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Pela primeira vez o Presidente Jair Bolsonaro tocou no assunto da tributação dos dividendos. Em seu perfil no Twitter, o Presidente postou estas três mensagens, no dia 30/03/2019:
Nada do que está escrito nessas três postagens é tecnicamente um absurdo. Na eleição passada, quase todos os candidatos a Presidente defenderam publicamente a tributação dos dividendos. Podemos dizer, ainda, que tal solução conta com a simpatia da “classe falante”, dos chamados “formadores de opinião”. O que surpreende é que a tributação dos dividendos, sendo uma pauta do espectro político da esquerda, tenha sido adotada pelo Presidente Bolsonaro – por isso eu acredito que ele não percebeu as variantes dessa discussão, sendo que ainda há tempo para ele se informar a respeito e arquivar essa ideia ruim.
Eu sou contra a ideia de tributação de dividendos, e já escrevi três textos neste Portal tratando disso – veja aqui, aqui e aqui. Para não repetir esses mesmos argumentos, vou apenas comentar o tuíte do Presidente. Mais tarde, se aparecer uma proposta concreta do Governo, voltarei a escrever a respeito, porque o tema é da máxima importância para a Sociedade e para o público do Portal InfoMoney.
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Vamos ao primeiro tuíte, que trata da redução da tributação empresarial, como foi feita nos Estados Unidos.
Em 2018, no Governo Trump, a alíquota do imposto de renda das empresas americanas foi reduzida de 35% para 21%. Vários países do mundo que têm juízo caminharam no mesmo sentido, de redução desse imposto, mas o Brasil continua tributando os lucros empresariais com a alíquota de 34%. Em termos de competitividade da indústria nacional com a indústria mundial, portanto, o Brasil deveria trilhar o mesmo caminho, de redução da carga tributária das grandes empresas.
A questão é que não é prudente reduzir impostos em um cenário de déficit fiscal.
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É bem verdade que há quem diga que a redução da tributação empresarial acaba aumentando a base da tributação, por favorecer o reinvestimento e o aumento da capacidade produtiva, de forma que uma alíquota menor pode até mesmo resultar em maior recolhimento de tributos.
Faz sentido, mas é duvidoso que esse aumento de tributação seja alcançado no curto prazo – e o que temos no curto prazo é déficit fiscal pesado. Se no médio e no longo prazo estaremos fiscalmente mortos, reduzir tributos agora significará, provavelmente, morte fiscal no curto prazo. Não dá para reduzir tributos antes da Reforma da Previdência, da Reforma do Estado e das privatizações que são necessárias para aumentar a nossa capacidade produtiva.
Além do mais, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, qualquer redução de impostos deve vir acompanhada de uma medida de compensação, o que apenas acaba transferindo o ônus fiscal para outras pessoas. Mexer nesse vespeiro, sobre quem vai pagar pela redução do imposto de renda empresarial, não é eficiente, e Bolsonaro nem tem maioria segura no Congresso Nacional para tentar uma aventura dessas neste momento. Apenas vai perder tempo, energia e apoio em uma discussão que tende a cair em um impasse.
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É aí que entra o segundo tuíte: a troca de parte da tributação empresarial pela tributação dos dividendos. Essa troca poderia atender a Lei de Responsabilidade Fiscal, porque a redução de um lado poderia ser compensada com o aumento do outro, achando-se o ponto de equilíbrio financeiro necessário para que esse ajuste seja feito.
O mais provável, portanto, é que essa alteração não reduza a carga tributária dos lucros empresariais para os investidores. Ou ela será fiscalmente neutra ou acarretará aumento de tributos.
Por outro lado, se o Governo reduzir a tributação dos lucros empresariais e criar a tributação dos dividendos nos investidores, vai ter que fazer uma opção: 1) tributar os investidores somente na distribuição dos lucros; ou 2) tributar os investidores imediatamente quando do auferimento do lucro empresarial, como que “presumindo” a sua distribuição e gerando um crédito de retenção na fonte para os investidores (pessoas jurídicas ou pessoas físicas) compensarem com tributos sobre a renda seus.
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Podemos descartar a opção 1, porque ela representaria redução da arrecadação fiscal. Os sócios represariam lucros nas empresas e evitariam a sua distribuição para qualquer alíquota estipulada para a tributação dos dividendos nos investidores. Seria maluquice fazer uma coisa dessas, um desastre em termos fiscais, como já demonstramos.
O mais provável seria que o Governo viesse a adotar a opção 2. Certamente haverá discussões judiciais sobre a possibilidade de tributação de lucros ainda não distribuídos, mas deixamos essa matéria para os juristas. Estamos preocupamos aqui com o efeito econômico.
Adotando a opção 2, não faria sentido algum que, por exemplo, a alíquota da tributação dos lucros empresariais fosse 20% e a alíquota da tributação dos dividendos fosse 14%. Toda essa ginástica e desgaste político para trocar 6 por meia dúzia seria absurda, não é mesmo?
