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Nos últimos três meses, testemunhamos muitos dramas pessoais e empresariais. Histórias de anos de esforço e empreendedorismo se encerraram em semanas. Não resistiram ao choque duplo de oferta e demanda causado por um germe invisível.
Sim, desta vez a natureza foi o ator principal. Não foi a crise do subprime, a quebra da bolsa, ou um ataque terrorista. Não há culpados.
Não quero aqui desprezar tais dramas, mas apenas sugerir alternativas para aqueles que precisarão seguir em frente.
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Em seu livro “Guns, Germs and Steel: The Fates of Human Societies”, Jared Diamond mostra o quanto a convivência com germes e doenças foi um fator histórico decisivo. Como as doenças e os microrganismos involuntariamente moldaram o mundo que conhecemos.
A sedentarização, a produção de alimentos em escala, o adensamento populacional em cidades e a convivência com animais propiciaram o aparecimento de doenças e a consequente adaptação das populações à existência delas.
De certo modo, tais enfermidades foram um elemento chave para a expansão das sociedades e seu desenvolvimento ao longo dos séculos. Exemplos bem conhecidos são as histórias da conquista da América e da Peste Negra.
Portanto, o que vivemos agora obviamente não é algo novo. Epidemias sempre nos forçaram a resistir e emergir mais fortes.
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É hora, portanto, de avançar. Traçar cenários concretos de saída e pensar em como será a vida e, por consequência, o ambiente econômico a partir de agora.
Em lives, mesas redondas e encontros privados, muitos empresários me questionam por alternativas para a retomada e sobre como obter capital diante de um cenário tão desafiador. Mais especificamente, eles relatam suas dificuldades em obter crédito.
O noticiário mostra credores justificadamente avessos ao risco neste momento de grandes incertezas. Além de estarem às voltas com um volume maciço de renegociações, a capacidade deles de avaliar crédito está extremamente prejudicada e o temor da seleção adversa altera as réguas de concessão de crédito em geral.
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Não por acaso, a despeito dos esforços governamentais na direção correta, os recursos não têm chegado “na ponta da linha”.
Nesse caso, minha visão é a de que o melhor caminho para os empresários e executivos é auxiliar os credores a ter uma melhor percepção de seus negócios, bem como tentar oferecer a eles alternativas para a mitigação de riscos na concessão de crédito.
Apresentar uma melhor visão de seus negócios, o momento pelo qual estão passando e de que forma conseguirão repagar o empréstimo ou financiamento solicitado. Em resumo, mostrar suas fortalezas.
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Pedidos desesperados e mal preparados tenderão a afastar ainda mais os credores. Afinal, ninguém quer ou pode perder dinheiro, especialmente neste momento.
Meu objetivo aqui é auxiliá-los a construir este raciocínio e mostrar quais ângulos devem ser explorados, especialmente por aquelas empresas que de fato poderão passar por esta crise, saindo fortalecidas do processo.
Começo a 30 mil pés, com o desenho do cenário.
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Não me parece razoável traçar um cenário provisório num processo de obtenção de crédito. É preciso planejamento. Ter horizonte. O que nesta crise é tarefa das mais difíceis.
Contudo, o empresário que conhece seu próprio negócio é quem melhor deve conseguir comunicar com clareza o futuro de curto e médio prazo de sua empresa.
Partindo de uma premissa que me parece bem razoável, a de que não teremos saída médica no curto (e, talvez, no médio) prazo, o que me parece mais plausível é o que alguns especialistas batizaram de saída social.
Ou seja, passada a fase mais aguda da crise, a sociedade deve retomar progressivamente sua atividade num novo paradigma, que muitos vêm chamando de “novo normal”.
A hipótese comportamental, baseada no bom senso, é a de que as pessoas tenderão a voltar às suas vidas mantendo seu comportamento habitual no limite do possível, com um aumento de preocupação com a saúde e medidas sanitárias. Autoridades e empresas deverão induzir essa maior preocupação, e isso vai gerar consequências práticas para todos setores econômicos em diferentes graus.
Há setores naturalmente vencedores, perdedores e aqueles que precisam passar por pequenas adaptações para essa nova realidade.
Setores como infraestrutura de dados, varejo online, educação a distância, saúde e farmácia e deliveries, em geral, claramente se beneficiaram com a crise.
Já setores como turismo, aviação, varejo físico (exceto alimentos) e entretenimento presencial precisarão se reinventar.
Outros setores terão que se ajustar ao novo comportamento do consumidor. Isso exigirá mais flexibilidade operacional, financeira e cultural das empresas daqui para frente.
Considerando o seu ramo de atuação, trace um cenário de partida, de modo que seja capaz de projetar receitas, custos e despesas de agora para frente. Coloque-se no mercado atual e mostre sua nova matriz “SWOT” (Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças, em português).
Tente, repito, passar uma visão de maior sustentabilidade para seu modelo de negócio. Situações provisórias ampliam incertezas, e, obviamente, o risco de sua operação e do credor.
Mostre como você está se reinventando ou aproveitando as oportunidades que esta conjuntura oferece para seu negócio.
Não esconda os problemas, especialmente os de ordem financeira. Comunique-os com clareza. Em geral, deve haver uma tolerância maior a desafios relacionados a iliquidez. Ou seja, descasamentos momentâneos entre receitas e obrigações.
Para isso, é importante mostrar sua capacidade de gerar valor no médio prazo. Comunicar seu posicionamento de mercado e quais medidas estão sendo elaboradas para reagir ao cenário atual, seja no âmbito financeiro, seja no operacional.
Mais importante: a partir do planejamento de cenário discutido acima, construa um planejamento financeiro minimamente consistente, mostrando sua capacidade de reação.
Se seu problema é de solvência, ou seja, incapacidade estrutural de honrar suas obrigações como consequência da crise, os credores perceberão com facilidade. E isso, normalmente, se expressará porque seus ativos terão sofrido impairments (reavaliações) com desvalorizações significativas (inadimplência, obsolescência ou inadequação de estoque, perda de valor de ativos reais).
Nesse caso, a obtenção de novos créditos estará prejudicada e o caminho provável será o de um processo de reestruturação cuja severidade dependerá de cada caso.
Procure solicitar alternativas ligadas à sua cadeia mercantil, no limite do possível. Supply chain e vendor financing são modalidades de crédito naturalmente menos arriscadas e tenderão a ser melhor recebidas por credores em geral. Créditos associados ao relacionamento entre clientes e fornecedores possuem uma blindagem natural. Aproveite-se dela.
Por fim, sempre que possível, ofereça garantias adicionais. O compromisso com o negócio costuma ser um potente mitigador de riscos aos olhos dos credores. Além da própria mitigação de risco objetiva que as garantias oferecem.
Em resumo, mostre-se um parceiro do seu credor. Seja transparente. Construa uma estratégia consistente considerando o cenário que se apresenta. Seja, acima de tudo, flexível.
Encerro aqui com as palavras do escritor mineiro Fernando Sabino, em seu “Encontro Marcado”: “Faça da interrupção um caminho novo, da queda um passo de dança (…), da procura um encontro.”