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Ao longo das últimas semanas, o cenário econômico global tem entrado em estado de alerta após os eventos envolvendo o setor de bancos regionais dos Estados Unidos.
Em poucos dias, vimos o colapso do Silicon Valley Bank (SVB) devido ao excesso de alavancagem em posições no mercado de taxa de juros, seguido pelo Signature Bank (SB).
A falência dessas instituições só não foi tão grande quanto ao observado na Crise Financeira Global de 2008, quando houve a quebra do Washington Mutual Bank, detentor de US$ 307 bilhões em ativos. O SBV e o SB detinham US$ 209 bilhões e US$ 111 bilhões em ativos, respectivamente.
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A reação das instituições americanas foi digna de nota. O Fed criou um mecanismo para prover maior liquidez, enquanto o Tesouro e o Fundo Garantidor de Crédito garantiriam os ativos, inclusive os não-segurados.
Um argumento que reduz a preocupação com uma crise sistémica, como em 2008, é de que a relevância do evento, se medida como um percentual do total de ativos do sistema financeiro, não é tão grande assim.
No caso do SVB, essa parcela corresponde a cerca de 0,9%, dado que existem US$ 23,6 trilhões em ativos no sistema atual. Durante a crise de 2008, antes de cada banco decretar falência, as parcelas eram bem mais expressivas: o Merril Lynch respondia a 9,3% dos ativos, o Lehman Brothers, 5,5%, e o Bear Stearns, 3,7%.
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Apesar disso, as autoridades não quiseram correr o risco de haver contágio no sistema financeiro ou mesmo em setores muito ligados a essas instituições, como o de tecnologia. Por isso, agiram de maneira tão tempestiva.
Mesmo assim, o sentimento geral está sendo de risk-off: os títulos norte-americanos de 2 anos caíram cerca de 90 pontos base e o índice S&P cedeu em torno de 2% desde as falências. Depois, os mercados se recuperaram parcialmente, mantendo ainda uma grande volatilidade.
Com essa “novidade”, mudou significativamente a probabilidade a respeito do ritmo de alta de juros pelo Fed nesta quarta (21): subir 50 pontos base já saiu de cena. Agora, a discussão é entre 0 e 25 pontos base, revisão na taxa terminal e até mesmo antecipação do ciclo de corte são possíveis.
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Além disso, a visibilidade do cenário está mais nebulosa e preocupante após os últimos acontecimentos envolvendo o Credit Suisse. Não podemos descartar um cenário de mais estresse e passível de contágio entre os mercados, especialmente Estados Unidos e Europa.
As implicações instantâneas seriam um aperto maior sobre o mercado de crédito, os ativos de risco continuariam sofrendo, o dólar se fortaleceria e observaríamos um aperto mais forte das condições financeiras. Em decorrência disso, revisões das expectativas de crescimento iriam para baixo e questionamentos sobre a política monetária de cada economia viriam à tona.
No entanto, achar que os eventos lá fora seriam fatores determinantes para redução de juros por parte do Copom me parece precipitado e, provavelmente, equivocado.
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Os principais elementos que devem fazer o nosso Banco Central flertar com o início de afrouxamento monetário virão de fatores muito mais domésticos e que, de fato, estejam associados ao processo de trazer a inflação para as suas metas.
Fatores como o esfriamento de nosso crescimento para reduzir a pressão de preços, além da redução das incertezas associadas a sustentabilidade de nossa dívida pública, bem como a capacidade do nosso Banco Central de fazer o seu trabalho, são os elementos centrais a determinar para onde a nossa taxa de juros deve ir.
Dito isso, caso o governo venha com um novo arcabouço fiscal mais robusto, ajudando a melhorar razoavelmente a trajetória de nossa dívida com relação ao PIB, e o ambiente tanto de crescimento mais fraco, quanto de aperto de crédito irem ganhando força, melhora muito o balanço de riscos para a inflação, abrindo espaço para uma potencial queda de juros ainda no primeiro semestre.