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É aí que entra o terceiro e último tuíte do Presidente, em que ele diz que a ausência da tributação de dividendos praticada no Brasil estaria “na contramão da prática internacional”. Ora, os lucros empresariais são tributados a 34%, só que exclusivamente (integradamente) na pessoa jurídica. O que haveria de novo se, para acompanharmos a “prática internacional”, mantivéssemos os mesmos 34%? Puro desejo de simetria fiscal internacional não pode ser.
Esse tuíte pode ser lido como inclinação do Presidente para o aumento de carga tributária sobre os lucros das pessoas jurídicas integrados aos dividendos distribuídos aos investidores. Algo como 20% nas pessoas jurídicas e 20% nos investidores, por exemplo, de forma que, grossamente falando, os lucros empresarias integrados passariam a ser tributados de 34% para 40%.
Na sua campanha, Jair Bolsonaro disse que não aumentaria a carga tributária no Brasil. Eventualmente, com esse modelo de tributação dos dividendos, esteja ele convencido de que a alteração da legislação atual corrigiria um privilégio, aumentando tributos para os mais ricos de forma a permitir um dia reduzir a tributação dos mais pobres, ou ao menos não aumentar hoje os tributos dos mais pobres. E que, assim, estaria corrigindo uma injustiça, de forma que seu discurso continuaria parando em pé.
A questão é que os contribuintes vão reagir a essa mudança, como sempre acabam reagindo, e nesse momento nada importará que sejam boas ou más as intenções do Governo. As respostas são sempre as mesmas em qualquer lugar do mundo em que haja livre mercado, e nos quais, portanto, as leis econômicas sejam praticadas.
Alguns investidores mais abusados concentrarão despesas pessoais nas pessoas jurídicas, para reduzir os lucros empresariais (e, portanto, os lucros distribuídos), como se praticava no passado, quando existia a tributação dos dividendos. Era a farra da Distribuição Disfarçada de Lucros, que a tributação concentrada nas pessoas jurídicas praticamente eliminou justamente no ano 1995 que foi mencionado pelo Presidente.
Outros investidores perderão ainda mais a pouca margem que resta para continuarem investindo em suas empresas, pois seus retornos diminuirão. Nesse universo de contribuintes, parte vai parar de trabalhar ou migrará seus investimentos para títulos públicos, outros ativos financeiros menos tributados ou até mesmo farão as malas e irão definitivamente para os Estados Unidos, pelas razões mencionadas no primeiro tuíte – tributação menor.
Sem falar na catástrofe que será criada no mercado de capitais, que funciona hoje com o racional da isenção dos dividendos e do pagamento dos Juros sobre o Capital Próprio. O valor de mercado das ações vendidas em bolsa será reduzido, como já se especula a respeito. Haverá menor interesse em um ativo que renderá menos. E, com isso, haverá visível redução de investimentos em empresas de capital aberto.
É verdade que o país perdeu competitividade tributária desde 2018, com a onda mundial de redução da tributação empresarial. Mas a situação brasileira somente não está pior justamente porque nossos dividendos não são tributados hoje – e, quando isso ocorrer, nossa indústria vai sofrer mais ainda. Dizendo de outro modo, ao mesmo tempo em que não é prudente manter os atuais 34%, seria pior ainda aumentar esse encargo com a tributação dos dividendos. O retorno do investidor é calculado considerando a tributação dos lucros empresariais e, ainda, a tributação dos dividendos, não é mesmo?
De qualquer modo, o que não explicaram para o Presidente Bolsonaro ainda é que qualquer aumento de carga tributária, seja para pobres ou mesmo para ricos, transfere dinheiro da Sociedade (já esfolada com 36% do PIB a título de tributos) para o Governo, que ainda está longe de esgotar suas possibilidades de cortes de despesas, privatizações, vendas de ativos, demissão de funcionários públicos, sem falar na Reforma da Previdência ainda não feita. Manter o gasto público e aumentar tributos ao mesmo tempo é remédio capaz de matar um país que já está muito doente.
Há ganhos significativos de qualidade para o sistema tributário que poderiam ser feitos pelo Governo com a unificação dos tributos que incidem sobre o consumo e com a concentração da sua incidência nas vendas a consumidor final, como praticado nos Estados Unidos com o Sales Tax.
Mas infelizmente o Presidente Bolsonaro caiu no conto da tributação dos dividendos, que, paradoxalmente, é medida tão ao gosto dos sociais democratas, socialistas e comunistas que diariamente ele acredita combater.
Esperamos que ele acorde desse delírio socialista e volte novamente sua atenção para a pauta liberal. Ao menos para não piorar o que já está muito ruim, concentrando-se na melhora daquilo que não importe em transferência de mais dinheiro da Sociedade para o Estado – o que causará mais desinvestimento, mais desemprego e, ainda, menor arrecadação de tributos, segundo a Curva de Laffer cujo sentido o Presidente já aprendeu, inclusive.
Alexandre Pacheco é Professor, Palestrante e Consultor de Direito Empresarial e Tributário.
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