Publicidade
Desde a formalização da nova regra fiscal na última semana de março, uma série de eventos tem possibilitado a discussão sobre o Banco Central iniciar o ciclo de corte da taxa Selic. Já é possível observar cortes implícitos na própria curva futura de juros: um de 25 pontos base no Comitê de Política Monetária (Copom) de junho, seguido pelo mesmo ritmo de corte na reunião de agosto.
Entendo que o primeiro fator a se considerar dentro desse conjunto de eventos é o novo arcabouço fiscal. Sua apresentação dentro do cronograma e a forma como foi estruturado reduziram aquela nuvem negativa de risco fiscal, principalmente o risco de descontinuidade. Quando comparado com a percepção de que não teríamos limite de gastos, a nova regra fiscal reduziu o risco de explosão da dívida, à medida que ela é evitável se mantivermos alguma consistência de crescimento econômico.
A inflação também está ajudando. Estamos vendo um cenário mais benigno para o IPCA, com núcleos comportados e uma desaceleração mais forte em alimentos e bens industriais. O alívio nos preços internacionais de commodities agrícolas e industriais, bem como a normalização das cadeias logísticas e de produção, têm sido essenciais para essa história. Além disso, os preços no atacado (IGP-M) estão mais tranquilos, com preços agrícolas inclusive rodando em deflação no acumulado em 12 meses.
Continua depois da publicidade
O crédito mais apertado tem freado e preocupado o ritmo da atividade econômica. As concessões de crédito estão desacelerando, a inadimplência está em níveis elevados e várias empresas de pequeno porte estão entrando com pedido de recuperação judicial, o que traz um cenário desafiador. Vale lembrar que o Banco Central já incorporou em seu balanço de riscos essas preocupações com o crédito na economia.
No lado político, é relevante o posicionamento de Lula em relação ao trabalho que Haddad tem feito na Fazenda, especialmente no novo arcabouço fiscal. Elogios e o endosso do esforço do ministro trazem de volta o Lula pragmático, pelo menos em relação à questão fiscal.
Na mesma direção, o clima tenso entre governo e Banco Central arrefeceu, as críticas estão mais amenas. Até mesmo o presidente da Câmara, Arthur Lira, mostrou-se disposto a ajudar no “meio-campo” entre Lula e Campos Neto.
Continua depois da publicidade
Do lado externo, o aperto monetário nos Estados Unidos parece não ir tão longe. Os últimos sinais da economia americana indicam uma economia mais fraca pela frente. Episódios no setor bancário exigiram ação do Federal Reserve (Fed) na liquidez e garantia de depósitos, aliviando as condições financeiras e colocando um alerta no setor de crédito. Indicadores de atividade ligados à manufatura e serviços mostram desaceleração, e a inflação parou de surpreender para cima, com uma composição positiva de arrefecimento do grupo de serviços e aluguéis. Além disso, o mercado de trabalho sinaliza uma tendência de diminuição na oferta de vagas.
O somatório de todos esses fatores tem ajudado na descompressão dos ativos brasileiros. Antes da semana de divulgação do arcabouço, o Ibovespa saiu de um piso de 98 mil pontos e agora está na casa dos 108 mil pontos. A taxa de câmbio teve forte apreciação, passando de R$ 5,29 para R$ 4,93, e a curva de juros fechou em torno de 90-100 pontos base. A reprecificação dos ativos é um movimento de retirada do risco de um grande estresse na dívida pública brasileira, que estava embutido nos preços.
Agora precisamos ver as expectativas de inflação se acalmarem para termos, de fato, o ambiente ideal para o nosso Banco Central iniciar um gradual afrouxamento monetário.
Continua depois da publicidade
Este artigo tem a co-autoria do economista Luan Takada.