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O Hurb (antigo Hotel Urbano) contestou na 3ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro a Ação Civil Pública (ACP) do Instituto Brasileiro de Cidadania (Ibraci), que pede, entre outras coisas, o bloqueio de bens da empresa e dos sócios e compensação aos clientes por danos morais.
“Muito ao contrário do que está (parcamente) alegado na petição inicial, o número de reclamações realizadas contra o Hurb é ínfimo, quando comparado ao número de pacotes comercializados”, afirma a empresa em sua manifestação no processo judicial.
O escritório Palheiro & Costa Sociedade de Advogados, que defende o Hurb no processo, diz também que o Ibraci não juntou “absolutamente qualquer documento à sua petição inicial” e que a ACP foi feita “com base exclusiva em manchetes de imprensa” (veja mais abaixo).
O Hurb tem sofrido com problemas em série nos últimos meses, e a crise se intensificou após o CEO João Ricardo Mendes renunciar ao cargo depois de expor dados confidenciais de um cliente e gravar um vídeo xingando-o.
Além da crise de imagem, o site de viagens também é alvo de uma investigação do governo federal, devido ao crescimento no número de reclamações de clientes, e tem até as meia-noite desta quinta-feira (4) para comprovar que consegue honrar os pacotes de viagens que tem vendido.
A medida cautelar da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, exige que a empresa apresente “esclarecimentos sobre a sua situação econômica e financeira e sobre a previsão de recursos para execução contratual de novos pacotes de viagens ofertados” e impõe multa de R$ 50 mil por dia se a empresa descumprir a intimação.
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Segundo o Procon-SP, “a empresa não vem cumprindo com as condições ofertadas, nos termos em que foram acordados com seus clientes”. O órgão de defesa do consumidor diz também que o Hurb tem inclusive marcado e desmarcado viagens e dado calote em hotéis, além de não estar reembolsando os clientes conforme o acordado em contrato.
O Ibraci ingressou com a Ação Civil Pública contra o Hurb na segunda-feira (1º), e a empresa se manifestou no processo na quarta-feira (3), antes mesmo de ser intimada pelo juízo. Ela pediu que o processo seja “extinto sem resolução do mérito, por força de litispendência”.
A litispendência ocorre quando há dois processos judiciais simultâneos, sobre o mesmo tema, e neste caso uma das ações é anulada para evitar decisões diferentes e/ou conflitantes. A litispendência só pode ser alegada por uma das partes antes da discussão do mérito da ação.
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O Hurb afirma no processo do Ibraci que já é alvo de uma outra Ação Civil Pública (ACP), do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ), que tramita na 4ª Vara Empresarial do Rio. A empresa é representada na ação pelo escritório Palheiro & Costa Sociedade de Advogados.
“É certo que a causa de pedir e os pedidos formulados nas duas ações são os mesmos – isto é, alegado descumprimento de oferta e requerimentos liminares de bloqueio de valores e pedidos de devolução do montante contratado e indenizações por danos morais”, afirma a empresa na sua manifestação.
“Como consequência, e considerando que referida Ação Civil Pública foi distribuída anteriormente, em 16/01/2023, enquanto a presente ação foi distribuída em 01/05/2023, deve ser o presente feito extinto sem resolução do mérito, na forma do art. 485, V do Código de Processo Civil”, defende o Hurb.
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A empresa pede ainda que, “na remota hipótese de se entender que não há litispendência entre
a presente Ação Civil Pública e aquela”, o processo do Ibraci seja enviado para a 4ª Vara Empresarial, onde é analisado o do MP-RJ. “Seria imperioso reconhecer a existência de conexão entre as ações”.
Ela afirma também que o juízo da 4ª Vara Empresarial não atendeu aos pedidos de liminar feitos pelo MP estadual e que apresentou a sua contestação no processo em 27 de março. Em 13 de abril a Promotoria foi intimada a apresentar sua réplica, e até o momento não há uma decisão no processo.
Crise no Hurb
O Hurb tem sofrido com uma série de problemas nos últimos meses, devido ao crescimento no número de reclamações dos clientes. A crise se intensificou nas últimas semanas, após a renúncia do seu CEO e a investigação aberta pela Senacon.
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A empresa foi criada há 12 anos, inicialmente com o nome Hotel Urbano, e se tornou uma das maiores agências de viagens on-line do país. Ela foi fundada por ex-CEO João Mendes e seu irmão, José Eduardo Mendes.
O sucesso do site ocorreu devido às parcerias com hotéis e companhias aéreas que permitiam à empresa vender pacotes de viagens, hospedagens e passagens a preços acessíveis. Mas, assim como o setor de turismo como um todo, a empresa sofreu com a pandemia e as restrições de circulação de pessoas.
A companhia vendeu pacotes de viagem com datas flexíveis durante a pandemia, válidos por até dois anos, mas agora está enfrentando dificuldades para honrar os contratos. Ela então passou a atrasar o pagamento de parceiros, como hotéis e resorts, e acumular queixas de clientes, que não conseguem viajar ou enfrentavam problemas durante suas viagens.
