceu moderadamente no último trimestre, praticamente em linha com as estimativas. Os principais indicadores apontam para uma desaceleração ainda maior daqui para frente. Portanto, continuamos projetando que o PIB total crescerá 1,0% em 2023”, diz o texto.

A projeção é que atividade doméstica deva desacelerar ainda mais daqui para frente, na esteira de condições financeiras mais apertadas, alto endividamento das famílias e enfraquecimento da economia global.

O XP Tracker para o PIB do quarto trimestre aponta para um ganho de 0,1% no trimestre (2,4% na comparação anual). “Como resultado, nossa projeção de expansão de 2,8% para o PIB do ano de 2022 está levemente inclinada para cima”, diz o relatório.  A estimativa para o crescimento do PIB em 2023 permanece em 1,0%, sem viés.

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Analisando os dados desagregados do trimestre, a XP também destacou o setor de serviços, que cresceu pelo nono trimestre consecutivo e ficou 6% acima dos níveis pré-pandemia. “Seis dos sete componentes do PIB de Serviços registraram ganhos na comparação trimestral”, aponta o relatório. Mas o PIB da indústria desacelerou (de 1,7% no 2° tri para 0,8% no 3°), com sinais mistos em seus componentes.

O Goldman Sachs em seu relatório que o crescimento no 3° trimestre foi generalizado, com contribuições positivas dos principais setores econômicos do lado da oferta (serviços e indústria), e do lado da demanda com impulsos positivos dos três principais componentes da demanda doméstica.

Dadas as grandes revisões de dados, a projeção do banco de investimento para crescimento real do PIB em 2022 subiu para 3,2% (dos 2,9% anteriores). “Em 2023, esperamos que a economia cresça 1,2%.”

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Essa previsão menor para o ano que vem é motivada pelos retornos marginais decrescentes da dinâmica de reabertura econômica. Além disso o Goldman Sach cita as condições monetárias e financeiras domésticas apertadas, altos níveis de endividamento das famílias e a incipiente reviravolta no ciclo de crédito como “ventos contrários à atividade de serviços no final de 2022 e no primeiro semestre de 2023.”

“Inverno”

Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, lembrou que o terceiro trimestre é historicamente mais fraco que os demais e está é uma explicação para a variação trimestral ter recuado de 1,2% para 0,4%. “É como uma virada de ciclo para o final do ano, com as empresas se organizando para a reta final, o que gera uma grande expectativa”, comenta,

Como boa parte da expectativa não se confirmou no terceiro trimestre e o quarto trimestre já mostra algumas decepções, especialmente pelos dados do comércio, ele prevê “o inverno que está por vir” na economia brasileira.

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“O comércio teve um recuo de -0,1%, o que é reflexo da confiança do consumidor, que teve o seu poder de compra comprimido ao limite por conta da inflação. E por mais que os programas do governo tenham contribuído para a ‘distribuição’ de renda, muito dessa renda foi usado para necessidades básicas como mostra os dados do IPCA de outubro e novembro e menos para gastos no comércio, por exemplo”, diz Alves.

“Soma-se a isso uma população cada vez mais endividada, com difícil acesso ao crédito, e a um custo cada vez mais elevado. Tudo isso contribui para a diminuição do ritmo da economia brasileira, e que deve ser acentuada com a piora do cenário fiscal, demanda mais do que contratada para 2023”, adverte.

Alves também lembra que os fatores externos devem pesar com os EUA com inflação elevada, tendo que elevar as suas taxas de juros para esfriar a economia, e guerra entre Rússia e Ucrânia ajudando a inflacionar o preço do petróleo e outras commodities como grãos. Isso somado ao desempenho da China seguindo com a política da covid zero, com os lockdowns esfriando a economia local. “Tudo isso contribui para a menor atividade econômica do Brasil, já que os seus principais parceiros comerciais estão com os freios de mão puxados.”