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Recentemente tivemos a crise da tradicional varejista Lojas Americanas. O assunto já foi muito discutido, mas questiono tanto as premissas quanto as conclusões que tenho lido ou ouvido. Achei importante colocar os três pontos a seguir para reflexão.
De uma maneira geral, boa parte da imprensa atribui como principal causa, com diferentes graus de intensidade, a “ganância ilimitada” dos maiores e mais bem sucedidos empresários que o Brasil já teve. Mas vamos aos fatos.
Em primeiro lugar, salta aos olhos, mais uma vez, a falha inaceitável das empresas de auditoria. Como sempre, tentam se esconder nos empolados textos em que, basicamente, eximem-se de qualquer responsabilidade pelos seus trabalhos. Um paradoxo evidente, mas que sobrevive, creio eu, pelo oligopólio delas, que oferecem os mesmos serviços com as mesmas ressalvas.
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Junte-se a isso o fato de serem “inevitáveis”. A legislação exige que as empresas de capital aberto sejam auditadas. O mercado, em mais uma de suas “sobre-simplificações”, associa qualquer auditoria que não seja feita pelas “Big 4” a maior risco e indício de problema nas empresas.
Mais uma vez vemos o triunfo da esperança sobre a experiência. Ao longo do tempo e em todo o mundo, o que não faltam são exemplos de empresas que tiveram sérios problemas, apesar dos pareceres positivos dos auditores.
Em segundo lugar, temos as empresas de rating, “irmãs” em vários aspectos das empresas de auditoria. Elas constituem um oligopólio, são mandatórias por conta de uma exigência cega e burra do mercado e apresentam um histórico absolutamente insatisfatório em relação a sua razão de ser e o que se espera delas.
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E em terceiro lugar, certamente no aspecto mais brasileiro dessa crise, está a presunção irresponsável e irracional de quem seriam os “culpados/responsáveis” pelo problema.
A imprensa, as mídias sociais e os obviamente conflitados são rápidos em apontar o “trio 3G”, Carlos Alberto Sicupira, Jorge Paulo Lemann e Marcel Telles, como “tubarões gananciosos” que teriam dado um golpe no mercado. Apresento algumas considerações básicas que levam qualquer pessoa com honestidade intelectual a contestar o ruído inconsistente oferecido pelas mídias.
O primeiro ponto é pensar: “Como acionistas relevantes da empresa, quem mais perdeu dinheiro com a crise?”. Mesmo supondo que tivessem se beneficiado de alguma forma do “buraco das Americanas”, qual seria o resultado líquido após a desvalorização das ações?
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O segundo é comparar a relevância do interesse econômico das posição dos três em relação ao patrimônio de cada um. Seria de uma burrice imensa cometer atos que sacrificassem suas reputações por um montante de dinheiro grande, sem dúvidas, mas pequeno no contexto do patrimônio do trio.
Patrimônio esse que, sim, foi construído com ambição. Mas de forma honesta e, coisa estranha a muitos dos grandes empresários brasileiros, assumindo riscos econômico-financeiros relevantes.
Mesmo que tivessem embolsado todo o valor do “buraco” das Americanas, que me parece ter sido perdido operacionalmente em grande parte, estaríamos falando de um valor certamente menor do que já dedicaram e continuam a dedicar de maneira tão eficiente a atividades sem fins lucrativos voltadas ao Brasil.
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Isto nos leva ao ponto que considero o mais relevante: a questão reputacional. Poucos empresários têm oferecido maiores benefícios econômicos, diretos e indiretos, ao Brasil do que os três ao longo das últimas muitas décadas.
Quantos empregos eles geraram e ainda geram? Quantos profissionais de primeira linha a nível global foram cruciais para a formação? Eles ainda são criadores e patrocinadores da Fundação Estudar, e trouxeram para o Brasil a Endeavor, ONG internacional de incentivo ao empreendedorismo.
Mais recentemente, Jorge Paulo Lemann vem apoiando fortemente a Gerando Falcões, ONG de desenvolvimento social que atua em comunidades de todo o Brasil. O empresário também apoia o Instituto Proa, de qualificação técnico-operacional, e o Instituto Protea, de prevenção do Câncer de Mama em mulheres de baixa renda.
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Além disso, a Fundação Lemann apoia a Associação Bem Comum, de Sobral (CE), talvez a mais bem sucedida iniciativa educacional do Brasil, e a iniciativa Plantar Educação, desenvolvida na Amazônia pelo Instituto Gesto. Isso sem contar muitas outras iniciativas menos conhecidas da entidade.
O caso Americanas ilustra mais uma vez, como se necessário ainda fosse, a cultura autodestrutiva de certos setores do Brasil, que se reflete nas mais diversas frentes: a baixa atratividade para o capital estrangeiro, o grande êxodo de empresários e cérebros que vemos ao longo das últimas décadas. Como bem disse Tom Jobim, “no Brasil, o sucesso é uma ofensa pessoal”.
O culto ao que chamo de “ídolos errados” – jogadores de futebol que competem mais por fama do que por títulos; “famosos por não serem famosos” das redes sociais e programas de TV; políticos cujos maiores atributos são o que não representam – leva a formação de mais uma geração com baixa competitividade num mundo onde o conhecimento, o empenho e a conquista de riquezas ao custo de assunção de riscos e muito suor cada vez se destaca.
Precisamos de mais Jorge Paulos, versão brasileira do Warren Buffett, de nossos primeiros Bill Gates e Jeff Bezos. O primeiro passo para isso é valorizarmos os ídolos que levem a isso, e não os apedrejar.