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Milhares de reclamações
Milhares de pessoas têm registrado queixas contra a empresa no site consumidor.gov.br e em Procons de todo o país, além da plataformas como o Reclame Aqui, nos útlimos meses. As principais são:
• Viagens já compradas estão sendo canceladas sem aviso prévio;
• Confirmações de reservas não estão sendo feitas (de pacotes, passagens e hospedagens);
• Clientes não conseguem marcar datas de viagens já compradas;
• Alguns clientes conseguem embarcar, mas ao chegar ao destino não há reserva no hotel;
• Prazo do estorno dos valores pagos não cumprido pela empresa após cancelamento;
Foram mais de 7 mil reclamações só no primeiro trimestre no site consumidor.gov.br, contra 12 mil em todo o ano passado, segundo a Senacon. Além disso, o índice de solução da empresa caiu de 64% em 2022 para 50% em 2023.
No Reclame Aqui foram 29.468 queixas nos últimos 6 meses (entre 1º de outubro de 2022 e 31 de março de 2023). Segundo a plataforma, a empresa teve 55,5% de índice de solução, a nota dos consumidores foi de 4,23 e a reputação do Hurb caiu de boa para ruim.
O que diz a empresa
O Hurb afirma na ACP do Ibraci que “está no mercado há mais de uma década e consolidou-se como uma das maiores agências de turismo online do país”. Diz ainda que “efetuou uma verdadeira revolução em seu segmento, oferecendo serviços a preços jamais praticados por suas concorrentes, democratizando, assim, o turismo no país – sua verdadeira missão”.
O Palheiro & Costa Sociedade de Advogados diz também que o Ibraci não juntou “absolutamente qualquer documento à sua petição inicial” e que a ACP foi feita “com base exclusiva em manchetes de imprensa”.
“Muito ao contrário do que está (parcamente) alegado na petição inicial, o número de reclamações realizadas contra o Hurb é ínfimo, quando comparado ao número de pacotes comercializados”, defende a empresa.
Ela afirma que teve 1,86% reclamações por cliente em 2020 (679.664 viajantes e 29 mil reclamações) e que essa porcentagem subiu para 4,8% em 2021 (803.536 clientes e 91 mil queixas) e 8,1% em 2022 (1.235.068 viajantes e 155 mil reclamações).
“Neste ano de 2023, os números apontam 441.133 viajantes com operação finalizada até o momento (estando a empresa em plena atividade), com 52 mil reclamações (percentual de 7,5%)”, pontua o Hurb. “O número de reclamações é baixo em comparação ao total de viagens comercializadas, sendo absolutamente insuficientes as alegações, sem qualquer prova, deduzidas pelo instituto”.
O que pedem as ações coletivas
O Ibraci afirma em sua Ação Civil Pública que o Hurb descumpre as oferta; faz publicidade enganosa; e não restitui valores já pagos aos clientes. Por isso, pede em regime de urgência (tutela antecipada):
• Bloqueio judicial das contas bancárias da empresa, para garantir o pagamento de futuras indenizações; • Desconsideração da personalidade jurídica do Hurb, para determinar o bloqueio judicial das contas bancárias dos sócios/acionistas administradores da empresa;
No mérito, o instituto pede a confirmação dos pedidos acima e também a condenação do Hurb a pagar:
• Compensação por danos morais individuais;
• Indenização por danos morais coletivos;
• Restituição aos consumidores individualmente considerados dos valores pagos pelos serviços
contratados e que não foram prestados.
Já o MP-RJ ingressou com a sua ACP em 14 de dezembro de 2022, devido às “inúmeras reclamações oriundas da má prestação de serviço desenvolvido pelo réu”. A promotoria aponta um alto número de
reclamações de clientes perante à Senacon e ao Procon e afirma que o Hurb não está respeitando as datas escolhidas pelos consumidores e cancelando pacotes adquiridos.
O MP pediu liminarmente que o Hurb:
• Reembolse imediatamente os valores pagos pelos consumidores que adquiriram pacotes turísticos até a entrada em vigor da Medida Provisória nº 948/20, de 8 de abril de 2020;
• Reembolse imediatamente os valores pagos pelos consumidores que adquiriram pacotes turísticos entre 31/12/2020 e 15/07/2021, caso o cancelamento do serviço turístico correlato tenha ocorrido por causa da pandemia;
• Reembolse imediatamente os valores pagos pelos consumidores que adquiriram pacotes turísticos entre 31/12/2021 e 04/07/2022, condicionado à existência de situação de emergência sanitária que tenha implicado no cancelamento dos serviços correlatos;
• Reembolse imediatamente os valores pagos pelos consumidores que adquiriram pacotes turísticos a partir de 22/05/2022;
• Só use as previsões da Lei n.º 14.046/2020 caso seja comprovado que o cancelamento dos pacotes turísticos e/ou de viagem se deu por força exclusivamente de surtos de Covid-19;
• Cumpra com o ofertado, observando as datas opcionais fornecidas pelo consumidor;
• Só adie reembolso novamente se houver novas modificações na Lei n.º 14.046/20 ou outras normas
correlatas;
A promotoria pediu também a indisponibilidade de bens e/ou valores depositados em nome da empresa, em quaisquer instituições financeiras brasileiras, para garantir o reembolso de clientes. Pediu ainda, no mérito da ação, que haja indenizações por danos morais individuais e coletivos.