Como o mercado imobiliário deve se mover com a reviravolta nos juros globais

Expectativas otimistas do começo de 2024 mudaram significativamente ao longo do 1º semestre, mas arrisco dizer que existem boas oportunidades nos FIIs. Especialmente em shoppings e galpões logísticos

Marcelo Hannud

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No início de 2024, trouxe neste espaço expectativas otimistas para o Brasil e especificamente para o setor imobiliário. Havia, naquele cenário, alguns elementos importantes para o otimismo, que em parte persistem, mas o principal era a expectativa do mercado de que estávamos entrando em um horizonte de queda duradoura da taxa básica de juros. E, neste caso, o panorama mudou significativamente ao longo do primeiro semestre.

O contexto macroeconômico se mostrou mais turbulento do que o esperado. No início do ano, havia a expectativa de um controle mais rígido dos gastos públicos, uma queda nos juros dos Estados Unidos e um governo brasileiro alinhado com o mercado financeiro. Mas o que se viu foi o contrário: declarações controversas e contraditórias do governo, aumento dos gastos públicos e a manutenção dos juros americanos em patamares historicamente altos.

O mercado imobiliário, principalmente o de moradia e dos FIIs (fundos imobiliários), é altamente sensível às taxas altas de juros, já que a compra do seu produto acontece majoritariamente: 1. por meio do crédito no caso dos residenciais e 2. visando a renda no caso dos FIIs. Com juros elevados, menos pessoas têm capacidade de adquirir imóveis e os bancos tornam-se mais restritivos e seletivos nas concessão do crédito. O resultado é um número menor de compradores potenciais e a redução no poder aquisitivo de quem permanece ativo no mercado. Ou seja, mesmo quem segue disposto a fazer negócio passa a procurar oportunidades de menor valor.

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Mas, apesar da descrição desconsoladora do impacto do novo cenário macroeconômico, o setor imobiliário se beneficia de uma característica singular: está presente em todas as atividades econômicas, o que permite que oportunidades surjam razoavelmente descoladas da conjuntura predominante. Vou elencar algumas dessas possibilidades, que é para onde quem tem interesse nesse setor deve olhar nos próximos meses.

Com a renda fixa permanecendo mais atraente, manter o ritmo de expansão no mercado imobiliário é um desafio. O mercado precisa de financiamento, mas, com juros altos, a classe média, que é o principal motor do setor, está cada vez mais excluída. A indústria tem buscado maior eficiência no ciclo produtivo, mas essa estratégia já atingiu seu limite. Como alternativa, as incorporadoras têm migrado para o segmento de altíssimo padrão, em que o financiamento não é uma necessidade premente e o investidor tem buscado segmentos que se descolam da conjuntura vigente.

Outro ponto importante a ser olhado ainda são os fundos imobiliários. O desempenho do IFIX (Índice de fundos imobiliários) estável é, na verdade, um resultado que considero sofrível. Logo, arrisco dizer que os FIIs já estão com preços descontados diante de uma renda fixa atrativa, com pouco espaço para pioras significativas. Não é uma tarefa simples, mas existem boas oportunidades, especialmente em segmentos como shoppings e galpões logísticos. E, mesmo com o cenário macro desfavorável, há ativos que ainda podem oferecer bons retornos.

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Outro exemplo são os data centers, aposta do mercado imobiliário que vem se consolidando ao longo do ano. Já tratei desse tema também aqui nesta coluna. O Brasil tem condições naturais, geográficas e energéticas favoráveis e é rico no ponto mais sensível que um projeto de data center necessita: a oferta de energia. Além disso, não há nenhum sinal de desaceleração na demanda mundial por espaço para armazenar e processar o crescimento geométrico de dados gerados diariamente.

Como último ponto, cito o cenário geopolítico global, marcado pelo desalinhamento ideológico e estratégico entre o Ocidente e países como China e Rússia. Do ponto de vista prático isso pode acelerar um deslocamento dos eixos produtivos globais. Explico: especialmente estados do Norte e do Nordeste brasileiro, que estão mais próximos aos centros de consumo da Europa e dos Estados Unidos, têm potencial para se tornar uma alternativa aos atuais polos de produção de bens de consumo, bens duráveis e bens industriais. O setor imobiliário poderá ser impactado de forma positiva para atender esta nova demanda e reorganização produtiva mundial.

Um exemplo de país que já entendeu este cenário e vem se beneficiando é o México – e, mais recentemente, a Argentina. Na América Central vale destacar a quieta Guatemala, que já se tornou o principal centro de distribuição naquela região. Por lá, os resultados já começaram a aparecer no setor imobiliário. Segundo dados levantados pela SiiLA, empresa de inteligência de mercado com foco no mercado latino americano, a taxa de vacância de imóveis nestes países é inferior a 5%. Quando olhamos para logística, essa taxa cai para patamares próximos a 2%.

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Em tempos de cenário macroeconômico desafiador, as oportunidades estratégicas são as que podem abrir novas perspectivas para o desenvolvimento do setor imobiliário. Vamos torcer para o Brasil não perder esta oportunidade.

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Marcelo Hannud

CEO e fundador da Aurea Finvest