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Caros(as) leitores(as),
O câmbio está no nosso dia a dia, de forma evidente ou não. Comentamos muito sobre a cotação da nossa moeda frente a outras sob a perspectiva do turismo, mas a verdade é que o câmbio possui um impacto macroeconômico muito mais relevante.
Você possivelmente já ouviu falar sobre um fenômeno chamado “pass-through”, que faz referência à elasticidade da taxa de câmbio, e seu propósito é mostrar o grau de repasse de uma variação cambial aos preços internos. Ele pode ser nulo, pode também afetar a inflação – positivamente ou negativamente.
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A inflação atinge a população brasileira como um todo (quem viveu antes do Plano Real que o diga), mas é mais severa com as parcelas de renda mais baixa. Por isso a variação cambial sempre preocupa os políticos.
Mas como é formado o preço do dólar em relação ao real?
De maneira geral, são duas grandes forças que definem o patamar do câmbio: a dinâmica doméstica e a global. Explico:
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A dinâmica externa é ditada especialmente pela economia dos Estados Unidos, e o patamar de juros e o aquecimento (ou não) da economia são determinantes. A doméstica inclui a situação das contas externas brasileiras, a balança comercial, a condução da política monetária, o fluxo de recursos para o país (ou para fora dele), a economia local e os ruídos políticos, que também pressionam a moeda.
Mas como definir o tamanho da contribuição de cada uma dessas forças?
A WHG, uma gestora independente focada em gestão de ativos globais, fez um estudo com uma “conta” que indica justamente a atribuição de resultado de cada uma dessas variáveis. Um gráfico vale mais que mil palavras:
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A linha vermelha demonstra o patamar do dólar contra o real até a última quarta-feira (10/07/2024). A linha cinza demonstra o patamar do dólar apenas pelos fatores externos, e a faixa azul entre as duas linhas indica a contribuição dos fatores domésticos para o preço atual do dólar.
Ou seja: se excluíssemos os fatores domésticos, que aparentemente estão pesando de forma negativa, o dólar estaria a R$ 5,04 – não a R$ 5,39. Praticamente toda a deterioração no câmbio é explicada por fatores locais, e destaco o cume do gráfico, momento recente em que a moeda americana quase atingiu R$ 6,00.
Desde esse pico, o real apreciou R$ 0,28, sendo R$ 0,07 por fatores externos e R$ 0,21 por fatores domésticos, segundo a WHG. Ou seja: 25% da melhora do real vem de fora do Brasil, e o restante acontece após declarações do governo recentes que foram consideradas positivas pelo “Sr. Mercado”.
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Claro que, o gráfico não indica que a formação do preço do lado externo venha 100% de ruído político, mas podemos enxergar um indicador claro do mercado de uma percepção de piora em relação à condução econômica local. Esses sinais, que não são ruídos, não podem ser ignorados – a história está aí para mostrar.
Essa melhora recente veio da mudança de curto prazo nas indicações do governo, boa parte delas advindas da equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT). Mas será que isso é suficiente para o “Sr. Mercado”?
A gestora Verde, uma das mais importantes do país, que é liderada por Luis Stuhlberger, escreveu sobre a situação do país de forma crítica em sua última carta aos cotistas: “A situação fiscal é sim bastante frágil. Vale lembrar que os gastos do governo estão crescendo a uma taxa de 12.9% real (ante um arcabouço de crescimento de despesa de 2.5% real), e o déficit primário “abaixo da linha” está em 295 bilhões de reais nos últimos doze meses, para uma meta de déficit de 28.8 bilhões no ano fechado.”
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Leia também: Verde diz que situação fiscal do Brasil é frágil e aposta no “combo inflação + dólar”
E complementa: “Não por acaso que o mercado está preocupado e reage negativamente a discursos inflamados. Enquanto o governo não reconhecer a realidade de que o crescimento do gasto foi descontrolado nestes primeiros dezoito meses de mandato, a situação continuará volátil e difícil. Há sinais incipientes de que a percepção do governo mudou nos últimos dias. Ainda assim, o custo de dilapidar credibilidade a golpes de retórica vai ser cobrado agora: o mercado precisará ver resultados concretos nos números, e não apenas comprará promessas.”
Está claro como o “Sr. Mercado” está pensando e o que esperar dele, em termos de reações, daqui em diante. Veremos os próximos capítulos dessa relação com o governo.